Jornal alemão: Com ou sem Lula, Brasil não escapará de ajuste
24 de junho de 2002O Brasil está diante de grandes desafios, independente de quem ganhe as eleições de outubro, escreveu o Frankfurter Allgemeine Zeitung, na última sexta-feira (21). O conceituado diário conservador traz um artigo intitulado "O problema não é só o Lula", para o qual consultou David Sekiguchi, especialista em aplicações do Deutsche Bank em Nova York.
Mercados dariam mais tempo a Serra
– As últimas turbulências nos mercados financeiros no Brasil têm sido explicadas com o avanço de Lula nas pesquisas de intenção de voto. O candidato do PT à presidência teria pouco tempo para fazer as adaptações necessárias logo após a vitória, opina Sekiguchi. Mas José Serra também estaria sob grande pressão desde o início. A única diferença é que os mercados, por uma questão de confiança, dariam ao candidato de Fernando Henrique mais tempo para realizar a tarefa.Para o economista do maior banco alemão, os três pontos fracos do Brasil são:
- alto déficit no balanço de pagamentos, que já se tornou crônico,
- o déficit orçamentário,
- e, também, a estrutura de curto prazo da dívida interna.
Preocupações com a solvência do Estado
– O governo acumulou altas dívidas com duração média de apenas dois anos. Os últimos acordos com o FMI garantem liquidez para sair do impasse. No entanto, isso não basta para remover as dúvidas quanto à solvência do Estado brasileiro a médio e longo prazos.David Sekiguchi reconhece os progressos que Brasília fez desde 1999 para aumentar o superávit bruto do orçamento a 3,5% do PIB. No entanto, depois de pago o serviço da dívida, restou um déficit líquido de 5,2% pelos cálculos do Deutsche Bank. Ou seja, o superávit bruto teria que ser de 5% para equilibrar as contas. Contudo, o próprio analista se pergunta até que ponto isso seria politicamente realizável.
Rússia e Turquia como exemplos ?
– Independente de quem saia vitorioso nas urnas, o Brasil terá que fazer os ajustes necessários. "A Rússia e a Turquia conseguiram superávits brutos maiores ainda", diz o economista. Pelas suas previsões não haverá insolvência e suspensão de pagamentos como na Argentina, mas "os riscos aumentarão se não forem adotados ajustes", adverte.O fluxo de investimentos estrangeiros diretos é um importante indicador econômico. No caso do Brasil, o montante diminuiu em relação aos últimos anos, mas "no ano em curso os investimentos se mantiveram acima de nossas expectativas", afirmou. Manter esse fluxo é fundamental para o Brasil, pois diminuindo a entrada de capitais, pela insegurança política, seria mais difícil financiar o déficit do balanço de pagamentos, que é de 4% do PIB.
Argentina contagiou América Latina
– A crise argentina de certa forma contagiou o Brasil, segundo o Deutsche Bank. Um sem-número de investidores institucionais estariam reduzindo o seu engajamento, não apenas no Brasil como em toda a América Latina. O que aconteceu, segundo Daniel Sekiguchi, é que eles ficaram com dúvidas quanto ao futuro da região.Mais importante do que a Argentina é a situação econômica mundial e a conjuntura nos Estados Unidos. Os juros baixos nos EUA favoreceriam a cotação dos títulos da dívida nos mercados emergentes. A recomendação de Daniel Sekiguchi é clara: não comprar títulos argentinos, que estão acima do seu valor, e nem da Venezuela, pela instabilidade política. Já os do Brasil, "apesar de todos os riscos devem ser considerados neutros em uma carteira de países emergentes." Mas a preferência é pelo México, Peru e Equador. O México principalmente pela boa avaliação de sua solvência por parte das agências de rating.