Tráfico de pessoas
16 de março de 2010Em âmbito global, o comércio de pessoas já é apontado como a segunda maior economia paralela. "Se fosse para fazer um ranking no mundo do crime, o tráfico de pessoas estaria na segunda posição", afirmou Romeu Tuma Júnior, secretário nacional de Justiça do Brasil.
Para Tuma, este tipo de crime já supera o tráfico de armas em termos de volume financeiro, ficando apenas um pouco atrás do comércio de drogas. "Justamente por ser um crime silencioso, e as pessoas aparentemente não verem, ele vai crescendo", advertiu o secretário.
Com base no Relatório Global de Tráfico de Pessoas do Escritório da ONU sobre Drogas e Crime (UNODC), a maior demanda de pessoas traficadas é para a exploração sexual (79%), seguida pelo trabalho forçado (18%).
Segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT), pelo menos 12,3 milhões de adultos e crianças são explorados em trabalhos forçados e no sexo em todo mundo– 56% são mulheres e garotas.
Tráfico internacional
Muitos deixam seus países e acabam tornando-se vítimas do tráfico humano no exterior. Na maioria das vezes, são convencidos pela promessa de uma vida melhor por meio de emprego, oportunidades de estudo e casamento.
De acordo com o Relatório de Tráfico de Pessoas, publicado pelo Departamento de Estado Norte-Americano em junho de 2009, um grande número de mulheres e crianças brasileiras, muitas do estado de Goiás, são traficadas para o exterior para serem exploradas sexualmente, sobretudo em países como Espanha, Itália, Portugal e Holanda. Outras também são traficadas para países vizinhos, como Suriname, Guiana, Venezuela e Paraguai.
Para Adriana Maia, especialista em cooperação técnica para tráfico de pessoas do UNODC, a grande maioria do tráfico está ligada à exploração sexual, e os principais países de destino para o tráfico de brasileiros são Portugal e Espanha, devido à facilidade do idioma.
Maia acredita que o comércio de pessoas não é um crime fácil de ser detectado. "Informações sobre o tráfico de pessoas é algo difícil de ser constatado, pois é um crime muito escondido", afirma.
Políticas migratórias
Segundo Romeu Tuma, quanto mais os países do hemisfério norte restringem as políticas migratórias, mais eles criam um ambiente propício para atuação de quadrilhas organizadas em tráfico de pessoas.
"O indivíduo tem um sonho de ir para a Alemanha porque acha que vai ter uma vida melhor e ninguém tira aquele sonho. Se ele tem restrição como imigrante, se ele é criminalizado como imigrante, ele não esquece o sonho, ele procura alguém que o consiga levar", explicou o secretário nacional de Justiça. Para ele, muitas pessoas nestas condições acabam virando vítimas duas vezes: uma por se tornarem ilegais no país; e outra por ficarem reféns de quadrilhas.
"Por isso, a gente tem apelado ao mundo para que tenha uma política migratória mais maleável, que seja mais humanitária, porque certamente vai contribuir no combate ao tráfico de pessoas", afirmou.
Tráfico interno
Além de ser um país de origem para o tráfico, o Brasil também é um local de destino e de trânsito para outros países. De acordo com o relatório do Departamento de Estado Americano, diversos homens, mulheres e crianças saem da Bolívia e do Paraguai para realizar trabalhos forçados em fábricas têxteis e nas lojas de centros metropolitanos como São Paulo.
Para evitar a exploração de imigrantes irregulares no Brasil, o governo decretou anistia em junho de 2009, permitindo-lhes legalizar-se provisoriamente no país. Segundo Tuma, muitas pessoas traficadas estavam em oficinas de mão-de-obra análoga à escrava, sem poder se libertar. "Quando você anistia o irregular, ele consegue sair e denunciar o crime", informou.
Segundo o relatório dos EUA, o Brasil possui grande problema com o tráfico interno de pessoas. Entre 250 mil e 400 mil pessoas são exploradas em prostituição doméstica em resorts e áreas turísticas, ao longo de estradas e em bordéis na Amazônia. Mais de 25 mil homens são sujeitados a trabalhos escravos ligados ao cultivo de gado, à plantação de cana e a grandes campos de plantação de milho, algodão e soja; bem como em tarefas de extração mineral, corte de madeira e produção de carvão.
Combate ao tráfico
No início de 2008, o congresso brasileiro aprovou o Plano Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas (PNETP), instituindo mecanismos de proteção e de combate ao crime. Segundo Tuma, o plano trabalha com três facetas do problema: prevenção, repressão e atendimento às vítimas.
Foram criados núcleos estaduais de enfrentamento ao crime, com a participação dos governos federal, estadual e municipal, além da sociedade civil. Os núcleos servem para recepcionar qualquer tipo de manifestação de tráfico e dar o encaminhamento correto às vítimas, por meio de tratamento médico e psicológico.
"Esses núcleos têm proporcionado integração de todos os órgãos envolvidos direta e indiretamente nessa questão, para poder amenizar o problema", afirmou o secretário de Justiça. Paralelamente, há um programa nacional de capacitação e treinamento de agentes públicos e privados para identificar pessoas vulneráveis ao tráfico e aquelas que já tenham sido vítimas.
Quebrar o silêncio
Além disso, estão sendo firmadas parcerias com fundações internacionais, como a Stiftelsen World Childhood Foundation, ONG criada pela rainha da Suécia para o combate ao crime. "Estamos tentando quebrar o paradigma do silêncio, porque entendemos que o tráfico é um crime silencioso, as pessoas não denunciam", explicou Tuma. Para ele, muitas das pessoas traficadas não se reconhecem como vítimas.
Segundo o secretário, a ação policial está crescendo. "Nos últimos anos, fizemos aproximadamente mil inquéritos policiais referentes ao tráfico [de pessoas] em todas as suas manifestações", afirmou.
Com base no relatório do UNODC, em 2003 a Polícia Federal investigou 55 casos de tráfico de pessoas, enquanto em 2007 o número de investigações subiu para 109. A Polícia Federal é o órgão brasileiro que lida com casos de comércio de pessoas em âmbito internacional e no nacional, quando há mais de um estado envolvido.
Autor: Deyvis Drusian Gomes
Revisão: Augusto Valente