"Corre, pára!" O que foi que ele disse?
24 de setembro de 2002A idéia do livro surgiu há dois anos durante uma partida de futebol. O lingüista Uwe Wiemann estava sentado na arquibancada quando presenciou o técnico do Borussia Dortmund, Matthias Sammer, conversar com o jogador brasileiro Evanílson por meio de um intérprete.
Ele achou a cena absurda. Afinal, os clubes pagam uma fortuna pelos craques estrangeiros e não investem no aprendizado do idioma alemão. Por melhores que sejam em campo, a falta de comunicação interfere no desempenho dos jogadores. No caso de Evanílson, ele já estava no Dortmund há mais de um ano e ainda não conseguia entender as instruções do técnico sem a presença de um tradutor.
Na semana seguinte ao jogo, ao dar aulas para estudantes estrangeiros, Wiemann pensou que também seria capaz de ensinar alemão para os craques. Para isso, sabia que não poderia usar os livros convencionais existentes no mercado. Era preciso desenvolver um livro que, ao invés de apresentar situações do dia-a-dia, como compras, passeios e cenas em restaurantes, mostrasse a realidade do cotidiano do jogador.
"O livro é para os jogadores e está dividido em 17 capítulos que representam as 17 rodadas de um turno da temporada do Campeonato Alemão. A primeira parte ensina como cumprimentar os colegas de equipe. A lição seguinte mostra um cartão de autógrafo com todos os dados importantes de Diego Placente. Os jogadores tem espaço para fazer seu próprio cartão de acordo com o exemplo apresentado. Depois explicamos as denominações usadas em campo e os alunos aprendem as posições dos jogadores. O uso das preposições é assimilado automaticamente: ao lado, na frente e sobre a rede", esclarece Wiemann que, com a ajuda de outros colegas, está redigindo o livro que deverá ser publicado até final de 2003.
Máquina de lavar x treinos
O material que constará no livro está sendo testado com os jogadores do Bayer Leverkusen, com o apoio do pedagogo Frank Ditgens, que presta assessoria aos craques estrangeiros.
Ele garante que os livros convencionais não são nada atrativos. "Se Lúcio vê a foto de uma máquina de lavar no livro que ensina alemão, pode ter certeza que ele não aparece mais no curso. A gente precisa ter um material que melhor se adapte à realidade de um craque que joga na seleção brasileira", afirmou Ditgens.
Método adequado
Os jogadores têm pouco tempo para estudar. Por isso o método de Wiemann não prevê lições de casa. A maioria dos craques, inclusive, mal freqüentou direito a escola. Desde pequenos eles se concentraram no futebol e por isso apresentam uma dificuldade maior de aprender um segundo idioma, analisou Ditgens.
Wiemann concorda com este ponto de vista, acrescentando que não adianta tentar ensinar alemão perfeito, dando ênfase exagerada à gramática. O importante é conseguir que haja comunicação e entendimento do linguajar futebolístico.
Diferenças que fazem diferença
As diferenças sociais são outro fator importante. Ditgens lembrou que os jogadores estrangeiros vêm de camadas sociais distintas. O brasileiro Juan, por exemplo, é de classe média alta e não apresenta dificuldades para estudar. Já outros brasileiros são oriundos das favelas e não tiveram formação escolar. Não se pode esperar deles que tenham vontade de assistir aulas.
"Além disso", frisou Ditgens, "é muito difícil para um sul-americano aprender alemão. A gramática, a pronúncia e melodia são diferentes. Para os jogadores do Leste Europeu é mais fácil assimilar o alemão, pois muitos falam inglês".
Integração social
Fazer com que os craques estrangeiros aprendam o alemão é importante não apenas para a melhor comunicação com os colegas e técnico mas também para a integração social, assinala Ditgens. "Quando um jogador consegue resolver sozinho situações cotidianas, ele se sente bem, mais confiante. Melhor ainda quando sua esposa também fala um pouco de alemão. Ele fica mais integrado na sociedade, tem mais contatos e joga melhor. Conseqüentemente seu valor aumenta. Por isso nós temos interesse econômico em que os jogadores aprendam o idioma. Isso já deu certo com Jorginho, Émerson, Paulo Sérgio e Zé Roberto. A transferência desses jogadores brasileiros rendeu um bom dinheiro ao Bayer Leverkusen."
Exemplo bem sucedido
O lingüista Uwe Weimann cita o exemplo do jogador brasileiro Giovane Élber, do Bayern de Munique, que aprendeu o idioma e está perfeitamente integrado na sociedade alemã. "Ele fala como joga: de modo impulsivo, quase sem erros, possui um vocabulário criativo e não joga conversa fora", elogia o autor do livro de alemão para jogadores estrangeiros.