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Governo Bolsonaro luta para mostrar sintonia

8 de janeiro de 2019

Primeira semana dá sinais de falta de coordenação e de um programa claro no gabinete, enquanto presidente, ainda em tom de campanha, atua para aparar arestas. Comunidade internacional olha com desconfiança.

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Presidente em sessão de gabinete: desencontro entre membros na primeira semana
Presidente em sessão de gabinete: desencontro entre membros na primeira semanaFoto: Reuters/Presidency/M. Correa

A partir de agora, as meninas vestem rosa, os meninos, azul, disse a nova ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves. E o Brasil vai ser finalmente libertado do socialismo, prometeu o presidente Jair Bolsonaro. Em sua primeira semana, o novo governo brasileiro promoveu, acima de tudo, muita polêmica, deixando observadores e as mídias nacional e internacional apreensivos.

"É evidente que existem polêmicas, e tem muito espaço na mídia para isso. Mas por enquanto isso não tem grande influência dentro do governo Bolsonaro, pois o tom será dado na economia e na área política", diz o cientista político Ricardo Ismael, da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ).

"Tivemos uma semana de muita falação, de muita conversa e de poucas medidas de natureza prática", opina o também cientista político Marco Aurélio Nogueira. "Uma primeira semana que mostra uma grande dificuldade de o governo de estabelecer um rumo claro de atuação."

Até meados de 2018, diz o cientista político, nem mesmo o próprio Bolsonaro contava com a vitória nas eleições: "O grupo que dá sustentação [ao governo] é um grupo ainda meio virgem. Uma semana ainda é um tempo curto."

Mas isso não é desculpa para a continuação dos ataques – tão bem-sucedidos na campanha eleitoral – aos adversários políticos, avalia o especialista. "Ao mesmo tempo, o governo não pode fingir que está governando. E não pode ficar em campanha."

Até porque a comunidade internacional olha com desconfiança para o país. Ao lado da possibilidade de os Estados Unidos montarem uma base militar no Brasil, está prevista, sobretudo, a transferência da embaixada brasileira para Jerusalém.

"Um verdadeiro desastre", opina Nogueira, apontando que até mesmo a ditadura militar (1964-85) manteve uma política externa o mais neutra possível. "É apenas discurso, mas é uma bobagem que sinaliza uma guinada na política externa brasileira que é muito ruim para o país."

Especialmente preocupantes são as declarações do ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, contrário à política multilateral e fã declarado do presidente americano, Donald Trump. Enquanto entre os adeptos de Bolsonaro no Brasil ele marca pontos, observadores estrangeiros estão incrédulos.

"Agora, pela primeira vez em muitos anos, a política externa ficou inteiramente capturada pela política interna. Para a afirmação do Estado brasileiro no mundo, é uma tragédia", considera Nogueira.

Também a retirada da alçada da Funai das decisões sobre a demarcação de terras indígenas despertou apreensão internacional. A partir de agora, o responsável pela questão passa a ser o Ministério da Agricultura, dominado pelo lobby ruralista, o que gera temores em relação ao futuro da Floresta Amazônica.

"É claro que enfraquece a Funai", reconhece Ismael. "Mas isso não significa que a população indígena ou as terras indígenas vão ser entregues ao agronegócio. Ainda é precoce tirar qualquer conclusão."

Reina também incerteza em torno da urgentemente necessária reforma da Previdência. De fato, Bolsonaro defendeu na primeira semana do ano a idade mínima de 57 anos para mulheres e 62 anos para homens. Mas possivelmente isso não passou de um balão de ensaio para o presidente testar as reações, supõe Nogueira.

Segundo Ismael, da PUC-RJ, Bolsonaro tem duas tarefas-chave a cumprir: aquecer logo a economia e assegurar o apoio do Congresso. "O discurso de posse do ministro da Economia, Paulo Guedes, foi muito bem recebido pelos mercados, a bolsa subiu e o dólar caiu", observa.

Ao mesmo tempo, o partido de Bolsonaro foi inteligente em confirmar apoio ao atual presidente da Câmara, Rodrigo Maia, na reeleição em fevereiro, evitando, assim, uma possível derrota de sua base parlamentar, diz o cientista político. "Nessas duas áreas, na economia e na política, as notícias foram positivas."

Na opinião do cientista político, é até mesmo do interesse de Bolsonaro que em outros setores dominem as polêmicas de grande efeito midiático. Como sabe ter a imprensa contra si, ele precisa seguir apostando no confronto ideológico nas redes sociais, a fim de aumentar a pressão sobre seus adversários políticos. "Ele tem de manter acesa essa mobilização, e para isso precisa dessas palavras de ordem que sua base social conhece."

Nogueira questiona se a atividade governamental normal será viável em tal clima de polarização. "A única coisa clara que o governo manifestou foi a sua confusão. A falta de um programa claro, a falta de coordenação dentro do governo. Quem vai coordenar, quem serão as vozes autorizadas, e quem vai funcionar como elemento de moderação?", diz. "Nem Bolsonaro consegue se comportar como presidente, deixando dúvidas sobre a linha que o governo vai seguir."

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