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Governo deve proibir uso do Bolsa Família para bets

27 de setembro de 2024

Banco Central apontou que beneficiários do programa gastaram R$ 3 bilhões em apostas online via Pix somente em agosto. Segundo ministro, Lula pediu "urgentes providências" para reverter a situação.

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Um celular e um computador apresentam telas contendo jogos e empresas de apostas.
Cerca de 30% dos jovens brasileiros entre 16 e 24 afirmaram já ter feito apostasFoto: John Stillwell/empics/picture alliance

Beneficiários do Bolsa Família não devem mais poder usar o dinheiro do auxílio para gastar em apostas online. Nesta sexta-feira (27/09), o Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS) afirmou que "criou um Grupo de Trabalho com a Rede Federal de Fiscalização do Bolsa Família e Cadastro Único com objetivo de apresentar uma proposta, até a próxima quarta-feira (02/10), sobre uso de recursos do cartão Bolsa Família com apostas online (bets)".

A iniciativa do governo federal surgiu depois de um levantamento elaborado pelo Banco Central (BC) apontar que inscritos no programa direcionaram cerca de R$ 3 bilhões para bets (casas de apostas eletrônicas) via Pix somente no mês de agosto.

Em nota, o MDS também reiterou "que os programas sociais de transferências de renda foram criados para garantir a segurança alimentar e atender às necessidades básicas das famílias, das pessoas em situação de vulnerabilidade".

"A prioridade sempre será combater a fome e promover a dignidade para quem mais precisa. O foco do MDS permanece firme em garantir que o Bolsa Família continue sendo um instrumento eficaz de combate à pobreza e à insegurança alimentar."

Em Nova York para a 79ª edição da Assembleia Geral da ONU, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) mostrou-se indignado com a informação de que verbas destinadas ao programa social estão sendo usadas para aposta, segundo o jornal Folha de S.Paulo.

"O presidente defende que Bolsa Família é para alimentação e necessidades básicas de cada família beneficiária. Pediu urgentes providências", disse o ministro do Desenvolvimento Social, Wellington Dias, ao jornal. 

Lula também teria demonstrado preocupação com o impacto das apostas na população em situação de vulnerabilidade, incluindo adultos, jovens e adolescentes.

Segundo Dias, a regulamentação das bets, que é coordenada pelo Ministério da Fazenda e pela Casa Civil, deve impor limite zero para o cartão do Bolsa Família para jogos – além de controle do CPF de quem aposta, o que está previsto na regulação do setor no Brasil.

Com isso, o cartão do Bolsa Família, que pode ser utilizado para compras no débito, saque do benefício e outras movimentações, não deverá mais funcionar para apostas online.

Por que é tão perigoso se viciar em games de aposta?

"Chefes de família" são maioria

O levantamento do BC foi feito após um pedido do senador Omar Aziz. Os dados apontaram que cerca de um quarto dos 20 milhões de beneficiários do Bolsa Família realizaram apostas via Pix em agosto, com gasto médio de R$ 100, tanto em eventos esportivos quanto em cassinos virtuais.

De um total, portanto, de 5 milhões de apostadores, 70% seriam chefes de família que, no mês passado, gastaram R$ 2 bilhões com bets, ou seja, 67% dos R$ 3 bilhões despendidos.

O montante final de apostas feitas por beneficiários do Bolsa Família pode ser ainda maior, já que os dados do BC indicam somente as apostas via Pix, excluindo, assim, outras formas de pagamentos, como cartões de débito, crédito ou transferência eletrônica direta (TED).

O valor total pago pelo governo ao programa Bolsa Família em agosto foi de R$ 14,12 bilhões, destinados a 20,76 milhões de beneficiários, com valor médio de R$ 681,09 nesse período.

Apostas via Pix triplicaram

Segundo o estudo do BC, a estimativa é de que o gasto mensal com bets seja de R$ 18 bilhões e R$ 21 bilhões. Em agosto, período investigado, o volume chegou a R$ 20,8 bilhões – para se ter uma ideia, o número é mais de dez vezes maior do que o montante de R$ 1,9 bilhão arrecadado pelas loterias da Caixa Econômica Federal.

Em um evento na última terça-feira em São Paulo, o presidente do BC, Roberto Campos Neto, afirmou que as transferências para apostas via Pix triplicaram desde janeiro.

Na semana passada, o Ministério da Fazenda anunciou a suspensão de empresas de apostas que até o dia 30 de setembro não tiverem pedido de autorização para atuarem no país. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, classificou a situação como uma "pandemia" e uma "questão de dependência psicológica".

Haddad também afirmou que será preciso implementar um sistema para controlar "CPF por CPF" para "abrir essa conta", a fim de combater o problema não somente de maneira fiscal, mas sim para proteger os apostadores.

Brasil vive epidemia de jogatina

A prática de jogos de azar tem crescido de maneira expressiva no Brasil desde a aprovação de uma lei para apostas online em 2018, durante o governo do então presidente Michel Temer. E cresceu consideravelmente durante o governo Jair Bolsonaro (PL), sem maiores fiscalizações ou regras.

A lei de 2018, segundo o governo, previa a regulamentação desse mercado em até dois anos, que seriam prorrogáveis por mais dois anos.

Hoje, o país ocupa a terceira posição mundial em consumo de casas de apostas, atrás apenas dos Estados Unidos e do Reino Unido, conforme dados da Comscore, empresa especializada em análise de dados.

De acordo com uma pesquisa do Datafolha publicada em janeiro deste ano, pelo menos 30% dos jovens entre 16 e 24 afirmaram já ter feito apostas, o dobro da média nacional, que é de 15%.

Aziz afirmou que fará contato com a Procuradoria-Geral da República (PGR) para ingressar com ações judiciais para que páginas de casas de apostas sejam retiradas do ar até serem regulamentadas pelo governo federal.

gb (ots)