Bundestag cancela verba para partidos antidemocráticos
23 de junho de 2017Por 502 votos contra 77, os deputados do Bundestag (Parlamento da Alemanha) aprovaram nesta quinta-feira (22/06) uma emenda à Lei Fundamental (Constituição), privando os partidos políticos antidemocráticos de verbas federais. Uma das primeiras legendas a serem afetadas pela medida deverá ser o Partido Nacional-Democrático (NPD), de extrema direita, que em 2016 recebeu do governo 1,1 milhão de euros.
O ministro alemão da Justiça, Heiko Maas, manifestou satisfação com o resultado. "O Estado não tem obrigação de financiar inimigos da democracia", disse em comunicado. "Dar dinheiro de impostos ao NPD é um investimento estatal direto na agitação da direita radical", resumiu o político social-democrata.
Com a entrada em vigor da emenda constitucional, o apoio financeiro governamental dependerá de os partidos não mostrarem intenções de minar a democracia alemã. Aqueles que não preencherem esse critério perderão o acesso aos fundos públicos por seis anos.
Autodefesa da democracia
Os parlamentares da conservadora União Democrata Cristã / Social Cristã (CDU/CSU) e do Partido Social-Democrata (SPD), de centro-esquerda, que juntos compõem a coalizão de governo em Berlim, votaram todos a favor da emenda, classificando-a de um exemplo de autodefesa da democracia alemã.
O democrata cristão Helmut Brandt tachou de uma "contradição" subvencionar uma legenda que quer eliminar a Lei Fundamental, quando, ao mesmo tempo, o governo emprega mais de 104 milhões de euros por ano no combate a tais atitudes políticas. "É tarefa da política proteger a democracia dos esforços para destruí-la", afirmou, acrescentando que a Alemanha necessita de "possibilidades de sancionar partidos que estão a um passo da interdição".
A deputada Gabriele Fograscher, do SPD, expressou sentimento semelhante, ressalvando que a legislação se aplica a todos os grupos extremistas, e não especificamente ao NPD. Segundo ela, as verbas economizadas com o corte das subvenções devem ser destinadas a "combater o extremismo de direita e o antissemitismo".
De maneira atípica, a maioria do oposicionista A Esquerda votou em concordância com o SPD e a CDU/CSU. "Para mim, fascismo não é uma opinião entre tantas na competição democrática", comentou a porta-voz Utta Jelpke. "É crime. Por isso, meu partido diz: nem um centavo para um grupo nazista."
Alternativa à proibição
A votação no Bundestag foi o capítulo mais recente numa história iniciada e que possivelmente terminará na Corte Federal de Justiça (BGH). Tudo começou com uma tentativa fracassada de banir o NPD.
Em 17 de janeiro, o supremo tribunal da Alemanha rejeitou uma moção nesse sentido, argumentando que, apesar de hostil à Constituição, a legenda seria pequena demais para ser vista como ameaça real à democracia, não se qualificando, portanto, para uma interdição.
Por outro lado, os juízes em Karlsruhe lembraram que o governo tem "outras possibilidades para reagir e mostrar que não há espaço nos partidos políticos para racismo, antissemitismo e hostilidade à democracia".
Em reação imediata, os parlamentares federais esboçaram uma emenda constitucional para a retirada das verbas estatais ou alívios fiscais dos "partidos que desempenhem atividades contrárias à existência da República Federal da Alemanha e sua ordem fundamental liberal e democrática". Em fevereiro, o projeto foi aprovado pelo Bundesrat, câmara legislativa onde estão representados os 16 estados federais.
Verdes discordam
Apesar da maioria esmagadora, a votação desta quinta-feira no Bundestag não teve resultado unânime, sendo o Partido Verde o único a rejeitar a emenda. Num discurso emocional, sua porta-voz, Renate Künast, afirmou que a legislação proposta tem, na verdade, o NPD na mira, e que alterar a Constituição é um mecanismo desproporcional para combater um "anão político".
A parlamentar verde também acusou Berlim de usar a nova lei para sugerir que assim teria resolvido o problema do extremismo de direita. E expressou temor de que a medida venha a ser empregada contra outros grupos com pontos de vista discordantes: "O que eu não quero ver é essa regra ser aplicada contra nós."
A observação suscitou resposta irritada do SPD, antigo parceiro de coalizão dos verdes. Rolf Mützenich recordou que os social-democratas foram banidos na Alemanha nazista depois de votarem contra a lei que deu plenos poderes ao regime de Adolf Hitler, em 1933. "Não vamos deixar ninguém nos dizer que não temos o direito de continuar trabalhando nesta legislação", desafiou o deputado.
NPD pode recorrer
Nos últimos anos, o ultradireitista NPD registrou uma queda dramática no número de seus afiliados – em parte devido à ascensão da legenda populista de direita Alternativa para a Alemanha (AfD) – e acredita-se que esteja em dificuldades financeiras.
No site do partido, o presidente Ronny Zasowk declarou: "Essa lei dirigida especificamente contra o NPD visa deixar claro a todos aqueles com opiniões impopulares que sua participação política não é desejada no nosso país."
O pequeno Os Republicanos, igualmente de extrema direita e, em certos aspectos, rival do NPD, igualmente condenou a emenda: "Em nossos olhos, a tentativa de drenar as finanças do partido não é a maneira certa de agir", disse o porta-voz André Maniera à DW. "Você deve se perguntar: Qual partido será o próximo?"
Teoricamente o NPD poderia questionar a legislação na Justiça, mas até o momento não há indicações se o partido está disposto a tal.