Crise dos refugiados reaviva debate sobre Tempelhof
5 de fevereiro de 2016O cão Holly treme. O vento sopra frio pelo campo aberto do Tempelhofer Feld, parque situado na área de um antigo aeroporto, construído na era nazista e hoje desativado. Algumas pessoas caminham empacotadas em grossos casacos, desafiando a baixa temperatura. Dois homens soltam pipa com linha curta, que salta no céu ao ritmo das rajadas. É um daqueles dias de inverno em que poucos lugares em Berlim são tão desagradáveis quanto este.
"Não se trata só da área em si", diz Margarete Heitmüller. "Trata-se de saber em que cidade queremos viver." Em pé, próxima a uma das entradas do parque, ela segura seu cachorro pela coleira. A poucos metros há uma estante com sapatos velhos, onde cresce capim. Na primavera e no verão, uma área do parque é usada como horta improvisada por alguns moradores do entorno.
Lugar com história
Ao longe, na outra extremidade do campo, é possível ver o edifício do velho aeroporto, que há alguns meses é usado como abrigo de refugiados. Cerca de 2 mil imigrantes vivem nos antigos hangares, em espaços estreitos. A prefeitura de Berlim planeja ampliar a capacidade do abrigo de emergência com construções temporárias adicionais, para acomodar mais 7 mil refugiados.
O que para a administração da cidade é uma medida de emergência para oferecer refúgio às dezenas de milhares de refugiados que chegaram nos últimos meses a Berlim, para Heitmüller significa um "ataque frontal à democracia". Ela é uma das iniciadoras do referendo contra a construção de novos prédios no antigo aeroporto.
Tempelhof era o mais antigo e menor dos três aeroportos de Berlim antes de ter sido desativado, em 2008. E era também o mais central, a apenas quatro quilômetros do Portão de Brandemburgo. Com a desativação, o campo foi aberto ao público, que pode andar de bicicleta ou skate nas antigas pistas de decolagem.
Mais tarde, a prefeitura planejou a construção de prédios de apartamentos nas bordas do campo, além de uma nova biblioteca pública, enquanto a maior parte da área do parque seria mantida como tal. Mas uma iniciativa de cidadãos conseguiu obter assinaturas suficientes para a convocação de um referendo contra os planos. Em 2012, os berlinenses votaram a favor da manutenção de todo o campo como um parque. Desde então há uma lei que proíbe construções no terreno.
O plano para o alojamento de refugiados fez o debate retornar, e de forma ainda mais acalorada. "Eu queria que houvesse menos ódio e mais compaixão", apelou Andreas Geisel, secretário berlinense de Desenvolvimento Urbano, durante a apresentação dos seus planos diante dos adversários do projeto.
Era como se ele estivesse tentando colocar os opositores aos planos do governo berlinense na mesma gaveta que aqueles "cidadãos preocupados" que, por medo de estrangeiros, protestam contra o alojamento de refugiados em sua vizinhança. O outro lado não tem mais escrúpulos e chama os planos da administração berlinense de "política de campo", o que pode despertar associações não menos sombrias, vinculadas aos campos de concentração nazistas.
Críticas mútuas
Heitmüller pede uma xícara de chá de gengibre em um restaurante nas proximidades. Oliver Limpar e Christoph Witt, dois outros iniciadores do movimento contra construções no Tempelhofer Feld, unem-se a ela. Ao se encontrarem com a imprensa, eles sempre optam por reunir vários membros da iniciativa por a entenderem como um movimento de base, em que não há uma pessoa que fale por todos. O grupo é composto principalmente por moradores dos bairros do entorno do parque.
Na época do referendo, eles argumentavam que a construção de condomínios atraentes no lugar faria os preços dos imóveis próximos aumentar. Já no caso de abrigos de refugiados, isso não se aplicaria. Mas os militantes temem que a construção de alojamentos para refugiados esconda a intenção de permitir a construção de prédios no terreno de forma velada. "Estamos lutando pelo Tempelhofer Feld, não contra os refugiados", sublinha Witt.
Sascha Langenbach reage um pouco irritado às perguntas sobre o Tempelhofer Feld. "Então me diga onde devemos acomodar os refugiados", responde ao ser questionado sobre as críticas dos planos do governo.
Langenbach é porta-voz do Departamento Estadual de Saúde e Assuntos Sociais de Berlim (Lageso, na sigla em alemão). Para ele, a expansão do campo de refugiados em Tempelhof é obrigatória. Ele afirma que 55 mil refugiados chegaram a Berlim no ano passado e, em janeiro, mais 7 mil. "Todos têm que ser acomodados. Temos uma situação de emergência", alerta.
A tarefa de Langenbach não é fácil. Ele trabalha para um departamento governamental que tem sido alvo de duras críticas desde o início da crise dos refugiados. O Lageso é responsável pelo registro e primeiro atendimento dos imigrantes que chegam a Berlim. As longas filas na entrada da sede do órgão se tornaram um símbolo do fracasso do governo da cidade-Estado em administrar a crise dos refugiados. Ainda há vários ginásios esportivos ocupados com refugiados na cidade. Uma acomodação adicional para 7 mil pessoas promete aliviar o problema.
Mas a crítica não vem só dos defensores da área de lazer. Nos hangares do antigo aeroporto vivem mais de 2 mil pessoas em um espaço reduzido. Tendas foram montadas no lugar e recintos foram loteados com divisórias, com seis beliches cada quarto de 25 metros quadrados, o que dá dois metros quadrados por pessoa. Ativistas que trabalham com os refugiados não acreditam que os novos edifícios trarão alívio para a situação. Os planos conhecidos até hoje para as tais construções temporárias estão, segundo eles, abaixo dos padrões legais para acomodações compartilhadas. Ativistas pelos refugiados e os defensores do parque formaram uma aliança e protestam juntos contra os planos.