1. Pular para o conteúdo
  2. Pular para o menu principal
  3. Ver mais sites da DW
PolíticaFrança

Macron sinaliza apoio a cooperação nuclear com o Brasil

27 de março de 2024

Em visita ao país, presidente francês diz que pode ajudar Defesa, e fala em "projetos mais ambiciosos" no setor. Para ele, Brasil e França têm que falar com "firmeza e força" se não quiserem ser "lacaios" dos outros.

https://p.dw.com/p/4eCdp
Lula e Macron caminham enquanto são observados por fuzileiros navais
Lula e Macron são saudados por fuzileiros navais em cerimônia de lançamento ao mar do submarino Tonelero, na Ilha da Madeira em Itaguaí (RJ)Foto: Ricardo Stuckert/PR

Após ouvir do presidente Luiz Inácio Lula da Silva que o Brasil quer construir um submarino com propulsão nuclear e desenvolver sua indústria de defesa para estar ao lado dos países que querem a paz, o presidente da França, Emmanuel Macron, disse nesta quarta-feira (27/03) que seu país está disposto a ajudar.

"Quero que nós abramos um capítulo para novos submarinos", disse o francês ao participar da cerimônia de inauguração em Itaguaí, no Rio de Janeiro, do terceiro de cinco submarinos desenvolvidos em parceria com a Marinha do Brasil.

Macron, porém, ressaltou que a cooperação desejada pelo Brasil depende de garantias para o uso pacífico da energia nuclear. "Se você quiser, a França estará ao seu lado", afirmou o político a Lula no segundo dia de sua viagem pelo país.

Pelo atual acordo, o Brasil ainda construirá seu primeiro submarino de propulsão nuclear com a ajuda dos franceses, o Álvaro Aberto, tornando-se o primeiro país a fazê-lo além dos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança das Nações Unidas – Estados Unidos, China, Rússia, Reino Unido e França.

Mas a propulsão nuclear da embarcação está sendo concebida somente pelos brasileiros, e dificuldades orçamentárias atrasaram o projeto, que deve ser concluído entre 2036 e 2037, segundo a Marinha.

Brasília tem tentado convencer Paris a aumentar a transferência de tecnologia para ajudá-la a integrar o reator ao submarino e permitir a compra de equipamentos que possibilitem a propulsão nuclear. A França, porém, tem relutado em ceder nesses pontos.

Defesa forte como dissuasão

Ao defender a construção do submarino com propulsão nuclear para a Marinha brasileira, Lula disse que o país quer desenvolver sua indústria de defesa para estar ao lado dos que querem a paz.

Segundo o petista, o Brasil quer dominar a tecnologia nuclear "não para fazer guerra", mas "para garantir a todos os países que querem paz, que saibam que o Brasil estará ao lado de todos", e que o país precisa de Forças Armadas "altamente qualificadas, preparadas e equipadas" para garantir a paz quando necessário.

Para Lula, a parceria militar franco-brasileira "mostra o interesse do Brasil em alcançar maior autonomia estratégica diante dos inúmeros conflitos que surgiram no mundo", e uma defesa forte é, também, garantia em caso de "animosidades contra o processo democrático".

Macron, por sua vez, sinalizou interesse em estreitar a cooperação militar entre os dois países e "lançar projetos mais ambiciosos" nas próximas décadas.

"Queremos que Brasil e França sejam grandes e poderosos porque a situação no mundo nos preocupa. E essa preocupação é também um pretexto para uma ambição ainda maior em que França e Brasil possam cooperar a serviço do mundo", disse.

"Brasil e França têm que falar com firmeza se não quiserem ser lacaios dos outros"

Sem mencionar nenhum conflito específico, Macron ressaltou que os dois países têm "a mesma visão do mundo" e se recusam a ser prisioneiros da disputa entre duas potências. Defendeu ainda que nações do porte da França e do Brasil têm que falar com "firmeza e força", se não quiserem ser "lacaios" de outras nações. "Temos de defender nossa independência, nossa soberania e o direito internacional."

