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Discurso de ódio sexista explode na campanha alemã

Kate Brady
10 de maio de 2021

Na disputa para suceder Merkel, grande parte da atenção está voltada para Annalena Baerbock, candidata do Partido Verde. Sua entrada na disputa fez dispararem ataques e mentiras misóginas nas redes.

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Annalena Baerbock | Bundesvorsitzende Bündnis 90/Die Grünen
Foto: Markus Schreiber/REUTERS

Foram necessárias apenas algumas horas após a indicação de Annalena Baerbock como candidata a chanceler federal da Alemanha pelo Partido Verde, em 19 de abril, para que a desinformação e o ódio em torno do nome dela começassem a se espalhar na internet.

Michael Kellner, líder da campanha eleitoral do Partido Verde, diz que o discurso de ódio e as notícias falsas ganharam uma "dimensão completamente nova".

Especialistas advertem que a onda de ódio e desinformação que se espalhou em torno de Baerbock é apenas a ponta do iceberg antes das eleições gerais de setembro, que definirão o sucessor ou sucessora de Angela Merkel.

"Não foi o aumento do conteúdo falso e de ódio que nos surpreendeu. Foi a velocidade em si", diz Josephine Ballon, chefe do departamento jurídico da HateAid, o único centro de aconselhamento da Alemanha que apoia exclusivamente pessoas afetadas pela violência digital. "O que está se desdobrando é o ódio específico de gênero", comentou ela à DW. "Este tipo de ódio procura desacreditar e silenciar o alvo".

Ódio misógino

O ódio misógino online não é novidade. Um estudo da revista alemã Der Spiegel, divulgado em fevereiro, constatou que 69% das deputadas na Alemanha haviam experimentado "ódio misógino” na condição de parlamentares.

Enquanto 64% disseram ter recebido mensagens - a maioria online, mas também por correio - cerca de 36% experimentaram "ataques físicos contras elas, seus escritórios ou suas casas".

"O ódio contra as mulheres on-line é significativamente mais forte e tem qualidade diferente do ódio e da desinformação voltada contra os homens", diz Ballon.

"O conteúdo falso difundido sobre as mulheres é muitas vezes mais sexualizado. E o espectro é amplo, começando com os comentários sobre a aparência de alguém, seu sexo, sua sexualidade, chegando até a ameaças de abuso sexual", afirma.

Calúnias e até falsa foto nua

Desde sua nomeação, Baerbock tem sido alvo de ódio sexista: houve calúnias sobre sua aparência, mentiras como sobre ela supostamente estar pedindo a abolição dos animais de estimação para combater a mudança climática.

E circulou também uma falsa foto nua de Baerbock, que na verdade era a foto de uma jovem estrela pornô russa com uma vaga semelhança com a política alemã.

Tudo isso foi divulgado em uma tentativa de desacreditar Baerbock, que está atualmente à frente na corrida para substituir Merkel.

"O que estamos vendo agora, infelizmente, não foi inesperado", diz o conselheiro político e de comunicação Johannes Hillje. "Ao lado de teorias conspiratórias, islamofobia e sentimento antimigração, a misoginia é uma parte fundamental da ideologia dos grupos que criam e difundem este tipo de conteúdo".

"Como mulher, política liberal e bem-sucedida, Baerbock atende a muitos dos critérios da imagem clássica de 'inimiga'. Para a nova cena da extrema direita, Baerbock é a nova Merkel", complementa Hillje. Baerbock subiu rapidamente nos índices de popularidade e está politicamente mais à esquerda que Merkel.

Discurso de ódio se adapta

Durante anos, mesmo antes da popularização de plataformas como Facebook, Twitter, Telegrama e Whatsapp, Merkel foi alvo de teorias de misoginia, desinformação e conspiração semelhantes às de outras figuras públicas em todo o mundo.

O conteúdo, antes focado na migração, por exemplo, foi rapidamente adotado no último ano para se adequar à pandemia: manchetes e imagens foram alteradas, mas a terminologia e as táticas permanecem as mesmas.

A proteção climática não é apenas um dos temas centrais da campanha verde de Annalena Baerbock, ela também se tornou há muito tempo um assunto-chave para desinformação difundida por grupos de extrema direita e teóricos da conspiração.

No momento, dois grupos principais estão de olho em Baerbock, diz Hillje. Um é uma rede de extrema direita. O segundo é pró-russo, diz ele, apontando as críticas de Baerbock a Moscou, e o desejo do Partido Verde de acabar com a construção do Nord Stream 2, o controverso gasoduto entre a Rússia e a Alemanha.

Mas rastrear a origem exata da desinformação e do ódio ainda é uma tarefa difícil, afirma Till Eckert, repórter e pesquisador da desinformação e do extremismo moderno de direita na organização sem fins lucrativos Correctiv. Ele já expôs vários relatos falsos sobre Baerbock desde que sua candidatura foi confirmada.

Como isso pode ser impedido?

O Partido Verde diz que planeja combater o aumento do ódio e desinformação com a chamada "Netzfeuerwehr" (bombeiros da rede), criado antes das eleições de 2017 para reportar conteúdo falso e ódio online. Vários incidentes também já foram relatados de acordo com uma lei, aprovada em 2017, com o objetivo de combater o ódio e a desinformação nas redes sociais.

Julian Jaursch, que dirige o projeto Fortalecimento da Esfera Pública Digital no instituto alemão SNV diz que não há milagre para deter o ódio e a desinformação online.

"Mas, como sociedade, há uma combinação de coisas que podemos fazer para tentar combatê-la", diz. Ele destaca a necessidade de um jornalismo forte e independente e de verificação de fatos para desmascarar a desinformação. 

"Os próprios cidadãos também precisam ser competentes na forma como consomem as notícias. Precisamos estar nos perguntando: de onde vem esta notícia? O que esta fonte quer me dizer? É uma fonte séria? Eu realmente preciso encaminhar isso a todos os meus contatos?", questiona.

Radicalização crescente

A maior preocupação dos especialistas agora é menos o efeito nos resultados eleitorais, e mais como o ódio e a desinformação online podem se traduzir em violência na vida real - algo que já se tornou realidade em várias ocasiões.

Durante a pandemia, período no qual se viveu um impulso nas teorias da conspiração, o Instituto Robert Koch, bem como os centros de vacinação, foram atacados por negacionistas da covid. Perpetradores de vários ataques de extrema direita a civis e políticos nos últimos anos também foram ligados a plataformas que divulgavam ódio e desinformação.

"Mais parcelas da sociedade estão se radicalizando cada vez mais", diz Eckert. "E isso não deve ser subestimado".