Como a UE reagirá a uma invasão da Ucrânia pela Rússia?
24 de janeiro de 2022As advertências por parte das potências ocidentais são cada vez mais inequívocas: a invasão da Ucrânia pela Rússia é uma possibilidade crescente. Cerca de 100 mil soldados russos se concentram na fronteira entre os dois países, e a Otan está enviando navios e aviões de combate para o Leste Europeu – numa contravenção direta das exigências do Kremlin, que exige a remoção das tropas.
Para a Europa, a situação representa um sério dilema: o que fazer se os russos atravessarem a fronteira e invadirem o país vizinho? No comunicado conjunto que se seguiu a sua reunião de 24 de janeiro, os ministros do Exterior da União Europeia alertaram que "qualquer agressão militar ulterior pela Rússia contra Ucrânia terá pesadas consequências e custos severos".
A esta altura, já se escutaram essas ameaças diversas vezes. Mas a que, exatamente, se referem os chefes de diplomacia?
Sanções e ações
Numa cúpula em meados de dezembro de 2021, os chefes de Estado e governo da UE acordaram quanto à aplicação de punições à Rússia, mas sem uma definição sobre o que seriam, exatamente.
A Alemanha, Áustria e Hungria estão mais próximas da economia russa do que, por exemplo, Portugal ou a Holanda. Como o grêmio requer unanimidade para aprovar qualquer ação política, até o momento a Comissão Europeia não tem mais do que uma lista de possíveis ações, guardada em alguma gaveta de Bruxelas.
Os diplomatas europeus encarregados de preparar as sanções indicam que elas seriam aplicadas contra Moscou num prazo de 48 horas, em caso de invasão. Contudo, teriam que ser coordenadas com os Estados Unidos e o Reino Unido, que também acenaram com medidas punitivas, igualmente não especificadas.
Especula-se se estas incluiriam retirar a Rússia do sistema global de transferência eletrônica SWIFT, ou desligar-se do gasoduto russo-alemão Nord Stream 2. "Impor sanções pesadas contra a Rússia também pode ter consequências para a UE, já que as economias estão interligadas", observa Amanda Paul, especialista em segurança do think tank European Policy Centre, que promove a integração europeia.
"Poderia haver custos que alguns Estados-membros não querem pagar", acrescenta: as autoridades precisariam considerar a possibilidade de refugiados ucranianos serem forçados para dentro do território da UE, e que a desestabilização do país acarrete a de toda a região do Mar Negro.
Para Gustav Gressel, por outro lado, analista-chefe do Conselho Europeu de Relações Estrangeiras, apenas sanções severas mudarão a posição do presidente Vladimir Putin: "Ele avaliou os custos e preparou a Rússia de forma abrangente para sanções econômicas. Só sanções rigorosas contra o setor de energia realmente atingiriam o país. Outras medidas são antes um incômodo do que um obstáculo, e Moscou está confiante que conseguirá contorná-las."
Especificar "invasão"
Um dos principais debates atuais em Bruxelas gira em torno da necessidade de especificar o que, exatamente, desencadeará sanções da UE. Seria uma invasão militar, com tropas russas cruzando a fronteira da Ucrânia? Ou a infiltração de "homenzinhos verdes" – soldados sem insígnias nacionais em seus uniformes –, como foi o caso na invasão da Crimeia?
Ou a gota d'água será um incremento dos confrontos no leste da Ucrânia, onde separatistas dominam certos territórios graças ao respaldo russo? Ou bastará um ciberataque à infraestrutura crítica ucraniana? Em meio a muita incerteza, pelo menos é consenso de que a reação dos parceiros europeus e americanos deverá ser unificada.
Segundo o vice-presidente do Fundo Marshall Alemão, Ian Lesser, "sem coesão euro-americana, Moscou vai ter – ou pelo menos pensará que tem – carta branca". Para a estratégia da Rússia, "criar uma cisão entre os parceiros transatlânticos é, provavelmente, pelo menos tão importante quanto a própria Ucrânia", comentou à DW.
Otan mantém política de "porta aberta"
Como condição para retirar suas tropas da fronteira, a Rússia exige que a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) retire as suas do Leste Europeu, além de assegurar que nem a Ucrânia nem a Geórgia jamais sejam seus membros. A Aliança Atlântica rebate que as decisões de segurança de cada país são soberanas, e que ela nunca mudará sua política de "porta aberta".
Lesser, contudo, acredita que, nos bastidores, posições bem diferentes são expressas: "Na verdade há muito pouco entusiasmo na UE e na Otan por uma filiação ucraniana. Há quem veja um comprometimento com a Ucrânia como um risco de segurança."
Em um ponto, contudo, a Aliança Atlântica – a que a maioria dos Estados da UE pertence – é bem clara: embora a Ucrânia aspire a uma filiação, no momento ela não é membro, portanto não está sob sua proteção contra agressões por Moscou.
"Sempre reagiremos de determinado modo a qualquer deterioração de nosso ambiente de segurança, inclusive reforçando nossa postura de defesa coletiva, na medida necessária", declarou em dezembro o principal órgão tomador de decisões da Otan, o Conselho do Atlântico Norte.
A Otan afirmou-se apta a mobilizar em curto prazo sua Força Tarefa Conjunta de Altíssima Prontidão (VJTF, na sigla em inglês), totalizando 5 mil soldados. Em 30 dias, essa primeira "ponta de lança" pode ser expandida a até 40 mil sodados, na assim chamada Força de Reação da Otan, cuja missão é defender o território da aliança.
"Forneceremos à Ucrânia mais assistência militar, equipamento e armas defensivas, nas próximas semanas", prometeu a secretária de Estado assistente americana, Karen Donfried, "Se a Rússia continuar com uma invasão, forneceremos mais." A Alemanha tem atualmente 16 mil soldados engajados na Força de Reação.
O presidente dos EUA, Joe Biden, está considerando enviar vários milhares de militares para o Leste Europeu. O secretário de Estado Antony J. Blinken explicou à CBS News que "ao mesmo tempo que estamos empenhados em diplomacia, estamos muito concentrados em montar defesa, montar dissuasão".
As autoridades americanas frisam que os planos em consideração não incluem mobilizações para o próprio território ucraniano, o que Moscou consideraria uma grave provocação. Em vez disso, as unidades, empregando entre mil e 5 mil militares, provavelmente irão para os membros bálticos da Otan, Estônia, Letônia e Lituânia, que estão mais apreensivos com as ações russas.