Checkpoint Berlim: Experimento na Berlinale
10 de fevereiro de 2017Fevereiro chegou e, com ele, a Berlinale. O festival consagrado é atualmente um dos mais importantes do mundo e dá uma nova cara para Berlim neste mês cinzento de inverno.
Durante dez dias, a cidade respira cinema. Tudo gira em torno do festival. E a sacola da Berlinale, vendida como souvenir, é a principal peça desta curta estação. Ao caminhar por Berlim, é quase impossível não ver alguém carregando uma delas com orgulho de fazer parte deste momento.
Já vi vários filmes no festival, mas um deles foi especialmente marcante. Os mais familiarizados com a Berlinale sabem que conseguir um ingresso nem sempre é fácil. Geralmente aquele filme que você quer muito ver é o mesmo que quase todo mundo que vem para o festival quer ver. E conseguir a valiosa entrada é uma questão de sorte e paciência. Sorte de conseguir completar a compra pela internet, logo no momento que a venda é liberada, ou paciência de aguardar na fila da bilheteria.
Como não tenho nenhuma destas duas características, opto por comprar ingressos para os filmes que estiverem disponíveis e deixo-me surpreender. Mas numa dessas ocasiões, a surpresa foi extrema.
Era o único filme com ingresso disponível para aquela noite de sexta-feira, isso já poderia dizer muita coisa. Uma amiga veio para Berlim só para acompanhar o festival, então, não podíamos perder essa oportunidade. Após cinco minutos de filme, olhei para o lado e percebi que minha amiga também estava com vontade de sair correndo da sala. Ela foi forte e disse que aguentaria até o fim para saber qual era a intenção e a mensagem da diretora, que se apresentou como antropóloga da Harvard.
Aguentamos firme, diferentemente da maioria dos presentes, que foi abandonando a sala no meio da exibição da obra cheia de imagens tremidas e que para os fracos de estômago era um convite para passar mal. No fim sobe ao palco a diretora cheia de si. Uma das primeiras perguntas foi sobre a intenção do filme e a escolha da linguagem.
A resposta foi justamente a que eu já esperava. Na verdade, a antropóloga da Harvard não tinha muita intenção, pegou uma câmara e foi filmar os ensaios de um grupo de dança. Durante as gravações, ela se empolgou e passou a dançar com o grupo, filmando cada momento. Assim surgiu o filme, sem pretensões, que estava sendo exibido num dos mais importantes festivais de cinema do mundo.
A sessão me deixou com a impressão de que quem selecionou o filme o fez apenas pela descrição e não teve tempo de assistir à obra. Mas tirando essa experiência estética, a Berlinale costuma trazer filmes ótimos de vários países do mundo. Desde a última quinta-feira, o festival apresenta 399 filmes de mais de 40 países – opções para todos os gostos.
E, depois de três anos, o Brasil volta ainda a competir por um Urso de Ouro com o longa Joaquim, de Marcelo Gomes. O cinema brasileiro já foi contemplado duas vezes com o prêmio: em 1998, com Central do Brasil, de Walter Salles, e em 2008, com Tropa de Elite 2, de José Padilha.
Clarissa Neher é jornalista freelancer na DW Brasil e mora desde 2008 na capital alemã. Na coluna Checkpoint Berlim, publicada às sextas-feiras, escreve sobre a cidade que já não é mais tão pobre, mas continua sexy.