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Falta de vacinação pode ser causa de surto de febre amarela

21 de janeiro de 2017

Doença avança em áreas rurais de Minas Gerais e especialista não descarta risco de o vírus chegar nas cidades. Brasil não registra casos urbanos desde 1942. Medo provoca corrida aos postos de saúde.

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Fila de espera num posto de saúde em Ribeirão das Neves, Minas Gerais
Foto: DW/N. Pontes

Em sua terceira tentativa na semana, Jordélia, 49 anos, madrugou no posto de saúde em busca da vacina contra febre amarela, em Ribeirão das Neves, região metropolitana de Belo Horizonte. Ela não tem carteira de vacinação, desconhece os sintomas e as causas da doença. "Fiquei com medo porque soube que as pessoas estão morrendo em Minas Gerais. Quero me prevenir", disse à DW Brasil.

No posto onde aguardava, as doses recebidas não foram suficientes para imunizar todos os que esperavam na fila. Rosilene e a filha, de 6 anos, terão que voltar outro dia. "A gente nunca sabe quando a vacina chega", afirmou.

Desde o começo do pior surto de febre amarela no estado, em meados de dezembro, 25 pessoas morreram depois de contrair a doença. Até o momento, 47 casos foram confirmados entre os 272 suspeitos. A maior parte deles se concentra na região leste de Minas Gerais, onde 152 municípios estão em alerta. Outros 71 óbitos e 154 casos suspeitos estão sendo investigados.

"Em mais de 95% dos óbitos, os pacientes eram do sexo masculino, aposentados, lavradores ou moradores de áreas rurais", informou Rodrigo Said, subsecretário de Vigilância e Proteção à Saúde. "Também não tinham histórico de vacinação", adicionou.

A notícia provocou uma corrida aos postos de saúde. Na região central de Belo Horizonte, Nétali aguardava sem saber se receberia a imunização. "Com o surto, estou com medo de faltar vacina. A doença está muito perto da gente", justificou.

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Além da falta de vacinas, posto de saúde de Riberão das Neves tem lixo e entulho jogado próximo da entradaFoto: DW/N. Pontes

Topo da pirâmide

Segundo o Ministério da Saúde, o surto em Minas se concentra em áreas rurais. Na mata, o vírus da febre amarela é transmitido pelos mosquitos dos gêneros Haemagogus e Sabethes. Nas cidades, o vetor é um conhecido da população: o Aedes aegypti.

Desde 1942, o Brasil não registra casos de febre amarela urbana. Para Said, as chances de o vírus se espalhar entre moradores das cidades são remotas.

Erna Kroon, professora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), enxerga um risco maior. "A literatura mostra que muitos casos são assintomáticos ou muito leves. Ou seja, podemos estar diante de um número maior de contaminados, que podem estar circulando pelas cidades sem saber que estão doentes", alertou Kroon. Quando o mosquito pica um infectado, ele pode transmitir o vírus para outras pessoas.

Segundo dados da Secretaria de Saúde de Minas Gerais, 49% da população está vacinada contra a doença. Em todo o país, 64℅ estão imunizados, informou o Ministério da Saúde.

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Descuido na prevenção: reforço da vacinação, feito a cada dez anos, foi abolido no ano passadoFoto: DW/N. Pontes

Surto e vacina

Os sintomas da febre amarela incluem o início súbito de febre, dores de cabeça e nas costas, vômitos, fadiga e calafrios. "Acredito que houve um descuido na vacinação. O governo acreditou que não seria mais necessário uma vacinação tão extensa e agora corre para conter o avanço do surto", analisou Kroon.

Uma funcionária do serviço público de saúde de Minas Gerais, que preferiu não se identificar, disse que o reforço da vacinação, feito a cada 10 anos, foi abolido desde o ano passado.

A instrução é que os funcionários imunizem crianças de 9 meses e repitam a dose aos 4 anos. "A recomendação é que o adulto que tenha recebido duas doses na vida não receba mais o reforço. Mas nunca nos explicaram o porquê da mudança", comentou.

Consultado, o Ministério informou que passou a seguir desde meados de 2016 uma recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS) que comprovou a eficácia de uma única dose para a vida toda.

No ano passado, 16 milhões de doses foram distribuídas no país, 3 milhões a menos que em 2015. A vacina oferecida de graça pelo Sistema Único de Saúde (SUS) é produzida pelo Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos da Fundação Oswaldo Cruz, a maior fabricante do mundo.

Entre macacos

Nos estados da Bahia e do Espírito Santo, que fazem divisa com a região mais afetada em Minas Gerais, a vacinação será reforçada. "Ainda assim, as pessoas ficarão ainda expostas, já que a proteção começa a agir depois de 10 dias", pontuou Kroon.

Na divisa com São Paulo, a febre amarela pode ter vitimado macacos, principais hospedeiros do vírus. Mais de 40 municípios mineiros estão sendo monitorados depois da morte suspeita de 13 primatas.