Líder talibã discursou em mesquita na Alemanha
19 de novembro de 2023Após tomar conhecimento de uma visita recente de um alto funcionário do Talibã a uma mesquita na cidade de Colônia, o governo alemão reagiu condenando o episódio e cobrando o esclarecimento das circunstâncias da viagem.
Diretor talibã encarregado do controle de alimentos e medicamentos no Afeganistão, Abdul Bari Omar esteve na quinta-feira passada (16/11) em um templo muçulmano no bairro de Chorweiler, onde discursou diante de um público de 70 pessoas em tom elogioso sobre o trabalho dos radicais islâmicos, que assumiram o controle do país em 2021, após a saída das tropas americanas do território.
O episódio foi noticiado pela imprensa local no sábado e deixou autoridades alemãs perplexas. Ministra alemã do Interior, Nancy Faeser reagiu anunciando uma investigação e apelou à União Turco-Islamista das Instituições para Religião (Ditib), entidade que administra a mesquita, para que colabore com as autoridades e "ofereça uma explicação completa e muito rápida".
Em uma postagem no X, antigo Twitter, Faeser citou "tremendas violações de direitos humanos" cometidas pelo Talibã e afirmou que "ninguém deve dar palco a islamistas radicais na Alemanha". "Protegemos muitos refugiados do Afeganistão da opressão do Talibã. (...) Seus funcionários não têm nada o que fazer na Alemanha."
A Ditib é controlada pelo governo da Turquia e diretamente subordinada ao presidente turco, Recep Tayyip Erdogan,que esteve na sexta-feira em Berlim para uma visita oficial – a primeira em quase quatro anos. Recentemente, Erdogan causou polêmicas por declarações que sugeriam um alinhamento a outro grupo radical islâmico, o Hamas, a quem se referiu como "libertadores".
Em nota, a Ditib disse ter sido surpreendida pelo episódio e negou qualquer proximidade com o Talibã. A entidade sustenta que o evento foi organizado por uma associação cultural afegã não afiliada, sob o pretexto de promover um evento religioso, sem conotação política.
"O caráter ideológico misantropo, misógino e iliberal do Talibã não pode ser de forma alguma legitimado pela nossa fé. Nós, como muçulmanos, nos opomos decididamente a essa interpretação [que o Talibã faz do Islã]."
Oficial talibã participou antes de evento da OMS em Haia e foto circulou nas redes sociais
A Alemanha não concedeu visto a Omar. Acredita-se que ele tenha conseguido entrar no país com um visto Schengen expedido pela Holanda – o representante do Talibã participou de uma conferência da Organização Mundial de Saúde (OMS) na cidade de Haia no início do mês.
O ministro holandês da Saúde, Ernst Kuipers, informou que o caso está sob investigação – ele posou para uma foto com Omar durante o evento da OMS, mas disse depois que não o conhecia e que se arrependia do registro. A imagem circulou no X à época, mas só despertou atenção após a revelação do evento na mesquita de Colônia.
O Ministério alemão das Relações Exteriores diz que não tinha conhecimento da viagem do funcionário do Talibã e que estuda como reagir ao episódio. "Repudiamos nos mais duros termos a aparição dele [na mesquita]", afirmou a pasta ao jornal regional Kölner Stadt-Anzeiger, ressaltando ainda que não haverá normalização das relações diplomáticas com o Afeganistão enquanto o Talibã "excluir a metade da população afegã de participação social e pisotear flagrantemente os direitos humanos, principalmente de mulheres e garotas".
O gabinete de governo do estado da Renânia do Norte-Vestfália também manifestou sua insatisfação com a entrada do líder talibã na Alemanha. "Que membros de uma organização radical como o Talibã possam disseminar suas ideologias em solo alemão, sem filtros, é algo indescritível", declarou um porta-voz ao jornal de Colônia.
O Ministério estadual do Interior destacou que o Talibã deixou de ser oficialmente reconhecido como organização terrorista ou criminosa após assumir o governo afegão, em setembro de 2021.
Porta-voz dos conservadores do CDU/CSU no Bundestag, Alexander Throm disse que a entrada de Omar na Alemanha é um "atestado de inépcia" do governo.
A deputada Sahra Wagenknecht, ex-A Esquerda, defendeu que imames – sacerdotes muçulmanos – na Alemanha deixem de ser bancados pelo governo turco, e declarou que o fundamentalismo islâmico não faz parte da Alemanha. "Imames devem ser formados na Alemanha e devem ser financiados por impostos recolhidos junto à comunidade muçulmana local", argumentou. "Não podemos continuar ignorando, quando no entorno de algumas mesquitas um certo radicalismo se estabelece, quando imames inflamam o ódio contra nossa cultura."
ra (KNA, dpa, Lusa, ots)