1. Pular para o conteúdo
  2. Pular para o menu principal
  3. Ver mais sites da DW

Cinema brasileiro

Carlos Albuquerque9 de maio de 2007

Marcelo Gomes, diretor de "Cinema, Aspirinas e Urubus", inicia estada de seis meses como artista convidado do DAAD em Berlim. DW-WORLD conversou com o cineasta pernambucano sobre seus planos na capital alemã.

https://p.dw.com/p/APtU
Marcelo Gomes desenvolve filme sobre o privado e o público, em BerlimFoto: Carlos Albuquerque
Marcelo Gomes
Gomes e Laura Munoz, do programa de artistas do DAADFoto: Carlos Albuquerque

Em entrevista exclusiva à DW-WORLD, o cineasta pernambucano Marcelo Gomes, diretor de Cinema, Aspirinas e Urubus, filme escolhido como candidato brasileiro a concorrer ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro deste ano, falou de seus planos e expectativas para sua estada em Berlim. Gomes inicia, nesta semana, residência de seis meses na capital alemã como bolsista do programa de artistas do DAAD (Serviço Alemão de Intercâmbio Acadêmico).

DW-WORLD: No seu primeiro longa, Cinema, Aspirinas e Urubus, você conta a história de um alemão e um brasileiro que se encontram no sertão. Sua história agora se inverte e você vem para a Alemanha. Quais são seus planos para este ano em Berlim como artista convidado do DAAD?

Marcelo Gomes: Inicialmente, escrever no exílio será uma boa experiência. Eu já havia vivenciado isto quando estudei cinema na Inglaterra, mas, desta vez, escreverei meus projetos em português. Poder desenvolver um trabalho artístico em um ambiente que não é o seu é uma experiência rica. Você observa pontos de sua cultura que você não observaria se estivesse lá.

Pretendo desenvolver dois filmes. O primeiro se chama Era uma vez Verônica e conta a história de uma jovem de classe média, que vive em um ambiente machista, violento e urbano, no Brasil de 2007. O filme trata de como esse ambiente altera a forma de sentir e amar de uma menina de classe média, de como a vida dura das ruas endurece o coração de Verônica. Até agora, o cinema brasileiro falou pouco da classe média, porque tinha medo de ser taxado de novelesco. Será um filme sobre o privado e o público.

Você já havia falado na estréia de seu primeiro filme em Paris, no ano passado, que seu próximo trabalho teria uma temática urbana. Nesse contexto, qual poderá ser a influência de sua estada em Berlim?

Isto fica bem claro também no outro projeto que pretendo fazer aqui em Berlim em parceria com o artista plástico e cineasta mineiro Cao Guimarães, que me convidou para desenvolvermos juntos sua primeira ficção. O projeto se chama O Homem das Multidões, inspirado em um conto do escritor norte-americano Edgar Allan Poe. O conto foi escrito no século 19, mas sua temática é bastante atual.

Trata-se de um homem que sofre do pior tipo de vício, o vício de gente. Ele sofre do pior tipo de solidão que é de não conseguir ficar só. Pretendo investigar o que é a solidão tropical de uma cidade como São Paulo, quando o calor exaure. A urbanidade de Berlim e a distância do Brasil vão me ajudar muito neste projeto.

Você já conhecia Berlim?

Eu já conhecia a cidade e tive a grata satisfação, no ano passado em Berlim, de apresentar meu filme em um festival que se chama 14 filmes ao redor do mundo, que aconteceu no Cine Babylon. Cada diretor era convidado para apresentar um filme. Por ser um roadmovie, o diretor convidado para apresentar meu filme foi Wim Wenders, que também participou do debate. A repercussão do filme foi muito boa.

O seu filme já estreou na Alemanha?

Por incrível que pareça, apesar do personagem alemão, nenhum distribuidor deste país se interessou em comprar o filme, que já estreou na Suíça, Bélgica, Holanda, Estados Unidos, Grécia, etc.

Cinema, Aspirinas e Urubus foi o primeiro filme brasileiro a ganhar a Mostra de São Paulo, tendo sido também muito bem acolhido pelos críticos, que o indicaram como candidato do Brasil para concorrer ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro. Você acha que Hollywood estaria preparada para premiar cinema de autor?

Antes, eu dizia algo muito preconceituoso: se eu ganhasse o Oscar, estaria acontecendo algo de errado ou comigo ou com a Academia de Cinema de Hollywood. Bergman, Kurosawa e Fellini ganharam Oscars. A idéia de cinema virou muito mercantilista, dentro e fora da Academia.

O fato de meu filme ter sido aceito por 150 mil brasileiros, por Cannes e pela comissão da candidatura brasileira ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro foi uma grande surpresa, considerando que foi um filme feito sem concessões ao mercado. Fico contente, porque isso mostra que nem tudo está perdido. Mas, cada dia que se passa, há menos espaço para se falar de arte, em Hollywood e fora dela.