Bolsonaro liga sua metralhadora verbal
31 de julho de 2019Todas as barragens se romperam, todos os filtros – caso existissem – foram desligados. Nos últimos dias, o presidente vem catapultando em modo turbo seus pensamentos em direção ao mundo. E tudo é cuidadosamente verificado pela mídia para ver o que é "balela".
Ele sempre foi bom em criar polêmicas. Em maio e junho, no entanto, houve esperanças repentinas de que um pouco de paz retornasse ao Planalto. Mas o comedimento da época era para favorecer apenas a votação sobre a reforma da Previdência. Polêmicas demais são contraproducentes, dizia-se na época.
Bolsonaro se sente agora, de qualquer forma, predestinado a produzir várias polêmicas por dia. É preciso que ele aborde tudo o que sempre o incomodou: a agência de cinema Ancine deve acabar, assim como as autoescolas, cadeirinhas nos carros e os radares nas estradas.
A reserva natural, que se estende em frente à sua casa de praia em Angra dos Reis e que o incomoda durante a pescaria, deve desaparecer, assim como o funcionário do Ibama que o multou em 2010.
Também pode ir embora o jornalista Glenn Greenwald, que se casou com um brasileiro sem a anuência de Bolsonaro, adotou crianças e agora não pode mais ser extraditado. Ou não é malandro?
Se Bolsonaro se sente confortável no cargo depois de sete meses? É difícil dizer, pois ele parece sempre bastante infeliz, quer esteja feliz ou não. Mas talvez essa aparência seja enganadora. Em todo caso, ele parece gostar da atenção que seu palavreado está recebendo agora.
Tirando conclusões a partir de seu sentimento, ele acha que os números de desmatamento do Inpe estão errados, assim como as confissões de culpa por parte dos militares de assassinar militantes da oposição durante a ditadura. Ele afirma que, nesse ponto, não pode provar nada, como também diz não ter nada escrito. Mesmo assim, ele está certo de que: é tudo "balela".
Em vez de receber o ministro das Relações Exteriores da França, ele vai ao cabeleireiro e ainda transmite ao vivo o seu corte de cabelo. Mais uma vez, sua aparência é tristonha enquanto continua a falar ininterruptamente. Será que ele sofre de falta de atenção?
Muito leva a crer que isso seja verdade: o filho Carlos o aconselhara a parar as conversas de café da manhã com os jornalistas, pois disso só sairiam ataques contra o presidente. Mas Bolsonaro parece procurar cada vez mais desesperadamente a proximidade da mídia que espera obedientemente pela próxima polêmica.
Para conter o fluxo interminável de farfalhadas descuidadas, o ministro do Supremo Tribunal Federal, Marco Aurélio Mello, até recomendou: "No mais, apenas criando um aparelho de mordaça." Nesse contexto, perdeu-se a oportunidade de se entrar em ação, em 17 de abril de 2016, quando o então deputado federal celebrou o torturador Brilhante Ustra no Congresso Nacional. Agora, provavelmente, é tarde demais.
O presidente dos EUA, Donald Trump, ídolo de Bolsonaro, gabou-se certa vez durante a campanha eleitoral de que poderia "ficar no meio da Quinta Avenida e atirar em alguém" sem correr o risco de perder um único eleitor. Claro que isso também se aplica a Jair Messias Bolsonaro, pelo menos no sentido figurado.
Assim como Trump, ele acredita que seus filhos são predestinados a moldar as questões mundiais. Será que o pai Bolsonaro, que adora os EUA, mas não entende uma palavra do que se diz por lá, sabe que o filho Eduardo na verdade só fala um "inglês macarrônico"? Eduardo o enganou sobre suas habilidades em línguas estrangeiras?
Um simples mortal sempre se pergunta de onde os grandes estadistas tiram sua autoconfiança quase inabalável. No caso de Trump, é compreensível que uma fortuna bilionária ajude a tirar a insegurança do caminho.
Mas pessoas como Eduardo Bolsonaro acreditam realmente que podem ser bons embaixadores? Ele fica nervoso quando pensa no novo cargo em Washington? E há cursos a distância que explicam o que se tem que fazer por lá?
Talvez ele ache simplesmente: se papai pode ser presidente, eu já posso ser embaixador há muito tempo. A autoconfiança saudável parece ser hereditária. "Talkei?"
Thomas Milz saiu da casa de seus pais protestantes há quase 20 anos e se mudou para o país mais católico do mundo. Tem mestrado em Ciências Políticas e História da América Latina e, há 15 anos, trabalha como jornalista e fotógrafo para veículos como o Bayerischer Rundfunk, a agência de notícias KNA e o jornal Neue Zürcher Zeitung. É pai de uma menina nascida em 2012 em Salvador. Depois de uma década em São Paulo, mora no Rio de Janeiro há quatro anos.