Mulheres mantêm viva a esperança de mudança no Irã
11 de fevereiro de 2019A queda do xá Mohammed Reza Pahlavi em janeiro de 1979 representou o ápice da Revolução Iraniana e culminou no retorno do exílio do líder revolucionário, o aiatolá Ruhollah Khomeini. Ele então fundou a República Islâmica do Irã, um Estado autoritário guiado por princípios religiosos.
Nos 40 anos da Revolução Iraniana, o cientista político Sadegh Zibakalam diz não esperar muito do alto escalão do país. "No aniversário, os políticos farão os discursos habituais. Falarão sobre a exportação da Revolução Islâmica, sobre a destruição de Israel e sobre a guerra contra os Estados Unidos. Mas o que quase nunca aparece em seus discursos são os verdadeiros objetivos da revolução de 40 anos atrás", diz o iraniano em entrevista à DW.
"A revolução nos prometeu a democracia, o Estado de direito e a liberdade de imprensa. Ela nos prometeu também o direito à liberdade de expressão, sem que sejamos presos ou torturados."
Quando era ainda um jovem estudante, Zibakalam apoiou a revolução. Ele chegou a passar dois anos na prisão durante o regime do xá Pahlavi. Está ciente, contudo, da repressão que existe no Irã ainda nos dias de hoje.
Em março de 2018, o vencedor do Prêmio Liberdade de Expressão, concedido pela Deutsche Welle, foi sentenciado a 18 meses de prisão em primeira instância. O motivo: em uma entrevista dada à DW, Zibakalam demonstrou compreensão pelos manifestantes no Irã. Entre dezembro de 2017 e janeiro de 2018, o país testemunhou os maiores protestos contra o governo em uma década.
República Islâmica – antes e depois
Entre outras afirmações, Zibakalam declarou na época que muitos cidadãos do país estavam expressando "desejos e exigências que haviam sido reprimidos por um longo tempo" e que estavam desabafando suas "decepções em relação a todo o sistema".
De fato, houve até elogios ocasionais para o antigo xá Pahlavi, derrubado pela revolução em 1979. À DW, Zibakalam afirmou ainda que apenas cerca de 30% dos cidadãos iranianos, no máximo, ainda acreditavam na República Islâmica.
A situação era diferente há 40 anos: à época, 98% dos iranianos concordaram, em referendo, com a futura reforma do Estado e com a proclamação de uma República Islâmica. Mesmo que esse número estivesse "certamente errado", diplomatas alemães em Teerã relataram na ocasião que não havia dúvidas quanto à esmagadora aprovação de Khomeini como líder da revolução e do país.
Assim, Khomeini foi capaz de implementar o sistema – formulado por ele durante o exílio – de "governança por estudiosos jurídicos islâmicos qualificados" como o elemento central da Constituição iraniana contra as ideias concorrentes vindas das forças moderadas e esquerdistas.
Isso foi possível graças à popularidade de Khomeini. Mas pouco tempo depois começaram a surgir os métodos "comprovados" de supressão da liberdade de imprensa, bem como grupos de repressão como o Hisbolá.
Após as perdas significativas devido à guerra com o Iraque (1980-1988), iniciada pelo então ditador iraquiano Saddam Hussein, o chamado "sistema" (Nezam, em persa – sustentado pelos principais pilares do clero conservador e pela Guarda Revolucionária) conseguiu consolidar seu poder.
Houve fases em que correntes reformistas e liberais conquistaram certa atenção, mas nunca conseguiram se afirmar ou resultar em quaisquer mudanças sustentáveis.
Fases de abertura
Essa fase está ligada a Mohammad Khatami, que venceu a eleição presidencial em 1997 com uma agenda de reformas que incluíam liberdades e direitos culturais para mulheres e minorias.
Mas o sistema reagiu imediatamente. Os protestos estudantis contra o fechamento de um jornal em meados de 1999 foram brutalmente reprimidos, mas tiveram continuidade e resultaram na prisão de centenas de jovens, em penas de morte – embora não cumpridas – e em confissões forçadas sobre suposta cooperação com potências estrangeiras.
A imprensa sofreu uma restrição massiva, e intelectuais liberais foram presos, incluindo a advogada e defensora dos direitos humanos Shirin Ebadi, que em 2003 ganharia o Prêmio Nobel da Paz.
O segundo grande impulso das forças democráticas se manifestou em protestos contra a aparentemente forjada eleição presidencial de 12 de julho de 2009. O círculo dominante estava determinado a impor a reeleição do então presidente Mahmoud Ahmadinejad contra a iminente vitória do candidato opositor Mir-Hussein Mousavi.
