Documenta aos 50: a arte onde o povo está
6 de maio de 2005Criada em 1955 por Arnold Bode, a Documenta – exposição de arte moderna que reúne todos os tipos de manifestações culturais (de pinturas a vídeos experimentais, de teatro conceitual a esculturas, de instalações a filmes mudos) – chega aos 50 anos em grande estilo. E a cidade alemã de Kassel, onde o evento é realizado a cada cinco anos, está preparada para uma festa que vai durar o ano todo.
As comemorações, aliás, já começaram. Como se trata do maior evento de arte moderna do mundo – em 2002, mais recente edição da Documenta, foram 600 mil visitantes em três meses e aproximadamente 12 milhões de euros investidos na seleção, transporte e preparação das obras participantes –, o cinqüentenário da mostra motivou a organização de uma grande retrospectiva.
Entre março e abril, 11 cidades alemãs – entre elas, Berlim, Munique, Bonn, Frankfurt e, naturalmente, Kassel – receberam o Documenta Móvel. Em 52 dias, uma exposição interativa montada sobre um caminhão Mercedes Benz (com 17 metros de comprimento e 18 toneladas de peso) percorreu mais de três mil quilômetros na Alemanha para divulgar a Documenta ao cidadão comum. O investimento de 300 mil euros no Documenta Móvel serviu para ressaltar um dos principais objetivos do evento: permitir a apreciação de obras conceituais pelo grande público.
Cinco décadas em perspectiva
Entretanto, o melhor ainda está por vir. A exposição Documenta 50 Anos, que será aberta em 1º de setembro, estendendo-se por 11 semanas, será uma grande retrospectiva, que trará de volta parte dos mais inovadores trabalhos apresentados em Kassel durante as últimas cinco décadas. Orçada em 1 milhão de euros, a exposição também servirá para “esquentar os tamborins” da Documenta 12, a ser realizada em 2007.
O orçamento, de acordo com o pesquisador da Documenta, Christoph Lange, será usado para o restauro, catalogação, pagamento de seguros e de direitos autorais das obras selecionadas para a retrospectiva. No caso dos trabalhos audiovisuais, que incluirão filmes europeus dos anos 20 e uma série de vídeos experimentais produzidos ao redor do mundo, será necessário investir também na tradução e dublagem, pois a idéia é reunir obras produzidas em várias partes do mundo.
A exemplo do que ocorre a cada cinco anos desde 1955, a Documenta 50 Anos ocupará o Museu Fridericianum, bem no centro de Kassel. A mostra será dividida em diferentes setores. O visitante naturalmente poderá conhecer mais sobre a trajetória do evento – retratada em fotos e textos –, mas o principal destaque será o retorno de diversas obras e trabalhos apresentados nas 11 edições da Documenta.
Participação brasileira (e feminina)
A retrospectiva terá uma ala chamada “Discreta Energia”, dedicada a importantes obras do século 20. É nesse setor que o Brasil estará representado, por meio da artista mineira Lygia Clark (1920–1988), que foi “descoberta” na décima edição da Documenta, em 1997. Entretanto, de acordo com o pesquisador da Documenta, o principal período criativo da pintora e escultora – iniciada no mundo das artes por Burle Marx (1909–1994) – foram os anos 50 e 60, quando ela produziu Casulos, Os Bichos, Trepantes, Obra-Mole e Caminhando.
O setor de artes visuais incluirá a exibição de filmes clássicos como O Cão Andaluz (França, 1929), de Luís Buñuel e Salvador Dalí; e A Paixão de Joana D’Arc (França, 1928), de Carl Theodor Dreyer; e O Gabinete do Dr. Caligari (Alemanha, 1920), do mestre do expressionismo alemão Robert Wiene. Além disso, está prevista uma variada programação de curtas-metragens, feitos em película e em vídeo, e produzidos ao redor do mundo. A mostra audiovisual será exibida em duas salas de cinema de Kassel.
A exposição sobre os 50 anos da Documenta mostrará trabalhos artísticos que fizeram parte das 11 edições do evento e acabaram por se tornar parte da paisagem urbana de Kassel. Diariamente, moradores e visitantes da cidade podem “vivenciar” obras como Homem Andando em Direção ao Céu (Documenta 9, em frente à estação ferroviária central); Os Estrangeiros (Documenta 9, sobre o Museu Fridericianum); e Rahmenbau (Documenta 6, uma espécie de porta-retrato gigante para o principal parque da cidade, a Orangerie).
Arte que se mescla à arquitetura
“Queremos mostrar a herança que a Documenta deixou, as memórias que ficaram para esse jubileu”, afirma o pesquisador Christoph Lange, lembrando que a arquitetura é, muitas vezes, parte integrante dos trabalhos exibidos nos 50 anos do evento. Para conhecer os pontos onde a arte moderna se funde com a paisagem urbana da cidade, a organização do evento preparou uma brochura explicativa sobre as obras que inclui um mapa de Kassel, a ser vendida por 2 euros (pouco menos de 7 reais). Além disso, está prevista também a publicação de um catálogo de 650 páginas chamado Documenta 50 Anos, por 40 euros (cerca de 140 reais).
Quem quiser saber mais sobre a Documenta, pode aproveitar a passagem por Kassel para visitar o arquivo da exposição, aberto de terça a sexta-feira. Trata-se da maior biblioteca de arte moderna da Alemanha, com uma extensa coleção de livros, catálogos, revistas e informações eletrônicas sobre o que passou pelo “palco” da Documenta em 50 anos. Além disso, o Arquivo da Documenta também tem um extenso material visual: são mais de três mil vídeos, sete mil fotografias e 25 mil slides de obras produzidas em todo o mundo.