Depois da tensão, festa do tri toma conta de Buenos Aires
19 de dezembro de 2022Era impossível não sentir e ouvir a emoção no meio-dia deste domingo (18/12) em Buenos Aires. Com a vantagem de 2 a 0 no intervalo, a torcida argentina dançava não só no Obelisco da avenida 9 de Julho como também nas sacadas das residências.
Mas aí veio o terror. Duas vezes os franceses igualaram o placar, e duas vezes a alegria deu lugar à dúvida e a gritos de "no, no!" nas salas de estar, nos cafés, nos restaurantes.
Mas a Argentina não seria a Argentina se o triunfo numa Copa do Mundo não fosse antecedido por uma grande porção de drama e paixão. E, assim, depois de um silêncio tenso temporário, a alegria explodiu em todo o país no início da tarde de domingo.
Esta nação sempre tão dividida politicamente festejou unida o tricampeonato. A jornalista Pola Oloixarac, do jornal La Nácion, descreveu o elemento unificador da Albiceleste com uma comparação adequada: "A seleção é para nós o que a coroa britânica é para a Inglaterra. Ela é o que dá sensação de pertencimento e permite que a frustração seja tolerada."
Pessoas de todos os cantos da cidade se deslocaram para o Obelisco. "Argentina campeã, ganhamos a Copa", gritavam. Praticamente todas estavam vestidas com a camisa da seleção, e a maioria com o número 10 de Messi nas costas. Pouco antes, ele era chamado de "Nosso Messias" na televisão. Futebol, afinal, é religião na Argentina.
"Agora Messi está no mesmo nível de Maradona", disse um torcedor, que trazia a inscrição "Messi, te amo" no corpo e que saiu correndo para o Obelisco, o epicentro da festa que reuniu, segundo estimativas oficiais, mais de 1 milhão de pessoas. Para todos aqueles que têm menos de 40 anos, é o primeiro triunfo numa Copa do Mundo. Também por isso a animação é maior sobretudo entre os mais jovens.
Última Copa de Messi
E a emoção está garantida também para os próximos anos. Pois, em algum momento, Lionel Messi vai tirar para sempre a camisa da seleção. Ele já anunciou que não vai disputar mais uma Copa do Mundo.
Em Buenos Aires especula-se que haverá uma Copa América na Argentina, em 2024, para a despedida de Messi. O próprio jogador alimenta o boato. "Gosto da seleção e gostaria de disputar mais alguns jogos como campeão do mundo", declarou.
Nos últimos dois anos, Messi preencheu as duas lacunas que ainda havia no seu currículo de futebolista: ele ganhou uma Copa América e a Copa do Mundo. Com isso, os sonhos dele se realizaram, e a maldição de ficar sem títulos na seleção foi afastada. Agora é a hora de aproveitar.
Mas e depois? Messi jamais havia sido tão fundamental para a seleção argentina como foi nesta Copa do Catar. Além dele, também Angel di Maria vai deixar a equipe. Os dois artilheiros da final — e Di Maria também decidiu a favor da Argentina a Copa América no Brasil — não estarão na Copa de 2026.
Quem será o próximo craque?
A geração que chega é de primeiro nível, mas quem vai comandar a equipe, quem vai sucedê-los? Quem vai carregar a 10 quando Messi não estiver mais lá? O técnico Lionel Scaloni comentou, meio brincando, meio a sério, que dá para deixar o número vago até 2026, para o caso de Messi mudar de ideia.
Desde 1978 — ou seja, em 44 anos —, a Argentina só disputou duas Copas sem os seus dois maiores astros: Maradona e Messi. Na Copa de 1998, a seleção foi eliminada nas quartas de final, e em 2002, já na fase de grupos. Ninguém questiona que o futebol argentino vai continuar revelando talentos de classe internacional, mas craques do quilate de Messi e Maradona não se acham em qualquer esquina, nem mesmo na Argentina.
Mas só depois de todos os festejos, depois que a maioria dos jogadores já tiver retornado ao frio europeu, é que a questão sucessória vai se tornar mais urgente.
Pelo menos as eliminatórias da Copa não serão mais tão difíceis. Antes elas eram uma maratona de 18 jogos em dois anos, e no final só quatro seleções da América do Sul garantiam vaga direta. Com a ampliação da Copa do Mundo de 24 para 48 equipes, a classificação se tornou mais fácil e a disputa, menos interessante. Para seleções como a Argentina e o Brasil, que já estiveram perto de nem se classificar, esse risco deixa de existir. Mas agora ninguém na Argentina quer pensar nisso.