O contrato que o Brasil assinou com o estaleiro estatal francês DCNS para a produção dos cinco submersíveis exigiu um investimento de R$ 40 bilhões e inclui ainda a construção de um complexo industrial e de uma base de apoio às operações dos submarinos em Itaguaí. A parceira atual prevê a completa transferência de tecnologia apenas para submarinos convencionais como o Tonelero lançado nesta quarta – que deverá ajudar a patrulhar a costa brasileira.

O submarino Tonelero, da Marinha brasileira
O submarino Tonelero, da Marinha brasileira, produzido em cooperação com a FrançaFoto: Ricardo Stuckert/PR

Com a transferência de tecnologia prevista na parceria com a França, o Brasil terá ampliada a capacidade de projetar, construir, operar e manter seus submarinos.

Clima amistoso

Essa é a primeira visita de um chefe do Executivo francês ao país em mais de dez anos – a última havia sido em 2013, sob o socialista François Hollande.

A viagem ocorre após um período de distanciamento com a instabilidade política no Brasil a partir de 2015 e o clima de franca animosidade durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (2019-2022).

Nas imagens que circularam até agora da visita, clicadas pelo fotógrafo oficial do Planalto, Ricardo Stuckert, nota-se um clima amistoso entre Macron e Lula – tal que internautas fizeram piada sobre elas lembrarem um ensaio de fotos pré-nupcial.

Macron segura uma mão de Lula com as duas mãos e olha sorridente para ele, que também sorri e olha para um ponto fora da imagem. Os dois estão em uma embarcação em um rio de Belém
Só sorrisos: fotos oficiais da visita do presidente Macron ao Brasil demonstram clima descontraído com Lula

Paris celebrou abertamente o retorno de Lula ao poder a partir das eleições de 2022. No ano anterior, num recado claro a Bolsonaro, Macron chegou a receber Lula em Paris com um protocolo reservado a chefes de Estado, mesmo que à época Lula fosse apenas pré-candidato à Presidência.

No entanto, Macron e Lula ainda mantêm divergências em vários temas, como o acordo Mercosul-União Europeia e a Guerra na Ucrânia, por exemplo – dois assuntos que, até agora, não parecem ter sido discutidos entre os dois.

Sustentabilidade

A agenda de Macron, de três dias, começou na terça em Belém do Pará, com o anúncio de planos para criação de uma unidade de conservação nacional entre o Brasil e a Guiana Francesa, território ultramarino francês na fronteira com o Amapá.

O projeto, que deverá ter um investimento de 2 bilhões de dólares (R$ 9,96 bilhões) deve ser um centro de referência para a pesquisa científica voltada para o desenvolvimento sustentável.

O líder indígena Raoni segura as mãos dos presidentes Lula e Macron, que olham sorrindo para ele
O líder indígena Raoni segura as mãos dos presidentes Lula e Macron durante encontro em Belém do ParáFoto: Ricardo Stuckert / PR

Macron e Lula também lançaram um programa para levantar 1 bilhão de euros (cerca de R$ 5,4 bilhões) em investimentos públicos e privados dentro de quatro anos para projetos de bioeconomia (economia sustentável) na Amazônia Legal brasileira e, também, na Amazônia da Guiana Francesa. A ação faz parte do Plano de Ação sobre a Bioeconomia e a Proteção das Florestas Tropicais, assinado pelos dois países.

Macron embarca para São Paulo na noite desta quarta, onde deve encontrar empresários franceses durante o Fórum Econômico Brasil-França, na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). Depois, participa de um jantar com artistas e personalidades da cultura brasileira, incluindo o cantor e compositor Chico Buarque.

Nesta quinta, Macron embarca para Brasília, onde será recebido com honras de chefe de Estado e se reunirá com Lula no Palácio do Planalto. Ali, os dois devem discutir temas como a reforma das instituições multilaterais e as guerras na Ucrânia e em Gaza.

ra/le (Agência Brasil, EFE, AFP, Lusa, ots)