Impasse no Congresso deixa programa da NSA em limbo
1 de junho de 2015O artigo 215 do Patriot Act expirou nesta segunda-feira (01/06). E, pela primeira vez desde os atentados de 11 de setembro de 2001, o governo americano viu a lei que regulamenta a espionagem da Agência Nacional de Segurança (NSA) perder a validade, enfrentando agora limitações para monitorar as comunicações de seus cidadãos.
Eram três as opções na mesa, durante o longo debate que se estendeu no Senado até as últimas horas de domingo: reformar a lei, como defende o presidente Barack Obama; estendê-la, sem qualquer alteração, permitindo o armazenamento de dados sem restrições; ou simplesmente deixar o artigo 215 expirar, como aconteceu.
O artigo em debate permite às autoridades americanas recolher informações relevantes para as investigações domésticas de atos de terrorismo. Ele foi usado como base legal para o chamado programa de metadados – dados sobre as chamadas telefônicas, como hora, duração e o número, que, uma vez coletados e cruzados, geram à NSA informações valiosas.
"A queda do artigo 215 demonstra, de fato, a força e o desejo de uma reforma em prol da privacidade nos Estados Unidos, mas ele não é a única parte do Patriot Act que o governo pode usar para coletar esses dados", opina o especialista Jake Laperruque, do centro de estudos CDT.
Vitória parcial para Obama
Foram 77 votos a favor da reforma e 17 contra. A votação, em tese, abriria caminho para a confirmação da lei, mas o senador Rand Paul, um republicano da corrente libertária e pré-candidato a presidente, impediu que isso acontecesse antes da meia-noite.
Paul acusa o programa da NSA de ser ilegal e inconstitucional, e se opõe tanto à lei vigente quanto à sua versão reformada. Com sua iniciativa, os críticos da espionagem conseguiram uma vitória simbólica.
O resultado da votação foi também uma vitória parcial para Obama, que defende a reforma como uma maneira de lidar com as questões de privacidade, ao mesmo tempo preservando uma ferramenta importante de combate ao terrorismo. Uma votação final deve ocorrer nesta terça-feira.
O impasse reflete a profunda mudança na política americana desde o 11 de Setembro, quando a segurança – e o combate ao terrorismo – era praticamente consenso entre democratas e republicanos.
Hoje, o debate opõe quem considera que a NSA é imprescindível no combate ao terror e quem argumenta que a espionagem viola as liberdades civis. Mesmo dentro do Partido Republicano há divisões, exemplificadas pela postura do libertário Rand Paul e do ex-candidato a presidente John McCain, voraz defensor da vigilância.
Consenso sobre riscos
Para o especialista em segurança Cully Stimson, da fundação Heritage, o Congresso deveria manter pelo menos alguma versão do atual programa, mesmo que mais limitada.
"Não se pode jogar fora uma ferramenta valiosa como essa", opina. "Especialmente no momento em que os riscos de ataques terroristas estão crescendo, com cada vez mais ocidentais sendo recrutados pelo 'Estado Islâmico'."
A também especialista Liza Goitein, do Centro Brennan, cita um relatório do Departamento de Justiça americano indicando que não houve um único caso de ataque terrorista que tenha sido evitado diretamente devido ao artigo 215.
O artigo, lembra Goitein, contém um trecho que permite a vigilância de potenciais "lobos solitários", ou seja: pessoas não necessariamente ligadas a organizações terroristas, mas que trocam de telefone celular seguidamente. "Esse trecho do artigo jamais foi usado", argumenta ela.
Quando decidiu impor barreiras à renovação do Patriot Act, o senador Rand Paul admitiu que a reforma em algum momento será implementada. Porém, se o Senado resolver adicionar uma emenda ao texto já aprovado pela Câmara dos Representantes, terá que haver nova votação – e o risco de novo impasse.
Tanto defensores como críticos da espionagem concordam que essa situação de limbo em que a lei se encontra é perigosa: os libertários temem que, até que o impasse se resolva, agências de inteligência permaneçam sem reforma; e os conservadores se dizem preocupados que, nesse meio tempo, as autoridades não tenham, mesmo que de forma limitada, dados suficientes para promover investigações.