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Bem-vindos à República Bolsonarista do Brasil

13 de fevereiro de 2019

Elementos radicais do governo dizem que o Brasil está ameaçado pelo comunismo. Também poderiam dizer que o país é bom em esportes de inverno. Mas não se trata da verdade, e sim de criar inimigos fictícios.

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Camisas amarelas com o rosto do presidente Jair Bolsonaro penduradas em frente à Catedral de Brasília
"O que importa aos radicais adeptos de Bolsonaro é criar inimigos, que agora incluem até a Igreja"Foto: picture-alliance/AP/E. Peres

A paranoia começou já pouco antes da posse. O general Augusto Heleno afirmava que estava sendo planejado um atentado contra Jair Bolsonaro. Ele falou em "terrorismo". Essa é uma palavra grave, e em outros países a revelação teria levado a investigações e questionamentos. Não no Brasil.

A afirmação de Heleno desapareceu de forma tão repentina como havia aparecido. Não foram nomeados nem suspeitos nem possíveis motivações. A conclusão sugere que a história não fosse verdadeira.

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Mas talvez outra coisa também estivesse em jogo. A intenção era provocar um sentimento de ameaça, invocar forças ocultas que conspiram contra a nação.

É uma tática política muito antiga. Cria-se a imagem de uma ameaça, uma imagem que não reflete, mas substitui a realidade. Cria-se um mundo paralelo, que pode controlar e até mesmo dominar o comportamento do mundo real. Na psicologia, isso é chamado de sugestão. Ela é uma arma política forte. Uma vez estabelecido o mundo paralelo dentro das cabeças, não é necessário mais nenhum argumento para se implementar uma determinada política.

O discurso de Bolsonaro à nação foi o próximo degrau nesse laboratório: "E me coloco diante de toda a nação, neste dia, como o dia em que o povo começou a se libertar do socialismo."

Será que Bolsonaro realmente disse que o Brasil é um país socialista? Será que ele tomou LSD? Conheço Cuba, onde estive várias vezes. Também estive na Alemanha Oriental antes de ela desaparecer. Já estive até mesmo na Coreia do Norte. Tenho, portanto, um pouco de experiência com socialismo.

Por isso eu posso falar: o Brasil não é um país socialista! Muito pelo contrário, aqui já foi atingida a etapa do capitalismo monopolista de que Marx falava. No Brasil, conglomerados dominam a economia e influenciam decisões políticas. Exemplos? Vale. Ambev. JBS.

Além disso: no socialismo todos são igualmente pobres. Já no Brasil a divisão entre ricos e pobres é tão profunda como em poucos outros países do mundo. Aqui há pessoas que são ricas como nos contos de fadas. Elas têm propriedades do tamanho de Luxemburgo, mansões, iates e jatos. E há pessoas que nunca tiveram algo e que nunca terão nem mesmo a perspectiva de ter.

Quem mais lucrou nos 13 anos do PT? Banqueiros, grandes agricultores e ricos. Um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) mostrou que a concentração de bem-estar nas mãos dos 5% mais ricos cresceu 3% entre 2006 e 2012. Ao mesmo tempo, há milhões de brasileiros que servem de exército de mão de obra barata.

Quando o presidente diz que o Brasil é um país socialista, ele poderia também dizer que o Brasil é bom em esportes de inverno. Ou que a feijoada é um prato típico argentino. Trata-se de uma mentira com o objetivo de criar uma ameaça que permita limitar a democracia.

Parte do movimento bolsonarista visa isso abertamente. São os seguidores do escritor Olavo de Carvalho, de 71 anos. Ele vive em Virgínia, nos EUA, mas prega uma guerra civil no Brasil. Ele diz que os eleitores de Bolsonaro deveriam formar "uma militância para defendê-lo bravamente nas ruas". Ele convoca para uma guerra contra a mídia: "Todo aliado da grande mídia é um inimigo da nação e do presidente que o povo escolheu."

Olavo de Carvalho só conhece amigos e inimigos. Ele é tão radical que mesmo o vice-presidente, Hamilton Mourão, vira adversário "Que é que falta para alguém entender que ele é INIMIGO E COMPETIDOR do presidente em vez de seu auxiliar?"

A língua de Carvalho é uma língua violenta. É a língua do islamistas, dos nazistas e dos chavistas. Como estes, ele acredita que é hora de proibir os partidos: "Para tornar o Brasil governável, é necessário: (a) fechar todos os partidos pertencentes ao Foro de São Paulo e cassar os direitos políticos dos políticos eleitos por eles; (b) fechar todos os órgãos de mídia que acobertaram as atividades do Foro de São Paulo e das quadrilhas de narcotraficantes e sequestradores pertencentes a ele. É isso, ou aceitar de vez uma ditadura comunista."

Lá está ele novamente: o fantasma comunista! Uma ficção, mas muitos acreditam nela. São como pessoas que assistem ao filme Ben Hur na televisão brasileira e depois afirmam que na Roma antiga se falava português.

O ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, é um desses. Ela acredita que a mudança climática é uma invenção dos "marxistas culturais". Ele diz querer "libertar de ideologias" o Brasil e não percebe o ideólogo que ele mesmo é.

Já o ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodríguez, quer limpar as escolas do "marxismo cultural". Mas como é possível reconhecer um marxista cultural? A própria família Bolsonaro já está construindo uma nova teoria da conspiração. Ela insinua que o autor do atentado, Adélio Bispo, foi enviado por poderosos esquerdistas, que teriam tramado o ataque.

Eu me pergunto. A esquerda brasileira é, segundo Olavo de Carvalho, "a maior organização criminosa do continente". Por que, então, ela enviaria um diletante como Adélio Bispo? Com uma faca de cozinha? Num lugar público? E com ligações antigas com o Psol? Não existe um matador de aluguel melhor no Brasil? Esses que cumprem o trabalho sem deixar rastros? Como os assassinos de Marielle.

Mas o que importa aqui não é lógica nem verdade. O que importa é a propaganda política. O que importa é criar inimigos. Entre eles está agora também a Igreja Católica. A Agência Brasileira de Inteligência (Abin) espionou bispos que preparam um sínodo com o papa Francisco. Eles queriam debater com Francisco a situação dos povos indígenas, o desmatamento e as mudanças climáticas. Para o ministro Augusto Heleno isso é "preocupante". Ele diz: "Queremos neutralizar isso aí". Ele quer investigar se o "clero progressista" pretende usar o sínodo para criticar o governo Bolsonaro.
Para ser claro: qualquer um que criticar o governo Bolsonaro ou discutir a situação crítica da Amazônia deve, a partir de agora, contar com uma possível visita da Abin.

Inimigos, com o tempo, vão de fato ficando cada vez mais parecidos entre si. Na Venezuela também existem milícias armadas para a proteção do governo. Lá, os jornalistas também são perseguidos. Também lá o serviço secreto aparece quando não se concorda com o governo. Bem-vindos à República Bolsonarista do Brasil.

Philipp Lichterbeck queria abrir um novo capítulo em sua vida quando se mudou de Berlim para o Rio, em 2012. Desde então, ele colabora com reportagens sobre o Brasil e demais países da América Latina para os jornais Tagesspiegel (Berlim), Wochenzeitung (Zurique) e Wiener Zeitung. Siga-o no Twitter em @Lichterbeck_Rio.
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