Oriente Médio
26 de abril de 2011Desde meados de março a população síria está indo às ruas exigir democracia e amplas reformas. Contudo, o chefe de Estado Bashar al-Assad esperou até o final de março para se dirigir a seu povo: "É um teste que pode se repetir a qualquer momento, devido a conspirações contra o nosso país", disse o presidente, em seu discurso de 30 de março.
Assad avaliou a onda de protestos como uma "conspiração". Ele não expressou nenhuma autocrítica, nem demonstrou qualquer desejo de reformas. Suas palavras não foram bem-aceitas pela população: pelo contrário, os protestos recrudesceram.
Neste meio-tempo, o presidente sírio revogou a lei de exceção, em vigor no país há quase 50 anos. Segundo a jornalista Kristin Helberg, que trabalha em Damasco e Berlim, a situação pouco mudou após a revogação. "Os manifestantes precisam agora uma autorização para protestar", mas o Ministério do Interior da Síria não lhes concede tal permissão, afirma. Isso significa que as manifestações continuam ilegais e que seus participantes podem ser tratados como criminosos.
Protestos continuam
O governo em Damasco continua afirmando tratar-se de um levante armado, que precisa ser reprimido, e responsabiliza forças estrangeiras pelos distúrbios: islâmicos, salafistas e até mesmos certos libaneses seriam culpados. As autoridades sírias jogam com o medo dos confrontos religiosos. Assim, os manifestantes de todo o país não se sentem que suas exigências de reformas e democracia estejam sendo escutadas.
Isto reforça o ódio e a frustração entre os oposicionistas, diz Kristin Helberg. "Com seus slogans e cartazes, as pessoas tentam sempre mostrar que querem a unidade do povo sírio, que são justamente contra uma divisão religiosa. Juntamente com todos os grupos religiosos, elas exigem mudanças e reformas." Por esse motivo a jornalista acredita que os protestos irão continuar.
O que começou como protesto na pequena cidade de Bania espalhou-se agora por todo o país. E isso, apesar do risco elevado, pois o presidente Bashar al-Assad empreende uma política de linha-dura contra os que clamam por reformas.
Desde que as forças de segurança passaram a atirar contra a população, os manifestantes também passaram a exigir a renúncia de Assad. Estes o responsabilizam agora pessoalmente pela brutalidade da repressão, declara Helberg.
Alauitas sírios
Bashar al-Assad queria, na realidade, ser oftalmologista. Parte de seus estudos foram realizados em Londres. Ao assumir o posto, 11 anos atrás, ele prometeu ao povo reformas que seu pai, Hafez al-Assad, proibira durante anos.
Desde o princípio Bashar quis mostrar-se popular: às vezes o casal presidencial aparecia na ópera em Damasco, às vezes num restaurante sírio. Ele modernizou um pouco o país, introduzindo a internet e a comunicação móvel. Mas as reformas prometidas não se concretizaram. Assad cedeu à pressão dos antigos quadros que apoiavam o governo de seu pai, constata o especialista em Síria Thomas Pierret, do Centro Moderno Oriente (ZMO), em Berlim.
A Síria é realmente um Estado laico, marcado há décadas pelo socialismo. O regime nunca seguiu abertamente uma política confessional. O poder está concentrado nas mãos dos alauitas sírios, uma minoria religiosa à qual pertence também a família Assad. O Exército e os serviços de inteligência estão unidos em torno do presidente. Muitos alauitas ocupam as posições-chave.
Bashar e Hafez são parecidos?
Assim, Bashar al-Assad não está sozinho no comando do país, diz Pierret. "Ele tem de levar em conta a opinião dos funcionários importantes das forças de segurança. Principalmente agora, depende deles para reprimir os protestos."
À primeira vista, Bashar era considerado um presidente de mente aberta. Mas também em seu regime os poderosos serviços de inteligência cuidam para que os críticos do presidente sejam silenciados à surdina, como acontecia no governo de seu pai.
Assim, Thomas Pierret vê várias semelhanças entre pai e filho. "Bashar só precisou de mais tempo para ampliar seu poder. Dentro de quatro ou cinco anos, ele conseguiu controlar o regime", disse. A única diferença em relação ao pai seria o seu jeito de ser. "Mas isso não importa mais agora."
Oposição desorganizada
O que pode ajudar Bashar al-Assad a permanecer no poder é o fato de na Síria não haver uma verdadeira oposição organizada. Isso, apesar de várias tentativas, nos últimos anos, para unir os grupos de oposição – como a Declaração de Damasco, lançada por esquerdistas, liberais e curdos. Mas a tentativa de reconciliação falhou, pois muitos oposicionistas estavam presos – e outros ainda estão. "Portanto, não há líderes verdadeiros", resume Kristin Helberg.
De acordo com uma reportagem do jornal Washington Post, os EUA vêm financiando há anos a oposição síria. Desde 2006, o Departamento de Estado norte-americano teria transferido cerca de 6 milhões de dólares para opositores de Assad. Essas informações foram publicadas pelo site de revelação Wikileaks.
No momento, Assad estaria monitorando a situação em outros países árabes, crê o especialista em Oriente Médio Michael Lüders. Por enquanto, ele aguarda os desdobramentos na Líbia. Se Muammar Kadafi se mantiver no poder, o presidente sírio vai então tentar ganhar tempo, ou seja, não haverá nenhuma mudança para seu povo.
"O chefe de Estado não irá renunciar por si só", assegura Helberg. Para a jornalista, Assad não é a fonte dos problemas, mas sim o poder do partido Baath e dos serviços de inteligência. Parece não haver uma alternativa de liderança, a médio prazo, a não ser Bashar al-Assad, o que é bom para o líder sírio. "Ele é visto como uma garantia de estabilidade. Nem os sírios, nem os países vizinhos, nem o Ocidente têm interesse de que a Síria resvale para o caos", afirma Helberg.
Reações internacionais
A comunidade internacional não tem uma posição coesa. Enquanto a Rússia, a China e a Turquia foram bastante reticentes na semana passada em suas críticas a Assad, o presidente norte-americano, Barack Obama, condenou duramente a brutalidade das forças de segurança sírias contra seu próprio povo.
Segundo a jornalista Kristin Helberg, no entanto, o Ocidente não exerceria grande influência sobre a política em Damasco. Pois a Síria não é economicamente dependente dos EUA ou da Europa. Nos últimos anos, o país se voltou para o Leste e encontrou importantes parceiros na Rússia, Irã, Sudeste Asiático e China. A União Europeia, porém, é o maior doador da ajuda ao desenvolvimento.
E os europeus não gostariam de abrir mão dessa ajuda, na forma de apoio ao setor educacional e da implementação de um sistema de saúde e água, ressalta Helberg. "Acho que a Alemanha e a UE deveriam tentar fazer pressão, por exemplo, condicionando uma cooperação mais estreita entre a Síria e a UE à observância dos direitos humanos."
Helberg acredita que iniciar agora um boicote ou introduzir sanções econômicas não iria atingir significativamente a Síria. Isso também significa, no entanto, que o Ocidente não é capaz de exercer pressão significativa sobre Damasco, para forçar o regime a concessões sérias.
Autora: Diana Hodali (ca)
Revisão: Augusto Valente