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Cotidiano na Alemanha Oriental inspira lançamentos literários

Silke Bartlick (md)27 de outubro de 2014

Eles conviveram com arame farpado e com a Stasi, a temida polícia secreta da RDA. No aniversário de 25 anos da queda do Muro de Berlim, uma série de novos livros lembra do dia a dia do outro lado da fronteira.

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Foto: picture-alliance/dpa/McPHOTO

Christoph Links é um pioneiro. Em 5 de novembro de 1990, ele fundou na Alemanha Oriental o que, provavelmente, foi a primeira editora privada do país, batizando-a com o seu nome. A preocupação era preencher as "manchas brancas" da história alemã recente e analisar as situações reais na Alemanha Oriental.

A editora se desenvolveu bem. Ao longo dos anos foram acrescentados outros segmentos importantes ao programa da casa. Mas a análise crítica da República Democrática Alemã continua uma prioridade até hoje.

"Nos primeiros dez anos após a Reunificação, conhecemos muito sobre muro, arame farpado, Stasi e fronteira", diz Christoph Links. "Mas o que manteve o país unido por mais de 40 anos – e por que ele funcionava – por muito tempo não esteve em foco. E quando agora nos voltamos finalmente para a história do cotidiano, da cultura, da sociedade, então, finalmente se produz uma imagem diferenciada, que é urgentemente necessária."

Material para isso existe em abundância, pois pontualmente para as comemorações do 25º aniversário da queda do Muro de Berlim inúmeras publicações têm sido lançadas tendo como tema central a vida dos cidadãos da antiga RDA.

Os "conformados"

Roland Jahn, que é desde janeiro de 2011 encarregado dos arquivos de documentos da Stasi, nasceu em 1953 em Jena. Em 1982, ele foi preso e condenado por "atividades contra o Estado".

Roland Jahn
Escritor Roland Jahn também se considera um "conformado"Foto: DW/R. Romaniec

Um ano mais tarde, Jahn foi libertado, mas teve que deixar a RDA contra sua vontade. Agora, em seu novo livro, ele conta sua história, de sua família e contemporâneos. No texto, ele reflete abertamente e honestamente sobre a vida cotidiana na RDA.

Wir Angepassten. Überleben in der DDR(Nós, conformados. Sobreviver na RDA, em tradução livre) foi como Roland Jahn intitulou suas memórias. Pois, embora ninguém queira ser um conformado, "todos eram", afirma ele no livro.

"E ainda somos", insiste. Ele afirma que se adaptar às circunstâncias era simplesmente uma estratégia de sobrevivência. Jahn afirma que o país era um lugar "onde não só a onipotência do aparelho do Estado, mas também o sentimento geral fazia com que as pessoas pensassem que algo poderia acontecer, caso o indivíduo não se curvasse às regras".

Aproximação contínua

"Entre leste e oeste ainda é necessária muita aproximação", diz Mara Ebinger, funcionária da editora Klett Cotta. "E acho que os livros que agora estão sendo lançados no aniversário da queda do Muro de Berlim ajudam nisso."

Berliner Autorin Ines Geipel
Escritora e ex-atleta Ines Geipel: uma "filha do Muro"Foto: picture-alliance/dpa

Entre eles, estão obras como a de Ines Geipel, Generation Mauer (Geração muro, em tradução livre), publicado pela Klett Cotta. O texto é uma reflexão inteligente e complexa da ex-velocista de classe mundial e jornalista sobre a chamada geração média da RDA, aquela nascida por volta de 1960.

Essa geração foi moldada pelos tabus e proibições da RDA, assim como por uma geração de pais que foi de uma ditadura para outra e que carregava alguns fardos não devidamente trabalhados dentro de si. Mas em 1989, esses "filhos do Muro" eram jovens o suficiente para conquistar esse mundo novo e que havia se tornado maior, uma tarefa que ocorreu muitas vezes sob dificuldades, tropeços e mal-entendidos, conforme conta também o livro.

Barras de chocolate e contos de fadas

O escritor David Wagner nasceu em 1971 em Andernach, no oeste alemão. "Eu sabia realmente pouco sobre a Alemanha Oriental. Ao contrário de Jochen, que podia sempre ver televisão da Alemanha Ocidental, a RDA era inexistente para nós", conta.

Jochen é o escritor Jochen Schmidt, nascido em 1970 em Berlim Oriental, capital da RDA. Ele cresceu em um bairro de edifícios pré-fabricados, enquanto David Wagner cresceu em uma casa de família próxima do rio Reno. Em seu notável livro Drüben und Drüben (Do outro lado e do outro lado, em tradução livre), eles contam as infâncias nas duas Alemanhas.

Bernauer Straße - Berliner Mauerweg
Memorial da Bernauer Strasse: recordações do Muro no meio de BerlimFoto: picture-alliance/dpa/Paul Zinken

Eles falam de barras de chocolate que se chamavam Märchenriegel (barra de conto de fadas) ou Fetzer e de outras guloseimas típicas da época, chegando à conclusão de que suas memórias são surpreendentemente similares.

"A RDA não era tão ruim para uma criança", observa David Wagner. Para ele, alemão ocidental, ela é agora "uma lembrança curiosa", que dificilmente pode ser explicada. "Um muro passando no meio de Berlim? Minha filha pergunta então: pai, por que as pessoas não reclamavam?". Hoje, ele considera uma felicidade que "as crianças não consigam mais imaginar como era viver em uma ditadura".

"Ossis" e "wessis"

Mas todos aqueles que viveram na RDA não se esquecem como ela era. E eles não se esquecem também que são ossis, como os alemães orientais eram chamados popularmente. Isso porque os wessis (alemães ocidentais) não deixam que eles se esqueçam disso.

E porque, simplesmente, ainda existem diferenças sutis. Estas são tema de dois livros divertidos: Der Osten ist ein Gefühl. Über die Mauer im Kopf (O leste é um um sentimento - sobre o muro na cabeça, em tradução livre), de Anja Goerz, e Die Ostdeutschen. 25 Wege in ein neues Land (Os alemães orientais. 25 caminhos para um novo país, em tradução livre), um projeto conjunto da emissora de televisão RBB, da produtora cinematográfica Credofilm, do jornal Berliner Zeitung e da editora Christoph Links.

Manfred Stolpe, ex-governador do estado de Brandemburgo, apresentou o novo trabalho conjunto na Feira do Livro de Frankfurt. No evento, ele disse desejar que nunca seja esquecido "que as pessoas exerceram sua soberania naquele 9 de novembro". Para ele, aquela foi a "coroação do movimento de protesto". "Então, vimos que as próprias pessoas tomaram o destino em suas próprias mãos", ressalta.

Christoph Links und Manfred Stolpe auf der Frankfurter Buchmesse 2014
Christoph Links e Manfred Stolpe durante lançamento na Feira do Livro de FrankfurtFoto: DW/S. Bartlick