Estou há sete anos à frente de uma ação social nacional de educação, e já tive a oportunidade de ir a dezenas de escolas públicas de ensino médio de oito estados do país. Nessas visitas, pude perceber que há questões específicas por região, tanto culturais como administrativas, mas também notei pontos em comum. Um deles me intriga muito: a atuação da coordenação pedagógica.
Antes de começar a frequentar escolas em posição diferente da de um estudante, confesso que pensava que a função era exercida por pessoas que passavam todo o tempo de trabalho se preocupando apenas em criar projetos e atividades para os alunos e os professores.
A realidade, infelizmente, é a oposta. Foi com a coordenação com quem mais lidei em cada escola, e o que encontrei foram pessoas quase totalmente sobrecarregadas de burocracias e com excesso de funções. Conheci profissionais sensacionais e genuinamente comprometidos com a educação, mas que estão sempre com pilhas de papéis em suas mesas e cujos rostos e olhares trazem à tona o quanto estão à beira do esgotamento emocional.
No início, para ser honesto, ficava meio desapontado e até mesmo bravo quando ligava ou ia a uma escola para apresentar nosso trabalho, e a coordenação não me atendia, dizia para voltar outro dia ou atendia de uma forma que eu claramente percebia que estava incomodando. No entanto, felizmente, não demorou para que eu entendesse a realidade deles e que, devido às circunstâncias, eles simplesmente temiam qualquer sinal de novas responsabilidades.
Penso na quantidade de oportunidades que poderiam chegar até os alunos, mas que simplesmente não chegam. Penso também na quantidade de projetos dos próprios colégios que não saem do papel. Tudo isso simplesmente devido ao fato de que os profissionais que poderiam viabilizar tais benefícios estão, quase sempre, atolados em papeladas e se virando nos 30 para exercer todas as tarefas que lhes são destinadas.
O relato de duas coordenadoras
Há colégios com mais de um profissional na coordenação. E há estados com cargos que não há em outros. No entanto, em linhas gerais, é possível pintar um cenário das funções de um(a) coordenador(a) pedagógico(a).
Para isso, falei com a Karen Manchini da Silva. Ela é professora de português e inglês. Não está mais na coordenação, mas atuou como coordenadora por dez anos na secretaria de São Paulo.
Segundo ela: "A coordenação pedagógica envolve o trabalho de acompanhamento da aprendizagem e frequência dos alunos, o trabalho docente, as propostas em relação a projetos curriculares e extracurriculares, acompanhar os estágios no colégio, o acompanhamento do currículo oficial da rede em que está inserido e mais a parte de organização e acompanhamento do trabalho docente."
Além disso, há "o que se espera em relação ao desenvolvimento de projetos na escola que seja pensado pelo coordenador ou pelos professores. A função do coordenador é fazer com que seja possível fazer com que esses projetos aconteçam e sempre pensando se tais projetos são, de fato, coesos com o currículo oficial."
Leandra, uma coordenadora atuante na rede paulista, complementa: "Hoje em dia, também é pedido que façamos observação em salas de aula, ou seja: acompanhar o trabalho dos professores e os ajudar com a organização e com a metodologia de salas de aula. O problema, que faz com que muitas vezes não possamos cumprir as metas, são as outras funções: se faltar um professor, nós que devemos dar a aula. Também fazemos busca ativa – ou seja, ir atrás dos alunos que estão com muitas faltas – e atividades rotineiras do colégio, como liberação dos alunos que precisam ir embora e questões de indisciplina. Dessa forma, acabamos não realizando os projetos pedagógicos."
Sobre a parte burocrática, Karen afirma: "Ela impede que algumas coisas sejam realizadas na escola. Neste ano que passou, o estado de São Paulo exigiu um acompanhamento de ferramentas digitais excessivo, e notamos que o único objetivo era que vissem as metas sendo atingidas, independentemente da funcionalidade ou se aquilo fazia, de fato, alguma diferença em relação ao pedagógico".
Sobre o acompanhamento de aulas, ela comenta: "Colocaram metas para que o coordenador e o diretor de cada escola fizessem, pelo menos, duas observações de aula por semana, com um relatório de cada. Se for fazer uma conta, daria mais de mil aulas em menos de um mês. Quem vai, de fato, ler? Parece que é só para preencher papéis, e não que efetivamente o trabalho de observação teria algum efeito pedagógico".
Distanciamento da realidade
As duas, em linhas gerais, nos ajudaram a pintar o quadro da quantidade de funções com as quais um profissional da coordenação precisa se preocupar. São muitas, e boa parte delas se resume a papeladas e a burocracias que não aparentam ter ganhos pedagógicos reais, mas que parecem existir apenas para o preenchimento de metas e métricas.
Há uma reclamação que ouço constantemente de agentes dos colégios e já compartilhei aqui várias vezes: muitas políticas públicas de educação parecem ter sido feitas por quem não conhece a realidade dos colégios.
Essa lacuna culmina em outro problema: uma espécie de subestimação do potencial dos profissionais que estão nos próprios colégios. Entendo, sim, que é necessário uma certa controladoria e que, infelizmente, não podemos fugir das burocracias, mas não posso pensar no quanto há um imenso potencial pedagógico nas mãos desses profissionais que está sendo minado e diminuído pelo acúmulo de funções e pela imensa responsabilidade burocrática que lhes é designada.
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Vozes da Educação é uma coluna semanal escrita por jovens do Salvaguarda, programa social de voluntários que auxiliam alunos da rede pública do Brasil a entrar na universidade. Revezam-se na autoria dos textos o fundador do programa, Vinícius De Andrade, e alunos auxiliados pelo Salvaguarda em todos os estados da federação. Siga o perfil do programa no Instagram em @salvaguarda1.
Este texto foi escrito por Vinícius De Andrade e reflete a opinião do autor, não necessariamente a da DW.