Lei de proteção cultural ameaça esvaziar museus da Alemanha
15 de julho de 2015Sob fortes críticas, a ministra alemã da Cultura, Monika Grütters, apresentou nesta quarta-feira (15/07), em Berlim, o projeto de uma lei para proteção do patrimônio cultural nacional.
Ainda em forma provisória e sujeita a aprovação pelo gabinete federal, a regulamentação inclui a implementação, na legislação alemã, da diretriz da União Europeia pela defesa do patrimônio cultural de maio de 2014, assim como da convenção das Nações Unidas relativa ao assunto.
Segundo Grütters, a meta principal é impedir o êxodo de objetos de arte para fora do país, inclusive colocando os acervos museológicos do país sob "proteção coletiva contra a exportação". No texto se define pela primeira vez, de forma vinculativa, o que constitui "patrimônio cultural nacional" – decisão que atualmente cabe, em primeira linha, a comissões estaduais.
Desde seu anúncio, há algumas semanas, o projeto de lei vem desencadeando atritos entre o governo federal e o setor de comércio de arte. Galeristas, colecionadores, marchands, leiloeiros e artistas acusam Berlim de pretender obstruir seriamente o comércio de arte transnacional.
A ministra da Cultura assegurou que, ao apresentar em Berlim o texto – que ainda passará passar por várias instâncias de controle –, ela quer trazer mais objetividade ao debate. Além disso, teriam sido escutados representantes do setor em todas as fases da discussão da lei. E acrescentou, num adendo mais revelador do que tranquilizador: "Proteção, a meu ver, não significa desapropriação."
Tiro pela culatra
O temor da desapropriação é, justamente, o motivo central da atual avalanche de críticas por parte dos que vivem da arte na Alemanha. O pintor Georg Baselitz foi o primeiro a dar passos concretos diante da aparente ameaça à sua produção artística, exigindo de volta todos os seus quadros emprestados a museus nacionais. As instituições implicadas já estão se preparando para a devolução.
Mayen Beckmann, neta de Max Beckmann (1884-1950), anunciou que igualmente pretende retirar dos museus as obras do artista representante do movimento pós-expressionista Nova Objetividade. A herdeira quer evitar o que classifica como "confisco" do patrimônio familiar.
Em entrevista ao jornal Dresdner Morgenpost, Gerhard Richter – considerado o pintor vivo mais caro do mundo – disse não descartar a possibilidade de que venha a seguir o exemplo de Baselitz. Ele considera a planejada lei um atentado à liberdade: "Ninguém tem direito de me prescrever o que eu devo fazer com os meus quadros." Portanto, não vai mostrá-los a nenhuma comissão, nem perguntar antes de vendê-los, garantiu.
O colecionador e mecenas Peter Raue comentou à DW que a ministra faz questão de ignorar que, na forma até agora conhecida, a lei "desapropria de fato os colecionadores dessas valiosas obras".
Nenhum proprietário particular "cujos quadros valem 100 milhões vai aceitar receber só 10 milhões por eles, por a Sra. Grütters achar que essas obras devem permanecer na Alemanha", afirmou. "Quando a lei realmente chegar, vou aconselhar todos os colecionadores a levarem as obras para fora do país."
Desse modo, a bem intencionada investida legislativa do Ministério da Cultura ameaça virar um tiro pela culatra, precipitando precisamente aquilo que foi criada para evitar: um êxodo radical do patrimônio artístico da Alemanha.
AV/dpa/epd/dw