América Latina
21 de agosto de 2008DW-WORLD.DE: O caso mais recente de estatização na América Latina é o da filial da empresa mexicana Cemex na Venezuela pelo governo de Hugo Chávez. Segundo alguns governos da chamada "nova esquerda", trata-se de resgatar tais propriedades a fim de pô-las "a serviço do povo". Como você avalia essa interpretação?
Federico Foders: A motivação fundamental para uma política de estatizações não pode estar equivocada. Especialmente no campo dos recursos naturais, sobretudo do petróleo e da mineração, nos quais seguramente houve contratos com capitais estrangeiros que não trouxeram benefícios a estes países. Deste ponto de vista, é compreensível que haja um impulso nesse sentido.
No caso da Venezuela, havia [entre as estatizadas] firmas argentinas, mexicanas e brasileiras. De modo que tais políticas de estatização não só afetaram empresas dos Estados Unidos ou da Europa, mas também latino-americanas.
É preciso planejar as coisas de outra maneira. Qual seria o capital capaz de melhor servir ao povo? O governo que estatizou uma empresa está em condições de garantir este serviço? Como poderia fazê-lo melhor?
Muitas vezes, isso faz com que o capital privado não se sinta bem-vindo e abandone um país, podendo levar, a longo prazo, a uma fuga de capital – não só estrangeiro, mas também nacional. Creio que o capital privado possa ser muito útil justamente quando se trata de oferecer um serviço ao povo. Não há um país no mundo que esteja em condições de oferecer todos os serviços necessários.
É o que está acontecendo com a Venezuela?
A Venezuela não recebeu muito capital estrangeiro nos últimos anos. E isso não a prejudicou, pois trata-se de um país exportador de petróleo e vivemos um apogeu do preço de hidrocarbonetos desde 2002.
Mas não nos esqueçamos que o petróleo pode chegar a outra posição de mercado, na qual o preço não seja tão alto. Ou pode ser que sejam desenvolvidas tecnologias que entrem em concorrência com o petróleo e a demanda por ele não seja mais tão forte no futuro. Por isso, a Venezuela deveria repensar esse tipo de política. Creio que a política de nacionalização surgiu de uma conjuntura particular e o que falta é uma visão de longo prazo.
Estas nacionalizações seguem um modelo particular: primeiro se estatiza e quase imediatamente se convida as empresas a se associarem aos governos. Essa é uma nova tendência?
Há muitas razões para rever as políticas de investimentos estrangeiros em países latino-americanos. Parece-me muito legítimo revisar estes contratos e ver se as condições realmente são em favor do país. Creio que renegociar os contratos a fim de reduzir a participação do capital estrangeiro a uma cifra inferior a 50% seria um caminho viável. Mas viável apenas em determinados setores e certamente não em todos. Para uma empresa de média porte, talvez não fosse conveniente ter um sócio que tomasse todas as decisões.
A Venezuela, como sabemos, não é o berço das tecnologias de ponta. Há muitas áreas em que o país precisa continuar importando tecnologia. Nesse caso, não será possível limitar as empresas a uma participação de 25 ou 30%.
Mas, sem dúvida, há um componente puramente ideológico nesta série de estatizações...
Na história da América Latina, uma série de empresas se aproveitaram de certos governos para fechar contratos que não necessariamente trouxeram benefícios para o país. Então é muito legítima a tendência de renegociar. Isso não é uma ideologia, mas uma visão muito pragmática do que vem acontecendo nos últimos 20 anos.
Tampouco esqueçamos que estes países têm governos de esquerda só há poucos anos. Governos de esquerda eleitos pelo povo através de processos democráticos. Eles tiveram governos de direita durante décadas e agora chegaram à conclusão de que querem algo diferente. O que esses governos de esquerda estão oferecendo em muitos aspectos é isso: uma solução distinta.