Hungria suspende imposto sobre a internet
31 de outubro de 2014Sob a pressão de protestos, o primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán, anunciou que vai suspender os seus planos de taxação do uso da internet no país. "Quando o povo não somente desaprova algo, mas também o considera irracional, então não há razões para fazê-lo", afirmou o chefe de governo, em entrevista de rádio nesta sexta-feira (31/10). Mas ele disse que pretende lançar uma nova iniciativa no próximo ano.
Os planos do governo em Budapeste previam um imposto de 150 forintes (cerca de R$ 1,50) por gigabyte de dados transmitidos. Para pessoas físicas, o limite máximo mensal desse imposto deveria girar em torno dos R$ 7,00.
A decisão de Orban sucede a uma série de grandes protestos na Hungria. No último domingo e nesta terça-feira, dezenas de milhares de pessoas tomaram as ruas de Budapeste para protestar contra o projeto do governo. Segundo os manifestantes, a planejada taxação do tráfego de dados na internet restringe os direitos e as liberdades democráticas. Críticas semelhantes também vieram da União Europeia (UE).
Críticas europeias
A Comissão Europeia classificou os planos do governo húngaro de "uma ideia terrível". Segundo a comissária europeia para Assuntos Digitais, Neelie Kroes, a proposta seria mais um passo preocupante do governo húngaro. Preocupante porque o Orbán tem tomado, repetidamente, decisões que afetam a liberdade de imprensa na Hungria.
O imposto sobre o tráfego de dados proposto por Orbán é algo único no mundo. Mas, já no final de 2010, entrou em vigor na Hungria uma lei da mídia que chamou a atenção de toda a Europa. A lei previa, entre outros, que os jornalistas se comprometessem a "informar de forma equilibrada e a fortalecer a identidade nacional". Para garantir que isso acontecesse, foi criado um órgão regulador da mídia, que poderia impor pesadas multas no caso de infração.
Quem não cumprisse as vagas determinações do governo – cuja escolha de palavras pode ser interpretada de forma arbitrária – poderia contar com pesadas multas. Isso afetaria jornais e revistas, emissoras, blogueiros e portais de internet. Falava-se de uma "homogeneização", de uma "autocensura da mídia" ordenada pelo governo. A UE protestou veemente contra esse projeto – e ameaçou com consequências. Orbán finalmente cedeu e abrandou a lei, acalmando assim, ao menos temporariamente, os ânimos na Comissão Europeia.
História continua
O tema saiu das manchetes por um tempo. Então, em novembro de 2013, o Parlamento em Budapeste aprovou uma dura multa para a divulgação de áudios e vídeos supostamente difamatórios. Para os órgãos reguladores da mídia, há uma ampla margem para a interpretação do conceito "difamatório". Isso torna praticamente impossível, por exemplo, a realização de vídeos com conteúdo crítico ao governo.
Em junho de 2014 surgiu então um novo caso: o editor-chefe de um portal independente de notícias foi demitido após uma série de artigos críticos ao governo. Além disso, foram introduzidos aumentos de impostos drásticos sobre as receitas de publicidade. Isso significa o fim das publicações pequenas e independentes, dizem os críticos, explicando que esses meios de comunicação vivem das receitas de publicidade.
Imposto até sobre higiene
A finalidade do planejado imposto sobre a internet seria aliviar, supostamente, os cofres do Tesouro húngaro. O país está muito endividado. Assim, na Hungria, tudo é tributado: do envio de mensagens de texto, passando pelo café e espumante até artigos de higiene pessoal. Além do mais elevado Imposto sobre Valor Agregado da Europa (27%), há também um imposto sobre as telecomunicações e sobre as transações bancárias.
Embora o planejado imposto mensal máximo de cerca de R$ 7,00 sobre a internet não parecesse algo dramático, ele representava mais um taxa para o contribuinte húngaro, cada vez mais sobrecarregado. As empresas também deveriam ser afetadas. E, certamente, iriam transferir os novos custos para os usuários.
Mas, mais do que o novo imposto, o que provocou a ira de muitos húngaros foi o ataque à internet que ele representava. Dezenas de milhares de pessoas tomaram as ruas de Budapeste para pedir a retirada dos planos do governo. E Orbán acabou cedendo, a princípio.
Já há muito tempo, a organização Repórteres sem Fronteiras (RSF) vem constatando uma tendência de queda da liberdade de expressão na Hungria. No Índice da Liberdade de Imprensa divulgado pela RSF no início deste ano, a Hungria caiu sete pontos e ocupa agora a 64ª posição entre 180 países listados.