Discurso de Temer sobre mulheres gera indignação
9 de março de 2017Um discurso de dez minutos do presidente Michel Temer, durante a cerimônia do Dia Internacional da Mulher na quarta-feira (08/03), gerou uma enxurrada de críticas em redes sociais e veículos de imprensa. Temer foi chamado de "machista", "antiquado" e foi acusado de ter feito uma "anti-homenagem" ao explicitar uma visão arcaica sobre o papel feminino na sociedade.
No discurso em Brasília, Temer disse que as mulheres têm uma grande participação na economia porque "ninguém mais é capaz de indicar os desajustes, por exemplo, de preços em supermercados do que a mulher". O presidente também louvou "o quanto a mulher faz pela casa, o quanto faz pelo lar, o que faz pelos filhos".
A fala destoou completamente das centenas de manifestações organizadas no dia, que pedem mais igualdade entre homens e mulheres no mercado de trabalho. O presidente disse, por exemplo, que "hoje homens e mulheres são igualmente empregados", apesar de dados do IPEA divulgados no início da semana apontarem que o trabalho doméstico faz com que as mulheres trabalhem 7,5 horas a mais que os homens por semana.
Dados do instituto também apontam que o desemprego entre as mulheres é mais alto do que os homens em todas as regiões do país.
O presidente também declarou que "o número de mulheres que comandam empresas" é imenso e que atuação delas no Legislativo é "extraordinária", apesar de levantamentos apontarem que as mulheres estão subrepresentadas em cargos executivos de grandes empresas brasileiras e ocupam apenas 11% das 594 vagas do Congresso.
Críticas
Nas redes sociais, usuários reclamaram da fala do presidente de 75 anos e ironizaram a sua visão. "Acho que o Michel Temer pegou o discurso de dia da mulher que o marechal Deodoro deixou na gaveta", escreveu a quadrinista Alexandra Moraes no Twitter.
O escritor Marcelo Rubens Paiva, por sua vez, chamou Temer de "imbecil". "Que imbecil esse Michel Temer. Quem faz supermercado é mulher? Na minha casa eu que faço. Há muitos anos". Ele disse ainda que "está provado que Temer é um vampiro que nasceu há 200 anos e pensa como se estivesse no século 18".
Uma usuária do Twitter disse que "Temer não fala m... machista por velhice. Suplicy é velho, filho do Bolsonaro é jovem. Machismo não é produto de idade, é posição política."
O jornalista Josias de Souza escreveu em seu blog que Temer "parece não enxergar a evolução ao redor". "Seu discurso talvez fosse bem recebido pelas Amélias da década de 1940, mulheres que não tinham 'a menor vaidade', cantadas por Mário Lago e Ataulfo Alves. Ao transportar essa mulher com aroma de passado para 2017, Temer produziu uma hedionda anti-homenagem. Perdeu uma excelente oportunidade de perder uma oportunidade."
A colunista Eliane Brum também recriminou o presidente em um texto publicado na sua conta do Facebook: "Enquanto as mulheres ocupavam as ruas do Brasil, Temer provava mais uma vez que não compreende o país que governa por força de um impeachment. (...) Este momento do Brasil não é apenas triste. É constrangedor. E é boçal. Ao discursar, Temer nos envergonha."
O colunista da Folha de S.Paulo Bernardo Mello Franco escreveu que "desta vez não há como jogar a culpa no marqueteiro".
A controvérsia gerada pelo discurso do presidente foi rapidamente explorada por figuras da oposição e antigos membros das administrações petistas. A ex-ministra Maria do Rosário disse no Twitter "avisem Temer que é 2017. A gente lava roupa, cozinha e arruma casa porque não há igualdade. Mas somos mais do que isso. Ganhamos até Presidência, e no voto." Já o ex-ministro Carlos Minc chamou Temer de "troglodita" e a ex-deputada Luciana Genro disse que o presidente é "machista".
Deputadas da base aliada, porém, defenderam Temer. Shéridan (PSDB-RR) disse "isso não diminui a mulher em nada". Já Soraya Santos (PMDB-RJ) defendeu a linha argumentativa do presidente afirmando que "as primeiras pessoas a sentirem a crise são as mulheres que administram a casa, porque fazem a compra e a contabilidade do dia a dia”.
Controvérsias
Temer já havia provocado uma onda de críticas no início do seu governo quando nomeou um ministério sem nenhuma mulher – algo que não acontecia desde o governo Geisel (1974-1979). Ele também extinguiu a Secretaria de Políticas para as Mulheres e passou as atribuições da pasta para o Ministério da Justiça. À época, o ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, disse que "não foi possível" nomear mulheres. No final do governo Dilma (2011-2016), seis mulheres comandavam ministérios.
Temer só nomeou a primeira mulher para o alto escalão do governo após quatro meses – Grace Mendonça, que passou a comandar a Advocacia-Geral da União (AGU). O presidente também não foi o único membro do governo a dar declarações desastradas sobre mulheres. Em agosto do ano passado, o ministro da Saúde, Ricardo Barros, disse que "homens trabalham mais, por isso não acham tempo para cuidar da saúde”. Ele posteriormente pediu desculpas pela declaração.
Nesta quinta-feira (09/03), um dia após a controvérsia gerada pelo discurso, Temer usou as redes sociais para adotar outro tom. No Twitter, disse: "Meu governo fará de tudo para que mulheres ocupem cada vez mais espaço na sociedade e (...) tenham direitos iguais em casa e no trabalho. Não vamos tolerar preconceito e violência contra a mulher."