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Merkel diz ter "sérias dúvidas" sobre acordo UE-Mercosul

21 de agosto de 2020

Desmatamento na Amazônia leva chanceler federal alemã a questionar ratificação de pacto. Em encontro com Greta Thunberg, Merkel teria dito a ativistas que "definitivamente" não assinará o texto em sua forma atual.

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Chanceler alemã, Angela Merkel
Angela Merkel: desmatamento na Amazônia faz com que Berlim esteja cético quanto a ratificação de pacto com MercosulFoto: Getty Images/AFP/C. Simon

A chanceler federal alemã, Angela Merkel, tem "sérias dúvidas" sobre a implementação do acordo comercial entre a União Europeia (UE) e o Mercosul devido ao aumento do desmatamento na Amazônia, afirmou nesta sexta-feira (21/08) o porta-voz da chefe de governo, Steffen Seibert.

Ele disse que Berlim observa "com grande preocupação" o desmatamento e as queimadas na região. "Nesse sentido, surgem sérias dúvidas sobre se, no momento, uma implementação do acordo pode ser garantida dentro do espírito pretendido. Vemos isso com ceticismo", alertou. "Existem dúvidas consideráveis de que o acordo possa ser implementado como o pretendido, em vista dos acontecimentos atuais, das terríveis perdas florestais registradas", acrescentou o porta-voz.

Seibert não quis comentar notícias de que Merkel teria dito na quinta-feira a ativistas que a Alemanha não assinaria o acordo. "Não comento conversas privadas", disse.

Após reunião em que a chanceler recebeu a ativista sueca Greta Thunberg, representantes do movimento ambientalista Fridays for Future (Greve pelo Futuro, em português) afirmaram que a líder alemã prometeu não ratificar o acordo com o Mercosul em sua forma atual. A ativista alemã Luisa Neubauer, líder do movimento na Alemanha, escreveu em sua conta no Twitter que Merkel declarou que "definitivamente" não assinará o texto. 

Seibert lembrou que atualmente o texto do acordo está sendo submetido a revisão técnica e jurídica e traduzido nas línguas oficiais da União Europeia, antes de ser enviado para aprovação do Conselho Europeu. Só então começará o processo de ratificação, segundo o porta-voz. Ele observou, entretanto, que o governo pretende observar atentamente no decorrer desse processo se ainda existem condições gerais para uma ratificação.

Um porta-voz do Ministério do Meio Ambiente alemão explicou que o capítulo sobre sustentabilidade no acordo não está vinculado aos mesmos mecanismos de sanção que outras partes do contrato, afirmando que, por isso, deve haver "boa vontade" de todos os envolvidos e que, segundo ele, o governo alemão "gostaria de ter maiores garantias" nesse ponto.

O acordo de livre-comércio entre a União Europeia e Mercosul, assinado em julho do ano passado, vem enfrentando resistência cada vez maior na Europa, devido sobretudo à política ambiental do governo brasileiro.

Os parlamentos de Áustria, Holanda e o da região da Valônia, na Bélgica, já anunciaram que não darão seu aval ao acordo. A ratificação do pacto também encontra resistência na França, Irlanda e Luxemburgo. A explosão do desmatamento da Amazônia no ano passado é um dos fatores que levou europeus a se posicionarem contra a proposta.

Em junho, cinco organizações ambientais e de direitos humanos europeias apresentaram um pedido ao ombudsman da União Europeia para que o processo de ratificação do acordo seja interrompido. Também em junho passado, 29 parlamentares europeus assinaram uma carta pedindo ação do Congresso brasileiro em relação ao aumento do desmatamento na Amazônia.

Após as declarações de Merkel, a eurodeputada alemã Anna Cavazzini, do Partido Verde, afirmou que a mudança de posição da chanceler representa mais um "prego no caixão" do acordo.

"Até pouco, Merkel impulsionou o acordo em nome das indústrias automobilística e farmacêutica alemãs. Agora com o aumento do desmatamento na Amazônia, a pressão se tornou muito grande e Merkel está mudando o seu rumo. Isso é mais um prego no caixão do altamente controverso acordo", afirmou Cavazzini, que é porta-voz de política comercial dos Verdes europeus.

A eurodeputada, que também é vice-presidente da Delegação Europeia para as relações com o Brasil, defendeu ainda que o bloco "enterre de vez" o acordo ou "faça mudanças profundas no texto" para que ele possa ser ratificado.

A Alemanha, que ocupa atualmente a presidência rotativa do Conselho Europeu, havia assumido o posto com intenção de agilizar o processo de ratificação do acordo comercial com Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai.

Segundo o Ministério do Exterior alemão, os países do Mercosul são importantes parceiros econômicos e geopolíticos da UE. Mas o acordo precisa ainda ser aprovado por todos os 27 países-membros do bloco e no Parlamento Europeu. E as chances de que isso aconteça parecem ser reduzidas no momento.

Um ponto de crítica é a proteção ambiental e, especificamente, da Amazônia, que não teria sido suficientemente levada em conta no tratado. Não há mecanismos de sanção, por exemplo, se o Brasil não fizer nada sobre o aumento dos incêndios na região ou permitir que as empresas mineradoras destruam reservas indígenas. Os ataques ao Estado de direito, aos direitos humanos e à democracia sob o governo brasileiro atual também são argumentos na Europa contra o acordo.

Outro ponto é que consumidores e agricultores na Europa estão incomodados com as cotas mais altas estipuladas no acordo para importações agrícolas da América do Sul. Padrões menos rígidos para o uso de produtos químicos em plantações e a destruição de áreas naturais por grandes agricultores são os principais argumentos.

O acordo com o Mercosul é o mais significativo do ponto de vista econômico que a UE já concluiu. Um mercado de 260 milhões de consumidores se abrirá para as empresas europeias na América do Sul. A indústria alemã seria especialmente beneficiada se as exportações para os países do Mercosul fossem facilitadas. As tarifas de importação até então elevadas sobre carros, máquinas ou produtos químicos, por exemplo, seriam gradualmente abolidas. Só isso geraria uma economia às empresas de cerca de 4 bilhões de euros por ano.

MD/dpa/epd

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