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China encerra programa de adoção por estrangeiros

Yuchen Li de Taiwan
Publicado 10 de setembro de 2024Última atualização 12 de setembro de 2024

Medida tomada pelo governo diante do declínio populacional deixa no limbo as famílias com processos pendentes. De problema, recém-nascidos passaram a ser vistos como recurso.

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Mulher chinesa com um bebê diante da Cidade Proibida, em Pequim
Segundo país mais populoso do mundo, China tem hoje uma das menores taxas de fertilidade e vê sua população encolherFoto: Wang Zhao/AFP/Getty Images

Em 28 de agosto, a China encerrou um programa de adoção de crianças chinesas por estrangeiros que estava em vigor havia mais de três décadas.

Ao confirmar a decisão, a porta-voz do Ministério do Exterior da China, Mao Ning, disse que a decisão estava alinhada com as tendências internacionais e agradeceu aos governos e famílias estrangeiras "pelo amor e bondade que demonstraram".

O demógrafo chinês Yi Fuxian, da Universidade de Wisconsin-Madison, observa que a decisão reflete uma mudança marcante na política populacional da China. "Antes, o governo via um recém-nascido como um fardo, hoje o vê como um recurso", diz.

De solução a problema

Em 1992, quando a China oficialmente abriu as portas para as adoções internacionais, o país lutava para conter seu rápido crescimento populacional por meio da draconiana política do filho único.

Como só podiam ter um filho, muitas famílias chinesas se viam forçadas a abandonar seus filhos sob pena de pagarem altas multas. As primeiras a serem abandonadas eram as meninas e os bebês com deficiências.

Como resultado, a China se tornou uma importante origem de bebês adotados. Nas últimas três décadas, mais de 160 mil crianças chinesas foram adotadas por famílias em todo o mundo.

Cerca de metade dessas crianças foi para os Estados Unidos, de acordo com a China's Children International (CCI), uma organização internacional criada por e para adotados chineses.

Na época, a situação era vantajosa para o governo chinês. "Como Pequim via a população como um fardo, a adoção internacional efetivamente transferia esse fardo para o exterior", comenta Yi.

Idosos participam de atividade social em Hong Kong
País que já impôs a draconiana política do filho único hoje sofre com o encolhimento de sua população e as baixas taxas de natalidadeFoto: Anagha Nair/DW

O recuo populacional da China

Décadas depois, a China tem uma das menores taxas de fertilidade do mundo e enfrenta um encolhimento da população.

Em 2023, os nascimentos caíram 5,7%, para cerca de 9 milhões, e a taxa de natalidade marcou um recorde inferior de 6,39 nascimentos por mil pessoas. A população do país caiu em mais de 2 milhões, o segundo ano consecutivo de declínio.

Depois de eliminar a política do filho único, em 2016, a China começou a incentivar as famílias a terem dois ou três filhos. Apesar desses esforços, muitas jovens chinesas continuam não convencidas a terem filhos devido ao alto custo dos cuidados infantis, temores com a segurança no emprego e um futuro incerto diante da desaceleração da segunda maior economia do mundo.

"No passado, uma população menor era vista como algo positivo. Agora, o declínio populacional traz uma sensação de medo", diz Yi, acrescentando que a decisão da China de parar de enviar crianças para adoção no exterior é parte da resposta a essa crescente crise demográfica.

Com o envelhecimento da população, as adoções internacionais da China já diminuíram de forma constante nos últimos anos. No lugar delas, as autoridades chinesas passaram a priorizar as adoções domésticas, de acordo com um comentário publicado pelo jornal estatal Global Times. Como as adoções domésticas agora representam quase 90% de todas as adoções na China, o artigo diz que encerrar as adoções estrangeiras era um passo inevitável.

Adoções pendentes ficam no limbo

Com o fim do programa de adoções internacionais, não está claro o que acontecerá com as famílias estrangeiras que há anos têm solicitações pendentes.

Numa ligação telefônica com diplomatas americanos na China, representantes do governo chinês disseram que "não continuarão processando casos em nenhum estágio", a não ser aqueles cobertos por uma cláusula de exceção, informou a agência de notícias AP.

O Ministério do Exterior da China comunicou que as únicas exceções à nova regra seriam os casos envolvendo a adoção por parentes estrangeiros dentro de três gerações.

Durante a pandemia de covid-19, a China impôs restrições de viagem e suspendeu as adoções internacionais. De 2020 a 2022, nenhuma criança chinesa foi enviada aos Estados Unidos para adoção, e apenas 16 crianças da China foram adotadas em 2023, de acordo com as estatísticas oficiais dos EUA.

Devido à paralisação por causa da pandemia, muitas famílias estrangeiras que já haviam passado pela escolha de uma criança chinesa para adoção estão esperando há pelo menos quatro anos pela conclusão do processo de adoção. A frustração é tanto das famílias como das crianças chinesas a serem adotadas.

Um dissidente chinês que administra uma conta influente na rede social X compartilhou várias capturas de tela de publicações nas redes sociais chinesas escritas por "funcionários que trabalham na área relevante". As contas desses funcionários foram anonimizadas.

Uma das postagens diz: "Essas crianças na China... Elas sabem que há famílias esperando para levá-las para casa. Receberam presentes de aniversário e de Natal, roupas, fotos de família, cartas e algumas até fizeram ligações pelo Facetime, mas agora tudo isso foi cortado."

"Escreveremos para embaixadores, funcionários do governo e outros para ver o que mais pode ser feito", diz a postagem, "rezando para que as portas sejam abertas".