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Estaria "cão de guarda" de Putin preparando um sucessor?

Aleksei Strelnikov
1 de dezembro de 2023

Filho de Ramzan Kadyrov de 16 anos foi nomeado chefe da segurança do presidente da Chechênia e recebeu cargo nas Forças Armadas russas. Adolescente virou notícias após vídeo espancando preso.

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Adam Kadyrov durante luta de boxe
Com apenas 16 anos, Adam Kadyrov foi nomeado chefe do departamento de segurança do presidente chechenoFoto: Yelena Afonina/TASS/picture alliance/dpa

Em apenas um mês e meio, Adam Kadyrov, de apenas 16 anos, recebeu mais honrarias do que a grande maioria das pessoas recebe em uma vida inteira: "Herói da República Chechena", "Ordem Honra da Pátria", "Ordem de Primeiro Grau por Serviços à Religião do Islã". Ele também foi agraciado com prêmios das repúblicas islâmicas vizinhas da Chechênia.

Filho de Ramzan Kadyrov, líder da República da Chechênia e coronel-general das Forças Armadas russas, o adolescente foi nomeado ainda chefe do departamento de segurança do presidente checheno, ou seja, seu próprio pai, e também observador em um novo batalhão que faz parte das forças de defesa da Rússia, que teria sido criado no início de novembro.

"Essa nomeação foi um resultado natural dos serviços significativos prestados por Adam na defesa dos valores religiosos, familiares e culturais de nosso povo", declarou Adam Delimkhanov, que chefia a divisão chechena da guarda nacional russa e também é membro do parlamento russo.

Adam Kadyrov passou a se destacar depois que um vídeo que surgiu na internet e virou manchete na Rússia. Ele mostra o filho de Kadyrov espancando um prisioneiro em um centro de detenção provisória na capital chechena, Grozni.

O prisioneiro em questão é Nikita Schurawel, que está sendo processado pelas autoridades chechenas por ter queimado um Alcorão. Schurawel, de 19 anos, foi preso pela polícia em sua cidade natal, Volgogrado, e depois entregue às autoridades chechenas.

Lealdade a Putin

Líder da Chechênia desde 2007, Ramzan Kadyrov é considerado um dos aliados mais próximos do presidente russo, Vladimir Putin. Ele enviou milhares de seus combatentes para a Ucrânia desde o início da invasão russa, em fevereiro de 2022.

Seu pai, Akhmat Kadyrov, foi nomeado chefe da então república separatista por Putin em 2000, depois de ter apoiado as forças armadas russas nas duas guerras da Chechênia na década de 1990.

Os maus-tratos a Schurawel e a publicação do vídeo fazem parte da estratégia de apresentar um sucessor, avalia Nikolay Petrov, pesquisador convidado do Instituto Alemão para Assuntos Internacionais e de Segurança (SWP). O especialista ressalta que o vídeo foi publicado em 25 de setembro, um dia antes de Ramzan Kadyrov ser recebido por Putin.

"Parece que Kadyrov está preparando um sucessor e o apresentando antes a Putin, sobre o qual ele recebe ainda sinais de reconhecimento de Adam como o herdeiro das repúblicas islâmicas vizinhas", diz Petrov. O especialista não descarta a possibilidade de que Ramzan Kadyrov queira testar até onde pode ir em relação a Moscou e agir de forma independente.

Ramzan Kadyrov discursa ao lado de homens armados na Chechênia
Desde 2007, Ramzan Kadyrov comanda a Chechênia Foto: Yelena Afonina/TASS/dpa/picture alliance

Devido à sua pouca idade, Adam Kadyrov não é o sucessor ideal, segundo Grigorij Schvedov, editor-chefe do Kawkasskij Usel, site que publica notícias independentes do Cáucaso e que foi colocado na "lista de agentes estrangeiros" pelas autoridades russas em 2021. "Muita coisa pode mudar em dois ou três anos", diz o jornalista.

Na opinião de Schvedov, a abundância de prêmios e a atenção excessiva dada a Adam Kadyrov – que contraria a tradição chechena de não elogiar os próprios filhos – são mais uma evidência de um trauma psicológico sofrido por Ramzan Kadyrov. O jornalista acredita que o atual líder da Chechênia desejaria compensar dessa forma o que não recebeu de seu próprio pai, que foi morto em um ataque a bomba em 2004. Shvedov supõe que os filhos de Ramzan Kadyrov receberão outras honrarias, mas é improvável que eles tenham um grande significado político.

O especialista enfatiza, porém, que a concessão em massa de medalhas pelas repúblicas vizinhas da Rússia no Cáucaso e pelo Tartaristão é incomum. "Não é o Kremlin que está agindo aqui, mas a ‘diplomacia’ de Kadyrov. Esse é um sinal muito importante de que ele ultrapassou as fronteiras da Chechênia", diz Shvedov.

"Embora isso não seja novidade, mostra que Kadyrov pode se evidenciar através desse tipo de abuso sensacionalista e, com isso, coletar ainda honrarias para seu filho", acrescenta o jornalista.

Kadyrov prepara um sucessor?

A primeira vez que se falou sobre Adam Kadyrov foi quando ele tinha nove anos e participou de um torneio de artes marciais mistas em Grozni, de acordo com Ibragim Yangulbayev, filho do ex-juiz da Suprema Corte da Chechênia Sajdi Yangulbayev. Naquela época, ele foi declarado vencedor de uma luta embora "o oposto fosse óbvio".

Yangulbayev pontua ainda que as regras desse esporte também não permitem lutas entre crianças de oito a dez anos de idade. Adam ganha essas vitórias e uma respectiva atenção com mais frequência do que os outros filhos de Kadyrov, acrescenta Yangulbayev.

"Os sucessores são preparados com antecedência e passo a passo. Basta dar uma olhada nos perfis de Kadyrov nas redes sociais, onde Adam é tratado de maneira particular". De acordo com Yangulbayev, uma foto do filho de Ramzan Kadyrov está pendurada na parede da sede de uma das maiores empresas de construção do país em Grozni, que ele acredita ser totalmente controlada pela família Kadyrov. "Mesmo na Chechênia, é difícil imaginar um empresário pendurando uma foto do filho de outra pessoa na parede", diz. Ele acredita que tudo isso são "atributos de um legado para o futuro sucessor".

Independentemente de qual de seus filhos Kadyrov está preparando como seu sucessor, seu plano tem poucas chances de sucesso, segundo Petrov. "Tudo depende de quem está sentado no Kremlin. Um adolescente de 16 anos que agora tem um pai vivo, implacável e forte é facilmente percebido como o príncipe herdeiro. Mas é difícil imaginar que ele terá vontade e força suficientes, bem como seus próprios recursos, para manter o poder", diz o especialista.