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A mídia no lado oriental

Marlis Schaum (ca)18 de janeiro de 2009

A Alemanha Oriental controlava e dirigia seus órgãos de imprensa. Para ela, os jornalistas ocidentais eram uma ameaça ao sistema socialista – com razão? Como a mídia no Leste e no Oeste influenciaram a queda do Muro?

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O cinegrafista Siegbert Schefke na Alemanha Oriental em 1989Foto: Robert-Havemann-Gesellschaft

No fundo, tratava-se de uma bela história. Uma família do interior do estado alemão de Hessen se encontrava, em meados dos anos de 1980, na fronteira com a antiga Alemanha Oriental (RDA) e queria entrar no país. "Vocês estão desempregados?", perguntou o incrédulo funcionário de fronteira. Não, respondeu a família ocidental, dizendo que queria morar na RDA e abrir um bar.

O jornalista Ulrich Schwarz ainda hoje ri da história. O então correspondente da revista Der Spiegel na RDA escreveu à época um artigo sobre a família de Hessen. Pouco tempo depois, foi convocado ao Ministério das Relações Exteriores da Alemanha Oriental.

"Comunicaram-me que eu não havia solicitado permissão para viajar até lá [a fronteira da RDA com Hessen]. Então eu disse que me advertissem e que faríamos um comunicado interno na Spiegel relatando que nosso correspondente recebera uma advertência porque escrevera uma história positiva sobre a RDA. Acabou ficando por isso mesmo", conta Schwarz.

A relação entre a Spiegel e a RDA nunca foi boa. A circulação da revista semanal era proibida na antiga Alemanha Oriental. Entre 1976 e 1985, o politburo do partido comunista SED fechou o escritório da sucursal da revista em Berlim Oriental porque ela publicara um texto crítico de um grupo de oposição dentro do SED.

Trabalho em terreno inimigo

Mauerfall-Projekt: Potsdam, 1987/88
Residências deterioradas em Potsdam, 1987/88Foto: Robert-Havemann-Gesellschaft

"Para jornalistas estrangeiros, a RDA era como uma ostra", diz Schwarz. "O apartamento e o escritório tinham escuta eletrônica. Em parte, as conversas foram realmente gravadas, até mesmo conversas que tive com visitas na minha sala de estar. Sempre que voltava de Berlim Ocidental pela rua Heinrichstrasse, eu pensava: 'agora estou em terreno inimigo'". Da mesma forma como controlavam seus próprios órgãos de mídia, o SED e a Stasi também queriam vigiar os jornalistas ocidentais, principalmente os alemães.

Somente a partir de 1973 passaram a existir os primeiros jornalistas alemães ocidentais regularmente credenciados na RDA. Todas as viagens que eles fizessem para fora de Berlim Oriental tinham que ser solicitadas com 24 horas de antecedência e qualquer tipo de cobertura jornalística tinha que ser comunicada ao Ministério das Relações Exteriores.

A Stasi mantinha uma dossiê secreto sobre cada um dos correspondentes alemães ocidentais. Uma rede de informantes foi formada em torno de cada um deles. "Todos os contatos oficiais eram membros do partido ou eram agentes da Stasi. Pode-se calcular que, para cada um dos correspondentes regularmente credenciados, estavam em serviço cerca de 15 a 20 vigilantes", afirmou Jochen Staadt, do grupo de pesquisa "O Estado do SED" da Universidade Livre de Berlim.

Os jornalistas de rádio e de televisão eram considerados especialmente perigosos. As ondas da televisão ultrapassavam a fronteira e mostravam aos espectadores orientais fatos que o governo da RDA queria esconder, como a poluição ambiental na Alemanha Oriental ou a decadência das cidades.

Jornalistas espiões

Os jornalistas ocidentais recebiam informações e material sobre temas delicados de informantes como o jornalista e cinegrafista Siegbert Schefke e o fotógrafo Aram Radomski. Ambos tinham quase 30 anos e ainda "tinham uma conta a acertar" com o regime quando começaram a fornecer informações a jornalistas ocidentais e a filmar o que não deveriam.

Mauerfall-Projekt: Aram Radomski
Aram RadomskiFoto: Robert-Havemann-Gesellschaft

Como, por exemplo, em 9 de outubro de 1989 em Leipzig, quando os dois se deitaram sobre sujeira dos pombos dentro da torre de uma igreja e filmaram, secretamente, a manifestação de 70 mil cidadãos da Alemanha Oriental contra o regime do SED.

As filmagens foram entregues ao correspondente da Spiegel, Ulrich Schwarz, que as levou para o Ocidente. No dia seguinte, os alemães orientais puderam ver no Tagesschau [noticiário televisivo ocidental] que não foram 500 bêbados que provocaram arruaças no centro Leipzig, como fora anunciado pela mídia da RDA.

"Pudemos chamar a atenção para aquilo que estava acontecendo em Leipzig e isso foi, certamente, um empurrão inicial para outros protestos na RDA. Mas eu creio que isso deva ser visto como uma pedrinha no mosaico de um enorme processo", diz Radomski.

Emigração através da televisão

Mauerfall-Projekt: Jochen Staadt, Forschungsverbund SED-Staat der FU Berlin, 2008
Jochen Staadt do grupo de pesquisa da Universidade Livre de BerlimFoto: Marlis Schaum

Staadt está convencido de que, assim como os contatos pessoais que os alemães orientais mantinham no Ocidente e os inúmeros fugitivos do país, o rádio e a televisão ocidentais eram um espinho nos olhos do regime do SED.

"A presença constante do outro lado – que fornecia informações básicas sobre os acontecimentos mundiais aos cidadãos que não podiam deixar o país e, assim, contrariava a propaganda do rádio, da televisão e dos jornais da RDA – foi condição, acredito, para termos vivenciado 1989 da forma como o fizemos", afirma Staadt.

As próprias mídias da Alemanha Oriental acabaram por influenciar indiretamente a queda do Muro porque não noticiavam o que realmente interessava aos cidadãos. "O noticiário ocidental, que era visto no Leste, estimulou as massas. As pessoas viram o quanto poderiam agir, assim como também viram a incapacidade do sistema", disse Harald Händel, que trabalhou nos anos de 1980 como jovem redator na televisão da RDA e só queria uma coisa – ser correspondente no exterior e estar bem longe do regime.

"Quem pensaria então que esta revolução não sangrenta poderia acontecer? Eu acredito que ela não teria acontecido sem a cobertura jornalística [ocidental] e sem a ignorância dos acontecimentos por parte das mídias do Leste", afirma Händel.