Confiança nas palavras do PT
28 de outubro de 2002O Brasil elegeu, no último domingo (27), o primeiro governo de esquerda de sua história. O que a Anistia Internacional espera dele?
Esperamos que ele assuma a questão dos direitos humanos de forma mais firme que os anteriores. Afinal, deverá ser um governo profundamente marcado pelo caráter democrático. Com isto, há esperança de que os graves desrespeitos aos direitos humanos no Brasil sejam combatidos agora de forma mais conseqüente. Tanto quanto aos direitos civis individuais, quanto aos direitos humanos de viés econômico, cultural e social. No programa eleitoral do PT, há coisas inteligentes, mas sozinhas não seriam capazes de criar esperanças, pois afirmações bonitas também se encontram nos programas de outros partidos. Mas, por suas origens no movimento social, espera-se que Lula tenha maior empenho em viabilizar medidas neste campo. Por exemplo, uma das situações mais graves são as condições nos presídios brasileiros, um capítulo cruel. Custa dinheiro e Lula não terá mais recursos à sua disposição.
Mas não é possível uma melhoria nas condições dos presídios sem mais verbas?
O dinheiro é necessário. Se Lula não dispuser de mais recursos, então será preciso redistribuir as verbas disponíveis. Em alguns lugares em que governa, o PT implantou o Orçamento Participativo, através do qual a população decide sobre a aplicação de recursos. Pessoalmente, sou cético de que as pessoas vão optar por destinar verbas para presídios, afinal elas sofrem com a falta de segurança sobretudo nas grandes cidades. Tanto devido ao comportamento da Polícia, quanto à criminalidade oriunda do tráfico de drogas e de outros grupos armados. Neste quadro, é difícil defender perante a população que se deve fazer algo pelos direitos dos presidiários. Neste caso, o próprio governo terá de tomar a iniciativa de transferir verbas para melhorar a situação nos presídios.
E a violência no interior do país, especialmente em conflitos de terra?
Nesta área, acho que também existe grande esperança, porque o Movimento dos Sem-Terra tem proximidade com o PT. Não posso omitir que, mesmo insuficientes, houve grandes avanços na reforma agrária durante o atual governo. Estou certo de que Lula fará deste tema uma de suas prioridades, mas por outro lado ele não estará governando sozinho, não terá maioria na Câmara de Deputados, embora o PT venha a ter a maior bancada. Lula terá que buscar compromissos políticos com outros partidos. Acredito, porém, que há grande espaço para um acordo, uma vez que as propostas de Lula e seu partido vêm respaldadas pelos eleitores. A capacidade de o governo dedicar-se, porém, de forma eficiente a temas como os direitos humanos vai depender muito da situação econômica. Enquanto ela não melhorar, ela será a prioridade do governo.