Do luxo ao narcotráfico: a decadência de Acapulco
17 de abril de 2016O porto de Acapulco, no estado de Guerrero, foi a joia turística do Pacífico mexicano nas décadas douradas de 1960 e 1970, quando era destino favorito das estrelas de Hollywood. Mesmo para quem nunca teve a chance de visitá-lo, em 1978 o seriado Chaves colocou o balneário no imaginário de muitos, com o episódio "Vamos a Acapulco".
Hoje, em contrapartida, ela é disputada pelos cartéis do narcotráfico – apesar das patrulhas militares e reforços policiais que povoam seu centro. "O estado de Guerrero está fora de controle", sentencia Raúl Benitez Manaut, pesquisador da Universidade Nacional Autônoma do México (Unam).
Segundo o especialista em questões de segurança, a principal causa desse declínio é o pico da demanda de heroína dos Estados Unidos, que nos últimos anos vem disparando. "É a droga mais consumida, substituiu a cocaína, e o maior volume de heroína que chega aos EUA provém de Guerrero."
Benítez Manaut observa que o governo pretende intervir militarmente, numa operação semelhante à realizada em Michoacán, mas a empreitada é extremamente custosa e árdua. "Guerrero é muito difícil, a orografia é muito diferente da de Michoacán. Além disso, tem uma grande pobreza e uma violência endêmica", descreve, acrescentando que hoje Acapulco é a cidade mais violenta do México, como era Ciudad Juárez, no estado de Chihuaha, em 2008.
Hotéis vazios e ameaça de boicote
A mídia local assinala que no primeiro trimestre de 2016 foram executadas 527 pessoas no estado de Guerrero, 51% a mais do que em 2015. Só em março, foram 98 assassinatos em Acapulco. O governador de Guerrero, Héctor Astudillo, apelou aos cidadãos e aos veículos de imprensa para não falarem mal da cidade, a fim de não afugentar ainda mais o turismo.
Carlos Flores, acadêmico do Centro de Investigações e Estudos Superiores em Antropologia Social (Ciesas), registra hotéis vazios, com o turismo internacional evitando o balneário, por temer a violência crescente.
"Chama a atenção a forte presença de policiais federais, da Marinha, da gendarmeria, com armas de grande calibre, ao longo da litorânea Miguel Alemán, a principal avenida do porto. Mas nas zonas urbanas é onde a situação é grave."
O especialista explica que, enquanto os grandes cartéis disputam o negócio da droga, os grupos menores extorquem e sequestram cidadãos, comerciantes e proprietários de bares e discotecas.
"O que se esperaria num contexto de Estado de direito, é que as instituições defendessem a cidadania. Mas essa espiral não tem fim, pois há um velho vínculo dos atores da política e forças de segurança com a delinquência organizada. Enquanto esse contubérnio não for sanado, não se vai deter a violência", assegura Flores.
Há um mês a Associação de Comerciantes da Litorânea pediu ao governo mexicano que os exima de impostos, para eles poderem pagar a "quota de proteção" ao crime organizado. A líder dos comerciantes ameaça com um boicote do sítio turístico se não houver uma reação das autoridades para frear os delinquentes. Cerca de 200 negócios já foram fechados devido à violência reinante.