Arte e meio ambiente
12 de setembro de 2010No meio de um saguão no bairro Wedding, em Berlim, um bloco maciço de briquetes de carvão de três metros de largura por três de altura chama a atenção. A obra do artista Michael Saup tem nada menos que 37 toneladas de energia concentrada. Sem perceber, essa foi a quantidade de energia que usuários de internet desavisados "consumiram" ao clicarem um milhão de vezes no trailer do filme Avatar – número de acessos em 29 de outubro de 2009, sete meses mais tarde já eram 14,5 milhões.
Segundo a curadora da exposição "Recomenda-se imitar", Adrienne Goehler, a mostra em Berlim procura exatamente tematizar esse olhar crítico sobre a conduta do mundo ocidental frente às fontes de energia. "A mostra convida a pensar sobre determinadas coisas, até mesmo a agir. Ou seja, entrar em ação, negociar. Acho que não vamos seguir em frente se não entendermos que a sustentabilidade pode ter a ver com o desejo e a paixão na própria conduta. É esse o espírito da exposição", diz Goehler.
Conduta em questão
Adrienne Goehler foi durante 12 anos diretora da Escola Superior de Artes de Hamburgo e, por pouco tempo, secretária de Cultura de Berlim, em 2001. Na mostra em questão, sob sua curadoria, são apresentadas obras de artistas que abordam – de forma concreta, prática, às vezes irônica e muitas vezes irritada – nossa conduta em relação ao mundo, à natureza, à tecnologia de manipulação genética e à biodiversidade.
O britânico Richard Box, por exemplo, faz com que um campo eletromagnético se ilumine por meio de cabos de alta tensão. A coreana Jae Rhim Lee desenvolveu uma "mortalha eterna", na qual os cadáveres podem ser transformados em gás metano aproveitável e em composto orgânico.
O finlandês Ikka Halsa, por sua vez, criou espaços de proteção para grandes sistemas ecológicos em perigo. Entre as obras, as fronteiras entre ciência e arte acabam se diluindo, como no melancólico trabalho da suíça Cornelia Hesse-Honegger.
Minúcia e precisão
"O trabalho da artista me toca profundamente, porque ela reproduz exatamente aquilo que a política tenta negar, ou seja, como a vida se transforma, em seus pequenos detalhes, em função dos resíduos nucleares~, comenta Goehler.
Desde o fim dos anos de 1960, a artista, que tem também formação em Ciências Naturais, trabalha com percevejos. Em 1987, um ano após o acidente de Tchernobil, ela começou a recolher sistematicamente esses pequenos seres vivos no entorno da usina nuclear, criando pinturas minuciosas dos mesmos.
Esses quadros, extremamente precisos, explicitam as deformações nas pernas e nas patas dos insetos, bem como as mudanças de pigmentação ou cistos nos mesmos. O índice de lesões nos percevejos em todas as áreas analisadas por Hesse-Honegger, em diversos países europeus, ficou bem acima de 20%. Sustentabilidade, escreve a artista, significa viver no ciclo da renovação. Se prejudicamos esse ciclo com tecnologias nocivas, destruímos a nós mesmos, afirma.
"Tentamos realmente mostrar diferentes campos da inquietação e de uma necessidade urgente de agir. E não tive dificuldade alguma em encontrar pessoas, muito pelo contrário. Acho que houve uma mudança de pensamento, uma nova corrente no ramo da arte, que tem por meta provocar mudanças sociais através de suas intervenções artísticas", observa Goehler.
Resíduos e consumo
Muitos dos artistas da mostra tematizam em suas obras questões relevantes em todo o mundo hoje. Uma instalação do norte-americano Dan Peterman, por exemplo, chama a atenção para o fato de que o abastecimento emergencial de alimentos se transformou num setor em franca expansão. Já Xing Danwen fotografa o lixo eletrônico que o Japão, a Coreia do Sul e os EUA despejam juntos na costa chinesa.
E o alemão Gerd Niemöller criou telas, como as usadas pelos apicultores, de papel reciclado e resina sintética, a partir das quais casas estáveis podem ser construídas em 24 horas. Essas casas são especialmente adequadas para regiões de guerra, embora sejam uma pedra no sapato dos grandes comerciantes de barracas. "Eles querem comercializar suas tendas em todo o mundo. E depois da catástrofe no Haiti, aumentaram em 30% os preços de seus produtos", comenta Goehler.
Diante dos desafios globais, não é possível tirar a responsabilidade das mãos dos políticos, aponta a curadora. Mas, ao mesmo tempo, diz ela, não se pode tampouco confiar neles. A arte apresentada agora por Goehler em Berlim chama a atenção para a temática de forma geral, semeando, com sua clareza e riqueza de ideias, uma desconfiança produtiva no observador, fiel a seu título: "Recomenda-se imitar".
Autora: Silke Bartlick (sv)
Revisão: Nádia Pontes
A exposição pode ser vista em Berlim até início de outubro próximo no espaço Uferhallen, localizado no bairro Wedding. Dali, a mostra segue para Dessau e posteriormente para São Petersburgo, Austrália e Grécia, sempre em cooperação com os Institutos Goethe em cada um desses países.