Após o anúncio do resultado do pleito (inacreditáveis 63% para Ahmadinejad), centenas de milhares de iranianos tomaram as ruas das grandes cidades. As manifestações do chamado "Movimento Verde" ocorreram esporadicamente até novembro do ano seguinte, antes de serem totalmente sufocadas pelo aparato de segurança, que inclui a Guarda Revolucionária – aliada fiel daqueles que lucram com o sistema.
Esperança de mudança?
O historiador britânico-iraniano Michael Axworthy escreveu que o país, após as eleições de 2009 e a derrota do "Movimento Verde", assemelhava-se cada vez mais com uma ditadura militar – uma versão mais rígida e mais eficaz do regime que a Revolução Iraniana derrubou em 1979.
Há esperança de mudança? Sim, afirma a ativista e escritora Mansoureh Shojaee – e ela pode vir de mulheres iranianas. "Uma parte significativa desses protestos [de 2009] veio das mulheres, assim como nos últimos 150 anos", diz ela à DW. Shojaee se referia à longa história do movimento de mulheres no Irã, que começou antes mesmo da revolução constitucional de 1906.
A Revolução Islâmica não tirou os direitos de voto das mulheres. Mas, como o Estado é liderado por eruditos religiosos, as mulheres estão automaticamente em desvantagem na arena política. Mesmo dentro da família, de acordo com as regras da sharia, todas as decisões importantes são tomadas por pais ou maridos.
As iranianas muitas vezes precisam negociar sua autonomia como mulheres adultas com seus maridos. Após o casamento, por exemplo, o marido decide se sua esposa pode trabalhar. Ele também determina onde a família vai morar e se sua esposa pode deixar o país ou mesmo a cidade.
Esse é um lado da história. O outro é o incomparável sucesso educacional das mulheres no Irã. Elas representam um número desproporcional de graduados em universidades e estão fortemente presentes em cargos qualificados do setor público em comparação com outros países islâmicos.
"A mudança social para uma sociedade mais urbanizada e altamente educada, na qual as mulheres desempenham um papel cada vez mais assertivo, é de enorme importância e conduzirá inevitavelmente a mudanças políticas no Irã também a médio e longo prazo", afirma Axworthy.
Movimento de mulheres e mudança social
"Especialmente nos últimos 10 anos, as mulheres aproveitaram todas as oportunidades para explicitar suas exigências: mesmo na prisão", diz Shojaee. "Sob o presidente Ahmadinejad, as mulheres detentas não precisavam mais usar o xador [o véu de corpo inteiro no Irã] na prisão – antes, elas eram obrigadas a usá-lo até no tribunal. Isso foi impulsionado pela greve de fome realizada pela advogada de direitos humanos Nasrin Sotoudeh na prisão."
Sotoudeh, que recebeu o prêmio Sakharov de Liberdade e de Direitos Humanos do Parlamento Europeu em 2012, foi detida novamente em 2018 acusada de espionagem e de apoiar protestos contra o uso de véus. Ela segue presa.
Sotoudeh e várias outras ativistas vêm defendendo a mudança por meios pacíficos. Mas suas demandas vão muito além da liberdade sobre o que vestir.
"O movimento das mulheres no Irã está tentando se renovar. Ele está tentando abordar os direitos civis e fazer uma conexão com as demandas gerais da sociedade, a fim de mobilizar um público maior para a mudança", afirma Shojaee.
A eleição, em 2013, do presidente Hassan Rouhani, considerado um reformista, não trouxe até então nenhuma mudança aos olhos das mulheres e dos liberais no Irã. Também não houve mudanças para as pessoas que sofrem com problemas cotidianos resultantes da privação econômica.
"Se um sistema político não encontra uma maneira de se reformar e concordar com as demandas de seus cidadãos, mais cedo ou mais tarde culminará numa grave crise, numa revolução ou num colapso", diz Abbas Abdi, um dos estudantes que participou da invasão da embaixada americana em 1979 e, posteriormente, tornou-se um crítico do regime.
A situação atual no Irã pode ser comparada de muitas maneiras com a situação no país antes da Revolução Iraniana. Mas muitos que testemunharam a revolução há 40 anos estão desapontados e temem o preço que terão de pagar caso algo semelhante ocorra novamente.
Abdi testemunhou a revolução de 1979. Mas hoje, em entrevista à DW, ele garante: "Se tivéssemos sabido que nossos anseios não seriam cumpridos pelos próximos 40 anos, não teríamos apoiado uma revolução".
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