'Chegaremos a Marte'
20 de julho de 2009Em 20 de julho de 1969, o primeiro ser humano pisou na Lua graças ao projeto Apollo. O engenheiro alemão Jesco von Puttkamer foi um dos membros da equipe liderada por Wernher von Braun que, na sede da Nasa em Huntsville, Alabama, desenvolveu o programa.
Nascido em Leipzig em 1933, Von Puttkamer imigrou para os Estados Unidos 30 anos depois. Com o final das missões lunares, ele passou a trabalhar na Nasa como engenheiro e planejador de projetos como as missões Skylab e o ônibus espacial.
Desde 1974, trabalha no escritório central da entidade, em Washington, onde lidera um grupo encarregado do planejamento estratégico da permanente exploração do espaço.
Ele também fez parte do programa de longo prazo de viagens tripuladas à Lua e a Marte, anunciado durante a administração de George W. Bush. Quatro décadas depois da primeira aterrissagem na Lua, Von Puttkamer foi entrevistado por Christina Bergmann, da Deutsche Welle.
Deutsche Welle: Em que cenário se encontram as missões tripuladas nos Estados Unidos 40 anos após a primeira aterrissagem na Lua?
Puttkamer: Já voamos 127 vezes com o ônibus espacial, e a maioria dos voos foi diferente. Enquanto num avião normal é feita uma manutenção apenas entre uma decolagem e outra, em cada viagem com o ônibus espacial eram feitas novas exigências, novos desafios, fazendo com que a operação da nave se tornasse muito mais cara do que o previsto.
Mesmo assim, precisávamos do ônibus para criar uma plataforma fixa no espaço. Assim, surgiu a estação espacial internacional e assim conseguimos, nos últimos anos, construir uma sólida plataforma de saída, a partir da qual poderemos avançar em melhores condições.
Esta é justamente a nova fase, que está diante de nós. Estamos negociando com o presidente Obama com que rapidez poderemos prosseguir e se isso poderá ser expandido. Claro que precisamos nos ajustar às limitações financeiras, mas as metas continuam sendo aquelas traçadas por Bush: Lua em 2014 e, depois, Marte.
A atual situação econômica internacional dificulta o financiamento de todos esses projetos. A NASA também precisa sempre rever suas prioridades. Que peso tem a crise financeira nessas avaliações e quais são as prioridades?
Não dá para mais para voltar atrás. Os Estados Unidos estão muito envolvidos com as viagens espaciais, que já se tornaram parte da psique americana - tanto quanto o Mickey Mouse e a Coca-Cola. O que o ônibus espacial não pode é sair da órbita terrestre. Com ele, não podemos, portanto, voar até a Lua. Por isso precisamos de novos foguetes impulsores, como os Saturno de Wernher von Braun. Mas tanto o ônibus espacial quanto os foguetes são caros.
Como típicos americanos, somos otimistas e nos concentramos nos programas otimistas de longo prazo, apagando o passado e o presente para praticamente recomeçarmos do zero. Isso jamais aconteceria na Rússia. Lá, até hoje são usados os foguetes Soyuz, o mesmo tipo com que Korolev voou em 1958 – agora apenas um pouco evoluídos. Enquanto isso, nós já transformamos nossos foguetes Saturno em sucata e construímos novos ônibus espaciais.
O que aconteceu com a ideia de se trabalhar em conjunto com os europeus? Eles estão avançando de forma unida?
A Agência Espacial Européia (ESA) se esforça ao máximo para unir alemães, italianos, ingleses e demais europeus, mas até hoje não conseguiu fazê-lo. A princípio, a Nasa também depositava esperança na Europa. Acreditávamos poder construir uma parceria sólida e voar para a Lua ou desenvolver uma base lunar em conjunto.
Mas quando os procuramos e dissemos: "Nosso ônibus espacial vai parar de voar e o presidente Bush quer que produzamos um novo sistema de transporte para irmos à Lua. Vocês querem participar?", eles nos chamaram de loucos e responderam: "Temos de perguntar primeiro a todos os nossos governos. Isso demora, pois tudo tem de ser ratificado por eles. Voltem em um ou dois anos."
Não podemos esperar tanto tempo. Portanto, bancamos sozinhos o início do desenvolvimento de um sistema de transporte que possa nos levar novamente à Lua. Depois disso, voltamos e lhes dissemos: "Mais tarde, vamos precisar de uma infraestrutura com habitats e sabe-se lá o quê mais na superfície lunar. Vocês podem, então, fazer parte dessa etapa." A ESA se mostrou interessada e disse que espera, até lá, convencer os políticos europeus a participar.
Em 2015, o homem voará novamente para a Lua. E depois?
Não acredito que os planos de criação de uma base fixa de longo prazo na Lua serão realizados como foram planejados durante o governo Bush. Nem o público nem nossos congressistas têm muito interesse num grande programa voltado à Lua. O pensamento do cidadão médio nos EUA é: "Já fomos até lá. Para quê voltar?"
Precisamos da Lua como estação intermediária para o desenvolvimento de inovações tecnológicas, aumentando assim a autoconfiança dos engenheiros ao verem que são capazes de construir algo desse tipo.
Além do mais, não poderíamos pensar em voar agora até Marte porque o tempo de preparação necessário é muito longo. Em pouco tempo, tanto os contribuintes quanto a mídia logo nos diriam: "Com vocês não está acontecendo mais nada".
Também por isso a Lua tem sua importância. Devemos, portanto, voltar até lá, mas apenas para construir uma estação temporária, a qual também não deve permanecer ocupada todo o tempo. Abastecer uma estação dessas fora da Terra é muito caro. Por isso, seguiremos o modelo Apollo de aterrissagem, porém com permanências cada vez mais longas. Queremos aproveitar esse tempo para adquirir novos conhecimentos para a viagem a Marte, que é nosso principal objetivo.
Por que seres humanos deveriam morar em Marte?
Eles não deveriam, eles irão. As pessoas de hoje não são capazes de vislumbrar isso porque, para tal, requer-se não apenas maturidade tecnológica, mas também mental. Já existem entre nós pessoas que voarão até Marte sem perguntar "não é muito perigoso?" ou "não é muito caro?" Elas são ainda crianças, mas crescem num mundo que lhes faz uma nova "lavagem cerebral" com relação a Marte, principalmente nos Estados Unidos.
Há fotos do Planeta Vermelho por todos os lados e muitas escolas já estão voltadas à pesquisa aeroespacial e ao planeta. Dessa forma, deverá surgir uma geração que, de tanto ouvir falar em Marte, um dia irá dizer: "Já falamos muito sobre isso. Quando iremos finalmente para lá?"
Autor: Christina Bergmann
Revisão: Alexandre Schossler