Governo colombiano e Farc preparam-se para início das negociações de paz
15 de outubro de 2012O governo da Colômbia e o comando das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) sentam à mesa de negociações a partir desta quarta-feira (17/10) para tentar chegar a um acordo de paz. Mas por conta da complexa agenda de discussões, um entendimento está longe de ser alcançado.
Há quase 50 anos, as Farc e o Exército de Libertação Nacional (ELN) lutam contra o Estado colombiano. O conflito levou à morte de centenas de milhares de pessoas, e mais de cinco milhões tiveram que fugir das regiões de confronto para outras partes do país.
A guerrilha foi fundada, inicialmente, para lutar por uma melhor distribuição da terra – reivindicação que obteve, inicialmente, apoio da população. Entretanto, a guerrilha perdeu aprovação por causa das inúmeras vítimas causadas pelos conflitos. Agora as pessoas esperam pelo fim da guerra.
Durante as negociações, que devem ir até julho de 2013, a paz é apenas uma esperança. Governo e guerrilha ainda não entraram em acordo sobre um cessar-fogo. O governo colombiano teme que a guerrilha utilize a pausa nos combates para juntar forças e se recompor.
Mesmo assim, segundo uma sondagem de opinião do instituto de pesquisa Gallup, cerca de 60% dos colombianos aprovam as negociações de paz. A população está cansada da guerra.
Perspectivas pouco claras
As Farc perderam força ao longo dos anos. De acordo com dados dos militares colombianos, a guerrilha tem hoje cerca de 8 mil combatentes – há dez anos eram 18 mil. Muitos dos seus líderes foram mortos, e os rebeldes foram expulsos de algumas partes do país.
"Hoje eles sabem que nunca poderiam vencer o conflito pela via militar", diz León Valencia, diretor executivo da organização não-governamental Nuevo Arco Iris. "Seu sonho de triunfo foi perdido."
O governo colombiano compreendeu, também, que o conflito militar não teria fim. Álvaro Uribe, antecessor do atual presidente Juan Manuel Santos, descartou de forma categórica o diálogo com as Farc.
Santos segue em peso a política militar de Uribe, mas, ao mesmo tempo, está aberto a negociações. Diante desse longo combate entre as duas partes, o consenso sobre iniciar a negociação já é, sem dúvida, um grande sucesso.
Em negociações sigilosas nos últimos meses em Havana, o governo colombiano e as Farc fecharam cinco pontos centrais para se chegar até o acordo de paz. Em Oslo, na Noruega, as conversas terão o objetivo de se "estabelecer confiança" entre as duas partes, explica Sabine Kurtenbach, especialista do Instituto Alemão de Estudos Globais e Regionais (Giga), em Hamburgo.
Isso porque, nas últimas negociações de paz, as duas partes teriam acumulado "experiências traumáticas". Nos anos 80, depois de um acordo de paz, entrega das armas e criação de um partido político, cerca de 3 mil guerrilheiros foram mortos por esquadrões da morte.
Em 1998, na última tentativa de negociação entre o governo e as Farc, os militares evacuaram uma região do país. A guerrilha usava a região como posição de recuo segura enquanto reforçava seus ataques em outras partes do país.
Agenda complexa
É difícil afirmar, neste momento, se haverá sucesso nas negociações, disse Kurtenbach. Para isso, há muitos obstáculos. Na agenda, além da definição do caminho a ser seguido pelas negociações, há uma lista extensa de outros temas importantes. Entre eles, a integração das Farc nas estruturas políticas do país e o tratamento jurídico quanto aos criminosos da guerrilha.
As organizações de direitos humanos temem que os líderes das Farc possam receber penas reduzidas ou, até mesmo, sair impunes pelos crimes cometidos.
A temática desenvolvimento rural é muito importante, segundo Kurtenbach. "Há muita pobreza e miséria. Quando não têm perspectiva, as pessoas migram para as cidades, aderem à guerrilha ou se envolvem no comércio de drogas – e isso tem que parar." Assim, as negociações devem indicar algumas perspectivas de desenvolvimento.
Se o acordo de paz for realmente fechado, a Colômbia estará frente a uma difícil tarefa: a de integrar na sociedade milhares de guerrilheiros e simpatizantes das Farc. "Essas pessoas precisam de uma perspectiva sobre como poderão sobreviver na vida civil", diz Kurtenbach. Muitos deles aprenderam somente o ofício da guerra e, sem perspectivas, poderiam novamente voltar a pegar em armas. E homens e mulheres com experiência de combate a Colômbia já tem que chegue.
Os bandos criminosos e esquadrões da morte da extrema direita também vão continuar a praticar suas atividades fraudulentas, mesmo depois de um acordo de paz.
Paz virá com atraso
Para muitos colombianos, como Selatiel Méndez Secue – que sonhava com a paz, com uma vida sem guerrilha, sem militares e sem armas – as negociações de paz entre o governo e a guerrilha vêm tarde demais.
No início de outubro, Secue, de 40 anos, líder da tribo dos Nasa, foi assassinado por três soldados das Farc na frente da sua esposa. Eleapostava nos meios pacíficos para a retirada de guerrilheiros, militares e grupos paramilitares das terras indígenas.
Mas esses esforços são rejeitados por ambas as partes envolvidas no conflito. Na região, somente neste ano, foram mortos cerca de 40 representantes dos índios – assassinados pela guerrilha ou pelos esquadrões da morte de extrema direita.
Em consequência disso, a raiva é grande entre os índios. "De qual paz estão falando o governo e as Farc? Qual paz que eles estão negociando, se continuam massacrando os membros indefesos da nossa comunidade?", escreveu a organização indígena CRIC no seu site na internet.
Autor: Nils Naumann (fc)
Revisão: Francis França