Rosa von Praunheim
27 de novembro de 2007Em pesquisa encomendada na semana passada pela revista Stern, 16% dos entrevistados admitiram gostar mais do programa da apresentadora de TV Anne Will depois que assumiu, publicamente na semana anterior, que vivia uma relação lésbica com a professora universitária Miriam Meckel.
Muito teve de ser feito, no entanto, para que pessoas, públicas ou não, não temessem assumir abertamente sua homossexualidade. Na Alemanha, um dos principais responsáveis pela atual liberdade é o cineasta Rosa von Praunheim.
Com uma grande festa e uma mostra retrospectiva, o tradicional Cinema Babylon festejou, no último final de semana, os 65 anos do cineasta e um dos principais iniciadores do movimento de libertação homossexual no país. Em sua homenagem, o Museu Gay de Berlim abriu a exposição Rosa se aposenta.
"Um dos cineastas gays mais produtivos do planeta"
Rosa von Praunheim, cujo verdadeiro nome é Holger Mischwitsky, nasceu em 1942, em Riga, Letônia, durante a ocupação alemã. Seu nome artístico advém do "triângulo rosa" dos homossexuais nos campos de concentração nazistas, e de Praunheim, bairro de Frankfurt onde cresceu.
Após abandonar o curso de pintura da Escola Superior das Artes, em Berlim, Von Praunheim iniciou sua carreira de cineasta, no final dos anos de 1960.
Em 40 anos de atividades, Von Praunheim dirigiu, entre documentários e filmes de ficção, cerca de 70 filmes. Ele mesmo se considera "um dos cineastas gays mais produtivos do planeta". Como ativista, o diretor provocou escândalo ao lançar seu semidocumentário Não é o homossexual que é perverso, mas a situação em que ele vive.
"Saiam dos banheiros, vão para as ruas"
Rosa von Praunheim sempre foi um provocador. "Saiam dos banheiros, vão para as ruas" era a mensagem do filme que acusava a passividade política de gays, em uma sociedade homofóbica, que se contentavam com a triste vida de bares proibidos e sexo às escondidas em banheiros públicos. O filme foi lançado no Festival Internacional de Cinema de Berlim, em 1971. Durante sua transmissão pela TV pública ARD, em 1973, a televisão da Baviera saiu do ar.
Von Praunheim não somente atacava a sociedade alemã que, somente no ano anterior, anulara o parágrafo do Código Civil de 1872 que proibia relações sexuais entre o mesmo sexo. O principal alvo do diretor eram os próprios homossexuais.
Depois do filme de Von Praunheim que denunciava que "gays não querem ser gays, mas querem tem uma vida pequeno-burguesa e viver como cidadãos medianos e que sua passividade política é agradecimento ao fato de não serem mortos", cerca de 50 grupos ativistas gays foram criados no país.
Outing de personalidades
Durante os anos de 1980 e 1990, Von Praunheim dedicou-se ao combate à discriminação da aids. Em 1991, no auge da crise da doença, o cineasta provocou o furor de vários homossexuais por declarar, em programa de TV da rede privada RTL, que dois dos principais apresentadores da televisão alemã, Alfred Biolek e Hape Kerkeling, eram gays e que tinham a obrigação de se engajar na conscientização sobre a doença.
O argumento de Von Praunheim para o outing de personalidades gays foi: "Ser gay e lésbica não será uma questão de cunho privado, enquanto formos expulsos, devido à nossa homossexualidade, de nossos empregos e moradias".
Von Praunheim se dedicou desde cedo à difusão do sexo seguro, chamando até mesmo seus opositores de "assassinos" e angariando vários inimigos na cena homossexual, cujo estilo de vida combatia – um paradoxo, já que o próprio Von Praunheim se considera "promíscuo", apesar de viver com seu companheiro Mike Shepard, já há 30 anos.
"Certo, útil e necessário"
Oscilando entre o kitsch e o político, o trabalho cinematográfico de Von Praunheim trata de gays, divas, mulheres fortes, bichas corajosas, transsexuais, estrelas-pornô e temas como radicalismo de direita e luta contra a aids. Seus documentários, com certeza, são seu ponto forte. Seus filmes de baixo orçamento convencem e suas provocações recebem os mais diversos elogios. "Certo, útil e necessário", afirma, por exemplo, o diário Frankfurter Allgemeine Zeitung.
O provocador Von Praunheim não lutou somente pela liberdade sexual entre gays e lésbicas, mas por seu engajamento político e por sua solidariedade como cidadãos. "Lutamos por algo mais que 700 bares de sexo", afirma um americano em seu filme Exército dos Amantes ou a Revolta dos Perversos (1979), sobre os movimentos de libertação nos EUA. O amor livre impôs-se, a solidariedade não, reclama o diretor.
Gays mortos, lésbicas vivas
Seu filme Seis estudantes mortos sobre seu tempo como professor na Academia de Cinema e Televisão de Babelsberg estréia nesta semana no Cinema Babylon. A película Minhas mães é a sua mais nova produção.
O filme resgata o passado do diretor em Riga. Somente em 2000, sua mãe confessou, aos 94 anos, que o diretor era adotado. Ela viveu com o filho os dez últimos anos de vida, até morrer em 2003.
Após longas pesquisas, Von Praunheim descobriu que nasceu na Prisão Central de Riga e que sua mãe verdadeira faleceu em um hospital psiquiátrico em 1946. Minhas mães – Procura de pistas em Riga chega aos cinemas em 2008.
Eu sou minha própria mulher (1992), sobre a vida do travesti da antiga Alemanha Oriental Charlotte von Mahlsdorf; Bichas não mentem, mostrando o engajamento político de gays em Berlim e o documentário Homens, heróis, gays nazistas (2005), que trata do radicalismo de direita na cena homossexual, são outros sucessos do diretor. Atualmente, Von Praunheim trabalha no filme Gays mortos, lésbicas vivas.