Diretora de abrigo causa indignação com e-mails racistas
16 de agosto de 2016Em seus e-mails, eles fantasiavam detalhadamente sobre crianças decapitadas. Falavam em uma "guilhotina infantil" e em cadáveres que seriam em seguida incinerados num "crematório de grande volume". E a impressão é que se divertiam enormemente.
Mas desde veio a público a troca de mensagens dos funcionários da firma privada Pewobe, que operava 11 lares para refugiados em Berlim, além de outros nos estados vizinhos de Brandemburgo e Saxônia-Anhalt, só lhes restou um sorriso amarelo.
No site da empresa, que teve seu contrato rescindido por Berlim, afirma-se que ela é especializada numa "assistência apropriada aos residentes por colaboradores adequados e devidamente treinados". Mas há sérios motivos para duvidar do profissionalismo e adequação desses empregados, desde que diversos jornais divulgaram os e-mails internos contendo brincadeiras macabras.
Numa delas, diversos funcionários em cargos de chefia se correspondiam, por exemplo, sobre que destino dar a uma doação de 5 mil euros. Uma caixa de areia para as crianças estava fora de questão. "Com o nosso grupo de residentes, ela logo vai se transformar em cinzeiro ou num toalete doméstico", escreveu Peggy M., a diretora do lar e funcionária da Pewobe (Professionelle Wohn- und Betreuungsgesellschaft: Sociedade Profissional de Moradia e Assistência).
Como alternativa, sugeriu uma "guilhotina infantil". Em resposta, seus colaboradores enviaram fotos do instrumento de execução e de cabeças decepadas. Uma colega alertou que decapitações fazem sujeira demais, pois "sempre espirra um pouco".
Menciona-se, ainda, um crematório, que garantiria para a firma "receber de volta o certificado ecológico", já que o calor assim gerado seria "aplicado de forma útil". Conclusão da funcionária: "Nós somos tão bons." A limpeza, aliás, ficaria a cargo dos residentes com "pigmentação máxima".
Senado rescinde contrato
Essa correspondência racista foi primeiramente encaminhada à administração do Senado berlinense, e no sábado (13/08) o conteúdo foi disponibilizado à imprensa.
No dia seguinte, o senador para Assuntos Sociais Mario Czaja comunicava: "O atual procedimento em relação à indizível troca de e-mails – e, do meu ponto de vista, inexplicável e indesculpável – evidencia não ser mais possível uma continuação da colaboração com a Pewobe."
Não só as mensagens dão a Czaja razão para duvidar da adequação da operadora. "Em diversos abrigos nos foram apontadas falhas de qualidade. Mesmo após repetidas inspeções, as irregularidades não estão inteiramente sanadas." Assim, o contrato foi sumariamente rescindido. Todos os lares serão mantidos, mas sob a responsabilidade de novos operadores.
"Eu, chefe, tu, nada"
As queixas contra a Pewobe não são fato novo. Um dos alojamentos que ela mantém, no bairro de Hellersdorf, na zona leste da metrópole, ocupou as manchetes três anos atrás, devido às semanas de protestos de radicais de direita contra o local.
Segundo a iniciativa cidadã Hellersdorf Hilft, há algum tempo o lar passou a ser encabeçado por uma nova diretora que possui histórico de extremismo de direita. Em 2008, Peggy M. – a mesma que escreveu sobre guilhotinas infantis –candidatou-se pelo partido de ultradireita Deutsche Volksunion (União alemã do povo) a um posto na câmara municipal de Bernau, em Brademburgo.
Consta que uma de suas frases para com os ocupantes do abrigo era: "Eu, chefe, tu, nada" ("Ich Chef, Du nix"). Uma de suas iniciativas no cargo foi cortar a rede de wi-fi para os residentes, afirma a Hellersdorf Hilft. Há bastante tempo seus voluntários vêm reclamando das condições no local.
"Naturalmente é pena ter sido preciso esse caso dos e-mails vir à tona, para que o contrato com a firma fosse cancelado", observa Stephan Jung, porta-voz da associação, pois "antes já havia motivos suficientes". Ele relata sobre queixas constantes dos refugiados quanto ao tratamento dentro do lar, onde o clima é de intimidação.
Histórico de irregularidades
Jung se exime de dar mais detalhes, pois a Pewobe enviou à Hellersdorf Hilft uma carta de advertência exigindo que ela suspenda as acusações e ameaçando com uma ação jurídica. "Somos uma pequena associação de voluntários" que não tem como arcar com um processo, explica o porta-voz.
Quem examina os artigos da imprensa local, no entanto, encontra diversos incidentes estranhos envolvendo a Pewobe. Ela teria, por exemplo, falsificado sua lista de empregados, para esconder que possui quadros bem menores do que exigem as normas da municipalidade de Berlim.
A firma também é citada no inquérito contra o atualmente suspenso diretor do Departamento Estadual de Saúde e Assuntos Sociais, Franz Allert. A acusação é que este teria concedido contratos para a Pewobe pelo fato de seu afilhado ser diretor executivo de uma firma na qual a sociedade de assistência tem participação.