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SociedadeFrança

Milhares de franceses saem às ruas contra violência policial

28 de novembro de 2020

Manifestantes condenam projeto de lei de segurança que pode criminalizar a divulgação de imagens de policiais em ação. Protesto em Paris tem confronto entre ativistas e agentes, que lançam gás lacrimogêneo.

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Manifestantes de máscara erguem cartazes em protesto contra nova lei de segurança da França, em Paris
Marchas reuniram ativistas de esquerda, defensores dos direitos civis, jornalistas e estudantesFoto: Christian Hartmann/REUTERS

Milhares de franceses saíram às ruas neste sábado (28/11) em protesto contra um projeto de lei que pode criminalizar a gravação e a divulgação de ações da polícia. Em Paris, houve confrontos com forças de segurança, que chegaram a lançar gás lacrimogêneo contra os manifestantes.

A nova lei de segurança foi submetida à aprovação pelo governo do presidente Emmanuel Macron e ainda aguarda aprovação do Senado. Especificamente seu Artigo 24 prevê multas de até 45 mil euros e um ano de prisão para quem divulgar imagens de policiais em ação.

O objetivo declarado é proteger os agentes de ameaças psíquicas e físicas, mas o projeto de lei gerou preocupações em grupos de direitos civis e jornalistas, que temem que o dispositivo minará a liberdade de imprensa e favorecerá a ocultação de casos de brutalidade policial – inclusive após incidentes recentes contra negros e migrantes terem chocado a França.

"País dos direitos da polícia", diz cartaz de manifestante em Paris
"País dos direitos da polícia", diz cartaz de manifestante na capital francesaFoto: Francois Mori/AP Photo/picture alliance

Neste sábado na capital francesa, a maioria dos manifestantes marchou pacificamente. Milhares de pessoas lotaram a extensa Praça da República e as ruas nas proximidades, erguendo bandeiras vermelhas de sindicatos e bandeiras da França.

Cartazes ainda denunciavam a violência policial, exigiam liberdade de imprensa e pediam a renúncia do ministro do Interior, Gérald Darmanin. "Quem vai nos proteger da polícia?", "Parem a violência policial", "Democracia espancada" e "Salve vidas, filme a polícia" eram algumas das frases.

"O que está acontecendo em Paris é extremamente preocupante, e não podemos deixar isso passar. Eu fiquei dois anos [protestando] com os 'coletes amarelos', e vi toda a violência", relatou a manifestante Caroline Schatz à agência de notícias Reuters.

"Houve todos aqueles protestos no verão contra a violência policial, e esta lei mostra que o governo não nos ouviu… É a impunidade. É isso o que nos deixa com tanta raiva", afirmou, por sua vez, a participante Kenza Berkane, francesa de origem africana, à agência AP.

Carros pegam fogo em rua de Paris, durante protesto
Apesar de a marcha principal em Paris ter sido pacífica, carros foram queimados por grupos de manifestantesFoto: Benoit Tessier/REUTERS

Apesar da marcha principal ter sido pacífica, vários pequenos grupos acabaram entrando em confronto com a polícia. Dois carros, uma motocicleta e materiais de construção foram incendiados, gerando nuvens negras de fumaça que podiam ser vistas a quilômetros de distância.

Segundo relatos de agências de notícias, alguns manifestantes mascarados ainda lançaram fogos de artifício, ergueram barricadas e atiraram pedras contra agentes, que em resposta lançaram gás lacrimogêneo e bombas de efeito moral contra os ativistas.

Os policiais haviam sido instruídos a não agir com violência durante os atos. Uma carta interna do chefe da polícia de Paris, Didier Lallement, pedia que os oficiais usassem "probidade, senso de honra e ética" enquanto faziam a segurança dos protestos, que foram autorizados pelas autoridades.

Centenas de policiais com armaduras, alguns com cassetetes, outros com lançadores de gás lacrimogêneo e uns poucos com rifles, se alinhavam ao longo da rota da marcha.

Organizados por associações de jornalistas e grupos de liberdade civil, os atos reuniram ainda militantes de esquerda, estudantes, grupos dos direitos dos migrantes, ativistas ambientais e "coletes amarelos" – estes têm protestado há dois anos contra as políticas do governo Macron.

Protestos contra a brutalidade policial e a nova lei de segurança também foram registrados em outras cidades francesas, como Lille, Rennes e Estrasburgo.

Policiais reunidos perto da Praça da Bastilha, onde a marcha terminou em Paris
Policiais reunidos perto da Praça da Bastilha, onde a marcha terminou na capital da FrançaFoto: Francois Mori/AP Photo/picture alliance

Agressão policial contra negro

Os atos ocorrem após mais um caso de violência policial chocar a França. Em 21 de novembro, o produtor musical negro Michel Zecler foi agredido por agentes durante uma batida policial em Paris. Quatro oficiais envolvidos na ação foram suspensos e posteriormente presos, enquanto o caso é investigado.

Imagens de câmeras de vigilância mostram os policiais usando gás lacrimogêneo contra a vítima, sem razão aparente. Segundo a mídia francesa, o produtor estaria andando por Paris sem máscara protetora, quando avistou um carro de polícia. Para evitar ser multado, ele correu para seu estúdio de música.

As imagens mostram três policiais seguindo Zecler e o atacando com socos, pontapés e golpes de cassetete, e bradando epítetos racistas. Expulsos por moradores do prédio, os agentes teriam retornado com reforço e atirado uma granada de gás lacrimogêneo dentro do estúdio.

Zecler foi levado à delegacia e mantido em custódia por 48 horas, acusado de "violência contra pessoa depositária de autoridade pública" e "rebelião".

Na sexta-feira, o presidente Macron afirmou que ficou "chocado" com as imagens da agressão e que elas "envergonham" o país. Ele ainda pediu ao governo que "apresente rapidamente propostas" para "lutar com maior eficácia contra toda a discriminação". 

"A França nunca poderá permitir que floresçam o ódio ou o racismo. A França nunca deve recorrer à violência ou à brutalidade, de onde quer que ela venha", disse o líder francês, pedindo contundência para punir os agentes que quebram os códigos.

Este foi o segundo caso de violência policial em Paris da semana: na terça-feira, o governo ordenou uma investigação interna, depois da divulgação de cenas de policiais expulsando com brutalidade requerentes de refúgio de um acampamento não autorizado.

EK/ap/afp/dpa/rtr