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Encenação de "Idomeneu" é cancelada por medo de ataques islâmicos

(ina/gh)27 de setembro de 2006

Diretora da Deutsche Oper em Berlim cancela apresentação da obra de Mozart por medo de que artistas e público fossem atacados por radicais islâmicos. Críticos falam de "capitulação diante de terroristas".

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'Idomeneu' já causou polêmica em 2003 em BerlimFoto: picture-alliance/ ZB

A diretora da Deutsche Oper (Ópera Alemã) em Berlim, Kirstin Harms, defendeu nesta terça-feira (26/09) sua decisão de cancelar a encenação de Idomeneu, de Wolfgang Amadeus Mozart, prevista para novembro próximo.

Harms disse que, em agosto, recebeu uma informação anônima através do secretário de Segurança Pública da capital alemã, Ehrhart Körting, segundo a qual haveria um "risco com final imprevisível para os funcionários e o público", caso a ópera fosse encenada. Na condição de única responsável pela programação, ela teria se decidido "pela defesa da vida dos funcionários".

Idomeneo, Re di Creta (Idomeneu, rei de Creta) é a primeira das últimas sete óperas de Mozart e tem um conteúdo antigo. Após retornar para casa da guerra contra Tróia, Idomeneu é obrigado a sacrificar seu filho, o que no barroco e no tempo de Mozart garantia um "final feliz" à peça musical. Até cerca de 1800, época de Mozart, a política ou religião desempenhavam, no máximo, um papel secundário na ópera.

A produção dirigida por Hans Neuenfels, prevista para a Deutsche Oper, faz um retrato drástico das grandes religiões mundiais, entre elas, também o islã. Na cena final, Neuenfels mostra o rei Idomeneu cambaleando sobre o palco, ao lado das cabeças decepadas de Buda, Jesus, Netuno (ou Poseidon) e Maomé, colocadas sobre cadeiras.

Não houve ameaça concreta

De acordo com o Departamento Estadual de Investigações Criminais de Berlim, não houve uma ameaça concreta. Mesmo assim, o chefe da polícia de Berlim, Dieter Glietsch, disse compreender a decisão da diretora da Deutsche Oper e lembrou o conflito gerado pelas charges de Maomé.

O diretor Hans Neuenfels classificou a decisão de Harms como "histeria e submissão antecipada". Ele disse à rádio NDR que , até agora, não houve qualquer ameaça concreta ou crítica de organizações islâmicas à encenação. Neuenfels destacou que, com seu trabalho, não pretende criticar o islã e, sim, mostrar a visão individual de Idomeneu sobre "todo tipo de instituição religiosa".

Die Intendantin der Deutschen Oper Berlin Kirsten Harms
Harms: 'histeria e submissão antecipada'Foto: picture-alliance/ ZB

Duras críticas

O cancelamento da peça causou indignação no meio político em Berlim. "Isso é inaceitável", disse o ministro do Interior, Wolfgang Schäuble, que disse tratar-se de uma decisão "louca". O perito em cultura da bancada da CDU/CSU no Bundestag, Wolfgang Börnsen, advertiu contra uma "capitulação diante de terroristas".

"Se a preocupação com possíveis protestos leva à autocensura, então a cultura democrática da livre expressão corre perigo", disse o ministro da Cultura e Mídia, Bernd Neumann.

O presidente do Conselho Islâmico na Alemanha, Ali Kizilkaya, saudou a decisão do cancelamento, sob o argumento de que "a encenação fere os sentimentos dos muçulmanos. Apesar disso, é terrível que seja preciso ter medo", disse.

Novo conflito das charges?

Jahresrückblick September 2006 Deutsche Oper setzt Mozart-Oper Idomeneo ab
Cena final mostra cabeças decapitadas dos profetas das grandes religiõesFoto: picture-alliance/ dpa

Já o presidente da comunidade turca na Alemanha, Kenan Kolat, disse compreender que uma cabeça decapitada do profeta possa ferir o sentimento de piedosos muçulmanos. "Mas eu recomendo a todos os muçulmanos que aceitem determinadas coisas. Trata-se de arte e não de uma declaração de um político. A arte deve ser livre", acrescentou.

Kolat não descartou, porém, que o atual caso pudesse ter conseqüências semelhantes às do conflito desencadeado pela publicação das charges de Maomé. "Se a ópera fosse apresentada, isso poderia acontecer. Mas não se deve ceder a esta pressão", defendeu.