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Chefe de fórum da ONU pede ação contra crime na Amazônia

8 de agosto de 2023

Em entrevista à DW, presidente do Fórum Permanente da ONU sobre Questões Indígenas defende ações coordenadas e de inteligência policial para combater organizações criminosas que agem na região.

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Dario Mejia Montalvo falando
"É necessário que se veja a Amazônia como um todo", diz Dario Mejia Montalvo, que também é líder indígena colombiano Foto: Evaristo Sa/AFP/Getty Images

Espalhada por Brasil, Venezuela, Peru, Bolívia, Colômbia, Equador, Guiana, Guiana Francesa e Suriname, a Floresta Amazônica virou uma base de ação do crime organizado.

Quadrilhas muitas vezes envolvidas com atividades como pesca ilegal e narcotráfico cruzam as fronteiras sem restrições e ameaçam o modo de vida das comunidades tradicionais. É por isso que o tema deveria ser uma das prioridades na Cúpula da Amazônia, defende Dario Mejia Montalvo, presidente do Fórum Permanente da ONU sobre Questões Indígenas.

"Intervenções militares e de inteligência policial são com certeza necessárias neste momento, porque há muito crescimento das organizações dedicadas ao crime", diz Montalvo em entrevista à DW em Belém, sede da reunião de chefes de Estado a partir desta terça-feira (08/08).

Na visão do líder indígena colombiano, a Amazônia não pode ser tratada como um objeto ou como uma paisagem. Uma das principais barreiras a um acordo de impacto para preservação do bioma, que deve ser anunciado ao fim da cúpula, é a pressão de empresas multinacionais por acesso aos recursos que estão no solo ou subsolo da floresta.

"Creio que a maneira como os países em cada lugar cedem aos interesses de companhias, indústrias farmacêuticas, em alguns casos, é a principal diferença", diz.

DW: Considerando que a Floresta Amazônica se estende por nove países, é possível abordar a Amazônia como um todo nesta cúpula?

Dario Mejia Montalvo: É necessário. É importante que se fale nesses dois níveis. Não é suficiente que um país promova ações sem a participação do outro, caso contrário essas ações não têm eficácia.

É necessário que se veja a Amazônia como um todo, no entanto, é importante que não se trate a Amazônia como um objeto, ou como uma paisagem.

Dentro da Amazônia existem povos que não querem que o Estado, com essa forma de organização histórica que teve origem na Europa, interfira. Há povos isolados ou em contato inicial que querem se manter assim. Essas formas de entendimento da relação com o território, do equilíbrio, precisam ser consideradas e protegidas.

Não tem que haver uma única visão sobre o que a Amazônia necessita. Mais coisas são necessárias neste momento, assim como uma ação regional, unificada, de todos os governos.

Quais são as principais diferenças de cada país que podem dificultar um acordo de impacto ao fim da cúpula?

Creio que a principal delas é o nível de autonomia dos governos frente à pressão das multinacionais. A maneira como os países em cada lugar cedem aos interesses de companhias de petróleo, de mineração, indústrias farmacêuticas, em alguns casos, é a principal diferença.

Existem outras. Na questão ideológica, na maneira como o poder está estruturado em cada país, na maneira como se chegou ao poder, isso pode marcar diferenças. A maneira como cada governo se relaciona com a sociedade também pode trazer diferenças.

Para que o acordo regional de impacto saia, também depende muito da capacidade dos chefes de Estado.

Quais são os países que estão mais vulneráveis às pressões de multinacionais na Amazônia?

Não tenho dados estatísticos sobre isso. Creio que tem a ver com países ou regimes que comungam com a ideia de que o mercado traz soluções aos problemas internos, aos problemas sociais.

Creio que os países que ainda estão pendendo para essa visão são os mais vulneráveis às pressões de multinacionais, que também têm resistências a essa questão.

Alguns têm dificuldades para aceitar que a crise climática atual do planeta depende de uma ação conjunta de todos. Na prática, a Terra não distingue os maiores países emissores de gases de efeito estufa dos menores emissores. O planeta parece que não está fazendo essa diferenciação em termos de impacto das mudanças climáticas.

Há uma discussão sobre soluções que seguem a lógica do mercado e suas aplicações em larga escala na Amazônia. Como os povos indígenas avaliam isso?

Depende muito do local onde moram. Se perguntarmos aos indígenas anciãos, que vivem cotidianamente uma realidade no território, alguns sequer falam português, espanhol, inglês, ou francês em alguns casos. Falam as línguas indígenas. A solução para eles é que possam continuar vivendo segundo suas próprias tradições.

As lideranças trazem pontos de vista diferentes. Algumas, as mais próximas a partidos políticos, podem pensar que é necessário uma concertação, que é necessário avançar com a consulta prévia, livre e informada, como diz a Convenção 169 da OIT. Mas a consulta prévia não é necessariamente uma necessidade dos indígenas, mas de quem necessita implementar os projetos de infraestrutura.

A necessidade real dos povos indígenas são os territórios e a livre determinação. Eles não precisam buscar serem consultados, na realidade. Quem precisa consultar os povos indígenas é quem tem interesse nos territórios deles. Inverteram a relação. Apresentaram a consulta prévia e informada como uma necessidade dos povos para inverter os direitos.

O crime organizado se tornou um grande problema na Pan-Amazônia. Esta é uma questão que os chefes de Estado deveriam abordar mais profundamente aqui?

Sim, incluindo quadrilhas com diferentes tipos de ações criminosas. Há organizações que se dedicam a várias facetas do crime. E também são crimes transfronteiriços.

Em alguns lugares, os crimes têm uma divisão muito tênue entre a legalidade e ilegalidade, com atuação na pesca, na extração de madeira, de minérios. Dito isso, é uma necessidade que os governos abordem como uma prioridade para abarcar as soluções agora.

É fundamental discutir a maneira como o mercado vai regular as relações na Amazônia. Caso se fortaleça os direitos à livre determinação, se padronizem os procedimentos dos direitos territoriais dos povos indígenas e de outras comunidades tradicionais, se regularize a situação nos territórios, o efeito positivo neste cenário será grande. Mas as intervenções militares e de inteligência policial são com certeza necessárias neste momento porque há muito crescimento das organizações dedicadas ao crime.

É importante também controlar as atividades com proteção legal, mas que também trazem danos para a Amazônia. Algumas companhias madeiras têm amparo legal, algumas concessões de exploração de minério e de petróleo têm amparo legal. Mas isso não quer dizer que elas não estejam provocando destruição territorial e contaminação dos rios.