Economistas elogiam pacote de Guedes, mas preveem entraves
7 de novembro de 2019Diminuir o tamanho do Estado e equilibrar as contas públicas. Assim podem ser resumidos os principais objetivos do chamado Plano Mais Brasil, pacote entregue nesta semana pelo presidente Jair Bolsonaro e pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, ao presidente do Senado e do Congresso, Davi Alcolumbre (DEM-AP).
Economistas ouvidos pela DW Brasil veem o pacote – composto por três propostas de emenda à Constituição (PECs) – como ousado, e, ao mesmo tempo, destacam que a aprovação das medidas pelo Congresso será um desafio.
As três PECs que compõem o pacote são: a do Pacto Federativo (a ideia é repassar mais recursos e dar mais autonomia a estados e municípios); a de Emergência Fiscal (para controlar as despesas públicas); e a dos Fundos Públicos (que pretende extinguir grande parte dos fundos públicos e permite o uso desses recursos na amortização da dívida pública).
O pacote visa abrir caminho para o plano defendido por Guedes de "mais Brasil, menos Brasília". O slogan, que já foi usado durante a campanha eleitoral de 2018, significa reduzir o poder de decisão do governo federal quanto ao uso de recursos e dar mais autonomia a estados e municípios.
Para ser aprovado, o pacote deve passar por dois turnos de votação no Senado, onde deve receber o aval de ao menos 49 dos 81 senadores, e mais dois na Câmara, onde precisa do apoio de ao menos 308 dos 513 deputados.
Para o economista Marcelo Portugal, professor na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), o pacote está na direção correta, uma vez que o principal problema do Brasil, hoje, para ele, é fiscal.
"Desde 2014, temos déficits primários contínuos [quando as despesas superam as receitas]. Quando terminou o governo Lula [2010], a dívida pública era de cerca de 51% do PIB. Ao fim do governo Dilma [2016], era de 72%. Hoje, é de quase 80%. Isso é insustentável no longo prazo", diz Portugal, graduado em Economia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e doutor na área pela Universidade de Warwick, no Reino Unido.
O grande problema do governo, no entanto, é aprovar as propostas: "A agenda está correta, mas há incompetência na parte política. Até agora, [o governo] tem dado sorte", diz, referindo-se à aprovação da Reforma da Previdência.
Mercado empolgado, mas cauteloso
Economista-chefe da Necton e mestre em Economia Política pela PUC-SP, André Perfeito encara o pacote econômico do governo, de cunho "ortodoxamente liberal", como "gigantesco e revolucionário", mas chama a atenção para a tendência de demora para uma possível aprovação das PECs.
"O mercado até vê com muito interesse esse pacote, essas reformas, mas também com cautela. Ninguém está esperando que esse negócio caia do céu, que seja [colocado em prática] muito rapidamente. A reforma da Previdência, por exemplo, era para ter sido aprovada no Carnaval e acabou sendo aprovada [quase] no Halloween", afirma.
Perfeito acredita que a aprovação das PECs depende muito da participação do presidente da República. "Bolsonaro está numa situação bastante difícil. Ele está brigando com o próprio partido. A gente nem sabe se ele tem partido político ou não. Tem ocorrido muitos 'choques'", diz.
O que pode auxiliar no processo de aprovação das medidas, segundo o economista, é uma possível "sabedoria política" do ministro Paulo Guedes: "Ao descentralizar alguns recursos, por meio do projeto 'mais Brasil, menos Brasília', ele tenta cooptar os governadores de estados e municípios", diz.
"Ao mesmo tempo, quando ele propõe congelar o salário mínimo, isso pode agravar uma crise, porque vai diminuir a demanda quando precisa-se de demanda", avalia. Uma das medidas propostas no pacote de Guedes é que o salário mínimo fique congelado, sem reajuste acima da inflação, por dois anos em caso de grave crise nas contas públicas.
É preciso negociar
Na visão do economista Denilson Alencastro, o pacote é o diagnóstico de que o principal problema da economia brasileira são as contas públicas, e que o país deve continuar o ajuste fiscal. A intenção do governo, neste caso, é clara: menos Estado, mais mercado.
"A ideia é que o privado prevaleça sobre o público, bem diferente das políticas tanto dos governos militares quanto dos governos do período democrático. O ajuste [fiscal] não pode ser temporário, e sim manter uma linha do teto dos gastos e da reforma da Previdência. É fazer com que o governo consiga uma melhor gestão das contas públicas", exemplifica Alencastro, que é doutorando em Economia e pesquisador do Núcleo de Análise de Pesquisas Econômicas (NAPE), na UFRGS, além de economista-chefe da Geral Asset e professor do IPA, em Porto Alegre.
Para o especialista, fica claro que o que o governo precisa fazer para aprovar as medidas é negociar: "Sempre haverá pessoas insatisfeitas quando se mexe com o bolso. Grupos de funcionários que estão há tempos no governo e têm grandes gratificações, ainda que dentro de uma regra, mas que comprometem as contas públicas, vão lutar para que se mantenha o que temos hoje. O governo está disposto a brigar. Mas apenas brigar não adianta. Se brigar, não tem apoio, e a Câmara não anda", diz.
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