Museu reconstrói cotidiano na Alemanha Oriental
14 de abril de 2013Localizado diretamente à beira do rio Spree, com vista para a Ilha dos Museus, em Berlim, fica um dos museus mais adorados e mais inusitados da capital alemã: o Museu da RDA, a extinta República Democrática Alemã. Desde sua inauguração, há seis anos, o número de visitantes chegou a mais de dois milhões, sendo que metade deles vem de fora do país. No entanto, o tema "RDA" fascina sobretudo os próprios alemães.
Os jovens de menos de 20 anos, por exemplo, só conhecem a antiga Alemanha Oriental dos livros didáticos, pois quando nasceram o país já estava reunificado e lutava com as complexas relações políticas reminiscentes dos dois Estados alemães. Porém, a vida cotidiana na RDA, com seus 16 milhões de habitantes, nunca foi apresentada a esta geração.
E é exatamente essa a força de atração do museu: ali, o visitante é levado a viajar pelo universo dos produtos vendidos no extinto país, bem como por sua arquitetura, cultura, política e tudo o que fazia parte do passado comunista. E as peças expostas fascinam não somente os jovens alemães, mas também estrangeiros: o que impressiona os visitantes em geral é a autenticidade do acervo.
A força do original
A exposição foi planejada como reprodução de um pequeno conjunto residencial típico da RDA: os móveis expostos são oriundos de construções típicas do extinto país. Blocos de madeira compensada funcionam como divisórias entre os espaços e ao mesmo tempo como vitrines: o visitante pode abri-los, fechá-los, observar e ouvir. Ou entrar em uma sala de visitas típica destes bairros residenciais. Ou até mesmo entrar no carro símbolo do extinto país, conhecido como "Trabi".
Outros objetos expostos são uma antiga máquina de escrever da marca Erika, diários de viagens feitas por mineiros e operários a "países amigos" e o medicamento "Oral Turinabol", usado por atletas para a prática do doping – todos peças originais. "A maioria do acervo foi doada pela própria população", explica Robert Rückel, diretor e curador do museu.
São objetos do cotidiano, que se encontravam guardados em porões ou sótãos e não tinham mais utilidade. No entanto, nos quase mil metros quadrados do espaço de exposição do museu, está exposto menos de 1% do acervo completo. Num depósito, com prateleiras altíssimas, estão armazenadas por volta de 200 mil peças.
Antes da inauguração do museu, em 2006, havia na capital alemã exposições que abordavam apenas a Stasi, a polícia política da extinta RDA, ou mostras sobre o Muro de Berlim. "Faltava esse terceiro pilar para a elaboração do passado", diz o diretor do museu. "Mais do que pelo poder do Estado, uma ditadura é marcada pelas pessoas que vivem, riem, brincam e tentam viver suas vidas, alheias ao regime, tentando conquistar pequenos espaços de liberdade", fala Rückel.
A essa constatação o diretor alia o desejo de experimentar do visitante: "Não queríamos um museu que fosse financiado pelo Estado. Queríamos saber se um museu pode se autogerir, viver dos próprios recursos", completa.
Ao contrário dos vizinhos na Ilha dos Museus, as verbas para o Museu da RDA provêm exclusivamente das entradas pagas pelos visitantes – uma experiência que funciona bem. E quem vai ao Museu tem também a oportunidade de deixar suas observações registradas em um livro de visitantes, do qual constam, por exemplo, críticas a um suposto "excesso de jogos, nos quais muitas crianças ficam mexendo, o que atrapalha a visita".
O diretor Rückel, por sua vez, revida: "Brincar não é somente um prazer, mas também uma forma de aprendizado. Não queremos oferecer uma aula como na escola. Aqui os adultos também participam dos jogos", diz. O visitante pode, por exemplo, participar de uma eleição virtual da extinta Câmara Popular da RDA ou dirigir uma unidade de produção de carros Trabi, sendo obrigado a entender os labirintos da economia do país. Ou até mesmo analisar por que o hino nacional não era mais cantado na RDA.
A falta de espaço é, todavia, uma crítica aceita pelo diretor da instituição. Embora tenha sido ampliado há um ano e meio, as instalações, segundo Rückel, ainda não comportam tanta gente. Mas o pouco espaço é visto por alguns visitantes exatamente como reflexo da falta de liberdade que reinava na antiga Alemanha Oriental.
Postais do Mar Negro
A falta de espaço e as deficiências do antigo país tornam-se visíveis no Museu da RDA. No início do percurso da mostra há um diário que lista o que faltava no país. Desde 1983, a alemã Ingeborg Lüdicke anotava tudo o que não havia para comprar: queijo, frigideiras, cordas de violão, papel higiênico. Ela anotou que por volta de 10 horas da manhã acabava o estoque de pãezinhos nas padarias. Nas farmácias, faltavam colírios e o dentista não dispunha de material para fazer a prótese dentária de seu marido. Esse detalhismo explicita o que era, de fato, o dia a dia no país.
A alguns passos dali, o visitante do museu se depara com a forma como os habitantes da RDA passavam suas férias: viagens a "territórios não socialistas" eram estritamente proibidas. Os cartões postais expostos vinham geralmente de regiões como o Mar Negro ou Leningrado (hoje São Petersburgo). E quem não podia financiar uma viagem para tão longe passava as férias no Mar Báltico, geralmente em praias de nudistas.
O que chamavam de "culto ao corpo livre", ou seja, a nudez em público, era visto como normalidade na antiga Alemanha Oriental, muito mais que na Ocidental – um aspecto também lembrado pelo museu. E os famosos pepinos do leste alemão procurados principalmente por quem assistiu ao filme Adeus, Lênin podem ser comprados na lojinha do Museu.
Autora: Ricarda Otte (sv)
Revisão: Roselaine Wandscheer