Mais deputados de origem estrangeira no Parlamento alemão
1 de outubro de 2021Ao adentrar pela primeira vez o salão plenário do Bundestag (Parlamento alemão), Armand Zorn sente humildade. "É uma responsabilidade especial que eu tenho agora, e de que estou muito ciente", diz o político do Partido Social-Democrata (SPD).
Zorn, que nasceu em Camarões e chegou à Alemanha aos 12 anos, é um dos 735 deputados que acabam de conquistar um assento no órgão legislativo federal. Ele comporá um Parlamento que, após as eleições gerais do último domingo (26/09), ficou mais diversificado.
"Ontem tivemos a primeira reunião de bancada", conta à DW ao telefone. "Deu para ver uma diversidade incrível, em relação à origem, mas também ao gênero, às diferentes biografias e profissões. Foi muito bonito de ver."
Com sua origem estrangeira, Zorn está em boa companhia, para além das fronteiras partidárias. Uma pesquisa da agência Mediendienst Integration revelou que pelo menos 83 deputados deputados recém-eleitos têm histórico de imigração: ou eles mesmos ou pelo menos um de seus genitores não possui a cidadania alemã de nascença.
"Nós constatamos uma tendência positiva em relação à diversidade se manifestando no Bundestag", comenta Deniz Nergiz, diretora-gerente do Conselho Federal de Imigração e Integração (BZI). "Mas o que é ainda muito mais positivo, é que agora também se criou mais diversidade dentro do grupo. Por exemplo, se vê que agora há mais políticas afro-alemãs e de origem turca."
A Esquerda lidera na diversidade
De fato, pelo menos 11,3% dos deputados federais recém-eleitos têm origem estrangeira, contra 8,2% na legislatura anterior. Segundo a Mediendienst Integration, o partido A Esquerda é que ostenta a proporção mais alta, 28,2%, enquanto a bancada conservadora da União Democrata Cristã e União Social Cristã (CDU/CSU), da chefe de governo Angela Merkel, fica em apenas 4,6%.
Os social-democratas estão em segundo lugar: 17% dos colegas de Zorn não são alemães de nascença. Ele não se espanta com o fato: "Acho, sim, que há um espírito da época. Todos os partidos precisam se abrir. Ainda não estamos lá onde devíamos estar, mas acredito que os partidos entenderam isso."
Deniz Nergiz, cuja tese de doutorado teve como tema as políticas e políticos de ascendência estrangeira, confirma: "Os partidos criaram mais espaço para quem tem histórico de imigração. E desta vez não só os apresentaram como candidatos à eleição direta, mas também os colocaram nas listas estaduais em posições promissoras, o que naturalmente facilitou o ingresso no Parlamento."
No complexo sistema eleitoral alemão, os eleitores votam duas vezes: primeiro diretamente num candidato para representar seu distrito eleitoral (são 299 em todo o país), e depois num partido, que por sua vez elabora uma lista de candidatos aos quais serão distribuídos esses votos.
Nos últimos anos, os candidatos de cidadania alemã adquirida posteriormente costumavam ficar nos últimos lugares das listas estaduais, com poucas perspectivas de ocupar um assento parlamentar. Mas os tempos mudaram.
"O que conta não é de onde se veio, mas para onde vai"
Zorn enfrentou uma campanha eleitoral longa e laboriosa, viajou muito em sua área eleitoral, apresentou-se de porta em porta. O esforço valeu a pena: em sua zona, Frankfurt I, venceu a eleição direta, derrotando um rival da CDU. O mesmo ocorreu com o verde Omid Nouripour, na zona eleitoral Frankfurt II.
"Para Frankfurt e também para a Alemanha, é um bom sinal. Nouripour veio do Irã para cá com 13 anos, eu vim de Camarões aos 12", conta Zorn. "Nós dois termos conseguido o mandato direto em 2021, acho, nos deixa muito orgulhosos, e também humildes." O fato o faz também sentir-se "confiante quanto ao futuro, pois mostra que a nossa sociedade é diversificada, onde o que conta não é de onde você veio, mas para onde vai".
O social-democrata teve muitas vivências positivas nos últimos anos. "Também achei muito bacana que na campanha a cor da minha pele não estava em foco. A questão não era se eu tenho pele escura, se sou negro, mas sim a minha personalidade, a minha competência no campo da digitalização, da política econômica e financeira. Fui muito mais abordado sobre o que eu queria implementar."
É fundamental não se perceber os políticos de origem migratória apenas como casos de exceção, frisa a socióloga Nergiz, mas sim como "políticas e políticos alemães perfeitamente normais, com competências em setores diversos".
Ao mesmo tempo, eles contribuem para que temas ligados à migração sejam tratados de uma outra maneira no Bundestag e despertem mais atenção. Os políticos vão "provavelmente falar sobre a situação num abrigo para requerentes de asilo de modo diferente com um deputado que talvez tenha crescido num abrigo", exemplifica Nergiz.
Mais vantagens que gerações anteriores de imigrantes
Com seus 33 anos, Zorn é um dos deputados mais jovens do Parlamento federal alemão. Essa é outra constante entre os novos parlamentares, acentua Nergiz: muitos dos recém-eleitos de ascendência estrangeira são "gente muito jovem, que também já desenvolveu carreiras admiráveis". Outro exemplo é Sanae Abdi, de origem marroquina e 34 anos, dos quais 12 de atividade no SPD, presidente da sucursal do partido em seu bairro na cidade de Colônia.
"Essa nova geração tem muito mais vantagens do que a primeira ou segunda geração de imigrantes", confirma Nergiz. "A maioria foi socializada no sistema de ensino alemão, eles recorrem a outras redes, também suprapartidárias, que apoiam suas carreiras."
Armand Zorn contou com o respaldo da iniciativa Brand New Bundestag, um grupo de ativistas da sociedade civil que contribuiu para a campanha de 11 candidatas e candidatos, do ponto de vista financeiro e logístico. Três deles conseguiram, de fato, uma cadeira no Parlamento.
Uma descendente de turcos à frente do Parlamento?
Apesar de todos os desdobramentos positivos, contudo, os obstáculos para os políticos de ascendência estrangeira ainda são muitos na Alemanha, reconhece Nergiz, recordando o caso de Tareq Alaow, que retirou sua candidatura devido a maciça hostilidade racista.
"Muitos com histórico migratório vivenciam isso, é um medo justificado recuar por causa disso. Infelizmente, até agora os partidos não têm nenhuma resposta para como evitar que o racismo seja uma barreira para o engajamento político."
Cabe agora ver se a tendência positiva terá prosseguimento no Bundestag e se os temas participação e representatividade realmente tomarão forma concreta, observa Deniz Nergiz. Por exemplo: tornando-se uma pré-condição para conversas de sondagem, ou resultado em postos concretos para os de origem estrangeira.
Pelo menos este último ponto poderá ocorrer na prática: para ocupar o importante cargo do presidente do Bundestag – formalmente o segundo na hierarquia política do país – quem está em cogitação é a deputada federal social-democrata Aydan Özoğuz, de 54 anos, nascida em Hamburgo de pais turcos.