Cerveja Tsingtao é vestígio de época colonial alemã
4 de agosto de 2013Em fins do século 19, tanto generais e marechais alemães como geógrafos e representantes do empresariado se debruçavam com olhares ávidos sobre o mapa da China. Os alemães cobiçavam um porto próprio no "Reino do Meio", o qual queriam "adentrar economicamente" – um eufemismo para "saquear".
Seu olhar se fixava sempre num lugar do mapa: a região costeira de Kiautchau, na província de Shandong, no Mar Amarelo. Também o imperador Guilherme 2° compartilhava dessa avidez colonial. Até porque em 1897 um grave incidente abalara as relações teuto-chinesas: dois missionários alemães haviam sido mortos na China, e os alemães responderam com o envio navios de guerra.
"Punho de ferro do Reich"
Para Guilherme 2°, a questão era menos o destino dos dois missionários do que a oportunidade de chantagear os chineses. "Então, finalmente os chineses nos forneceram o motivo e o 'incidente' por que estávamos esperando há tanto tempo", escreveu ao ministro do Exterior, Bernhard von Bülow. E o imperador alemão confirmava sua fama de cruel fanfarrão: "Centenas de milhares de chineses vão tremer quando sentirem o peso do punho de ferro do Reich alemão sobre suas nucas".
Em 14 de novembro de 1897, dois navios de guerra alemães, com aproximadamente 700 marinheiros, ancoraram na pequena localidade de Tsingtao, em Kiautchau. Os poucos soldados chineses presentes bateram em retirada, diante da superioridade numérica dos alemães.
Poucos meses mais tarde, os diplomatas do Reich impunham um acordo ao imperador chinês: pelos próximos 99 anos, o Império chinês arrendaria aos alemães uma extensa área de mais de 500 quilômetros quadrados. Como bônus, os alemães receberiam, ainda, a concessão para exploração de minas e linhas ferroviárias, bem como vantagens alfandegárias em toda a província de Shandong. Ou seja, de súbito, mais de 30 milhões de pessoas passavam a viver numa zona sob controle econômico alemão.
Colônia-modelo alemã
Os alemães pretendiam transformar Kiautchau, com sua localidade central Tsingtao, numa verdadeira "colônia-modelo", num projeto que custou cerca de 200 milhões de marcos. Eles começaram por construir estradas e moradias, erigiram casernas e portos de alto desempenho, e plantaram incontáveis árvores, para tornar a região mais verde. E não esqueceram de escolas, hotéis e, mais tarde, até uma universidade, a qual – caso único no império colonial alemão – também podia ser frequentada por chineses.
E como os novos donos do lugar eram alemães, não podia faltar uma cervejaria. Com o oportuno nome de Germania, a fábrica começou a funcionar em 1903, produzindo segundo os preceitos alemães de pureza. Três anos mais tarde, a cerveja chinesa chegou a ser premiada numa feira de cervejarias em Munique.
Europeus e chineses viviam, porém, em bairros estritamente separados. Mansões luxuosas, que pareciam transpostas diretamente da Alemanha, eram especialmente cobiçadas pelos senhores coloniais. No entanto, com o início da Primeira Guerra Mundial em 1914, a construção da colônia-modelo teve um fim abrupto. O Japão, adversário de guerra, cercou Kiautchau e ocupou a colônia, depois de os defensores alemães terem gasto toda a sua munição.
Cerveja chinesa – em saquinhos
Embora os chineses não gostassem dos senhores coloniais alemães, uma das contribuições destes logo se tornou extremamente popular: a cerveja. Ao fim da guerra, os japoneses vencedores mantiveram a produção na cervejaria Germania, agora sob a marca "Tsingtao".
Quando, anos mais tarde, os chineses recobraram a cidade, continuaram a produzir cerveja. No entanto, a China ainda passaria por um período sangrento: em 1937, o Japão lhe declarava guerra. Assim que o conflito terminou, em 1945, eclodiu a guerra civil entre comunistas e anticomunistas, a qual chegaria ao fim em 1949 com a vitória de Mao Tsé-tung. Ambas as guerras custaram a vida de milhões de pessoas.
Apesar de tudo, a cerveja originalmente alemã de Tsingtao – hoje Qingdao – continuou sendo um sucesso de vendas – e se mantém assim até hoje. A Tsingtao é a maior cervejaria da China, com exportações para todos os continentes. Além disso, os antigos prédios nos quais viviam e trabalhavam os funcionários coloniais alemães também se tornaram muito apreciados, e são imitados com a construção de casas "em estilo alemão".
O interesse pela história colonial da China é grande, principalmente porque a Alemanha é hoje um importante parceiro comercial de Pequim. Entretanto, o turista que queira matar a sede com uma Tsingtao precisa se acostumar com um fato: na China, os vendedores ambulantes vendem cerveja em saquinhos.