Há quatro anos, Jair Bolsonaro venceu principalmente porque desde o início investiu tudo nas redes digitais. Sua família recrutou os inúmeros novos grupos de direita que surgiam em todo o país nas redes sociais como seus "soldados digitais". O Whatsapp, em particular, foi central nessa estratégia.
Por essa via, os Bolsonaros forneciam muitas informações para seus ativistas, mas também inúmeras mensagens curtas difamatórias ou manipuladas, ou seja: fake news. Assim ficou conhecida, por exemplo, a mamadeira em forma de pênis que os esquerdistas supostamente queriam distribuir nos jardins de infância se ganhassem as eleições.
Como se soube mais tarde, empresários bolsonaristas patrocinaram campanhas ilegais para inundar grupos de usuários do Whatsapp com notícias falsas sobre o oponente político.
No entanto é um equívoco atribuir a vitória eleitoral de Bolsonaro exclusivamente ao uso ilegal de robôs, escreve a jornalista Consuelo Dieguez em seu livro recém-publicado O ovo da serpente. Desde o início, os Bolsonaros podiam contar com centenas de milhares de ativistas digitais que espalhavam voluntariamente as "notícias" do quartel-general de campanha.
E agora é a mesma coisa: inúmeras plataformas de informação na internet se disfarçam de mídia jornalística, as mais conhecidas chegam a ter dezenas de milhões de cliques mensais. Elas são apenas a ponta do iceberg, como suspeita o centro de pesquisas NetLab da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), mas reproduzem tudo o que ajude a campanha de Bolsonaro, desde fake news até estatísticas maquiadas.
Chama a atenção como há três meses essas meias verdades também são espalhadas em plataformas sociais mais conservadoras, como o Linkedin – e sem a menor reação de seus responsáveis.
Faltam ferramentas
O mesmo se aplica ao uso de robôs para alimentar as redes digitais de forma direcionada, dependendo do sexo, idade, preferência política. Denise Dora, da organização não governamental Artigo 19, diz que, apesar da Comissão Parlamentar de Inquérito das Fake News, ainda não há ferramentas para evitar que a desinformação circule em grande escala.
É verdade que desta vez as plataformas sociais e os canais de comunicação estão trabalhando mais sintonizados com a Justiça eleitoral do que em 2018. Quando o Supremo Tribunal Eleitoral exige que fake news sejam removidas, isso costuma acontecer rapidamente. Mas as próprias plataformas não são muito ativas no combate às notícias falsas.
Quando questionadas por Patricia Campos Mello, especialista digital da Folha de S. Paulo, quantos funcionários de língua portuguesa as plataformas tinham em suas equipes de monitoramento, as empresas deram apenas respostas evasivas.
A denunciante do Facebook Frances Haugen explicou há pouco nos EUA que as plataformas sociais se concentram principalmente nos conteúdos em inglês. Elas só se preocupam em mediá-los em países onde correm o risco de ser regulamentadas, como, por exemplo, nos Estados Unidos. Isso não acontece no Brasil.
Assim, parece que as mídias sociais são um campo basicamente livre, onde os estrategistas das campanhas eleitorais podem agir sem restrições.
_________________________
Há mais de 25 anos, o jornalista Alexander Busch é correspondente de América do Sul do grupo editorial Handelsblatt (que publica o semanário Wirtschaftswoche e o diário Handelsblatt) e do jornal Neue Zürcher Zeitung. Nascido em 1963, cresceu na Venezuela e estudou economia e política em Colônia e em Buenos Aires. Busch vive e trabalha em São Paulo e Salvador. É autor de vários livros sobre o Brasil.
O texto reflete a opinião do autor, não necessariamente a da DW.