MPB made in Berlin
27 de fevereiro de 2007Ela já foi apontada como uma das maiores revelações vocais surgidas na Alemanha nos últimos anos: Céline Rudolph, 38 anos, iniciou a carreira fonográfica em 1994, com sua primeira banda, a Out of Print. Cresceu ouvindo muita música brasileira, uma paixão que despertou nela não só o interesse em aprender português – "para cantar bossa-nova e tocar violão" – como a gravar um disco no Brasil, com alguns dos melhores instrumentistas locais. Brazaventure, que saiu no final de janeiro pelo selo Enja Records, de Munique, já está nas lojas européias e também no Japão.
Tudo começou com o pai de Céline, dono de uma impressionante coleção de LPs e um amante inveterado da boa música, quer se tratasse de jazz, afro ou a MPB."Ele me lembra ainda hoje que eu cantava Rosa Morena junto com o disco de João Gilberto, quando só tinha cinco anos", revela Céline.
Com o passar dos anos, o amor pela música popular brasileira só foi aumentando. Vieram discos como Os Afro-Sambas de Baden Powell e Vinícius de Moraes, Amoroso, clássico de João Gilberto produzido pelo maestro alemão Claus Ogermann e, mais recentemente, O Sol de Oslo, projeto especial de Gilberto Gil gravado na Noruega, do qual participaram Marlui Miranda e Rodolfo Stroeter dentre outros.
De Berlim para São Paulo
Fascinada pelo disco de Gil, Céline resolveu ir atrás do produtor e idealizador do álbum do artista baiano, o baixista Rodolfo Stroeter, determinada a gravar um trabalho próprio com ele que fosse "só simples e bonito" e que tivesse forte acento percussivo. A cantora alemã enviou para Rodolfo algumas de suas gravações, o brasileiro gostou do que ouviu, e os dois partiram para a realização do projeto.
Rodolfo começou então a escalar os músicos que tomariam parte na empreitada. Foram chamados Marcos Suzano, o ás brasileiro do pandeiro, Jovi Joviniano, um segundo percussionista para incrementar a "cozinha rítmica", além de Toninho Ferragutti – que também tocara em O Sol de Oslo –, Paulo Bellinati no violão e o vibrafonista Rupert Stamm.
Em participação especial, foram convidados também a cantora Mônica Salmaso, o violonista Sérgio Santos, além de Teco Cardoso e Tilmann Dehnhardt nos sopros. Pouco depois, lá estavam todos gravando Brazaventure num estúdio paulistano. "O produtor Rodolfo Stroeter fez nesse álbum a ligação entre tradição e modernidade, entre um continente e os outros", elogiou a cantora e compositora.
A compositora Céline
Ainda que Céline Rudolph venha chamando mais atenção como intérprete, ela também compõe suas próprias canções, atividade em que começou cedo. Se foi com o pai que aprendeu a cair de amores pela MPB e pela música afro-americana, as primeiras composições, ou melhor, chansons, escritas aos 12 anos de idade, foram inspiradas pela mãe francesa.
O ato de compor viria a ser aperfeiçoado posteriormente, com a entrada de Céline na Escola Superior de Artes em Berlim, onde estudou também canto jazzístico, tendo como mestres David Friedman, Jerry Granelli e Catherine Gayer.
Em Brazaventure, cinco das 11 faixas do disco foram escritas por Céline, que impressiona o ouvinte cantando em quatro idiomas: português, alemão, francês e inglês. "Francês foi a primeira língua que ouvi. Depois veio o alemão, que é o idioma em que me sinto mais à vontade. Já o inglês vem para mim junto à tradição do jazz, enquanto que o português chegou com a música brasileira e a poesia de Fernando Pessoa", contou Céline à imprensa alemã.
De Baden Powell, um de seus compositores brasileiros preferidos, ela canta Deixa, parceria do violonista com Vinicius de Moraes. Na faixa Naima, do legendário jazzista norte-americano John Coltrane, Céline incorpora a musicalidade de termos do candomblé para promover um curioso crossover com a estética do Olodum.
Pelo mundo afora
Brazaventure vem conquistando críticas positivas junto à imprensa alemã. Beate Sampson, da emissora radiofônica Bayern 4, afirmou que Céline não impressiona só pelo seu canto versátil e pela capacidade de improvisar, "mas também por suas composições, com as quais já fez seu nome". A revista Jazz Podium também aposta no talento dela: "É música impactante da nova geração".
Céline Rudolph excursiona pela Alemanha durante o mês de fevereiro, fechando um giro por nove cidades com uma esticada até Copenhague, na Dinamarca. No palco, ela conta com um afiado quarteto de músicos brasileiros: Toninho Ferragutti, Rodolfo Stroeter, o violonista Diego Figueiredo e Ricardo Mosca na bateria.
Em abril, segue para o Brasil, onde esteve em outubro do ano passado, fazendo a pré-estréia do show Brazaventure no Sesc Pompéia, em São Paulo. E quando terminar a turnê de lançamento do novo disco, Céline já engata seu próximo projeto, intitulado Lisboa-Maputo-Berlim.