Banqueiros e empresários aderem a manifesto pró-democracia
26 de julho de 2022Banqueiros e empresários de peso da economia brasileira aderiram a um manifesto em defesa da democracia, organizado por nomes da Faculdade de Direito da USP e por entidades e da sociedade civil. O documento foi elaborado em meio a um aumento da tensão política no país a menos de 70 dias da eleição presidencial e, embora não cite nominalmente Jair Bolsonaro, deixa claro que se trata de uma reposta à retórica golpista do presidente e à ofensiva do Planalto contra o sistema eleitoral do país.
"Ataques infundados e desacompanhados de provas questionam a lisura do processo eleitoral e o Estado Democrático de Direito tão duramente conquistado pela sociedade brasileira. São intoleráveis as ameaças aos demais poderes e setores da sociedade civil e a incitação à violência e à ruptura da ordem constitucional", diz o documento, que adverte ainda que o país passa por um momento de "perigo para a normalidade democrática" e "risco às instituições da República".
O manifesto foi divulgado inicialmente pelo jornal Folha de S.Paulo na noite de segunda-feira (25/07), um dia após Bolsonaro usar a convenção do seu partido paraconvocar um novo ato no 7 de Setembro com o objetivo de insuflar sua base radical e tentar intimidar o Supremo Tribunal Federal (STF).
Apoiadores
O manifesto já recolheu cerca de 3 mil assinaturas. Entre os nomes estão artistas e personalidades da sociedade civil, mas se destacam na lista nomes pesos-pesados da economia brasileira.
Assinam o manifesto os banqueiros Roberto Setubal e Pedro Moreira Salles, do Itaú-Unibanco, o maior banco privado do Brasil, e Candido Bracher, ex-presidente da instituição; os empresários Walter Schalka (presidente da Suzano, gigante do setor de papel e celulose); Pedro Passos e Guilherme Leal, da fabricante de cosméticos Natura, e o atual CEO da empresa, Fábio Barbosa; Eduardo Vassimon, presidente do conselho de administração do grupo Votorantim; e o bilionário Horácio Lafer Piva, da Klabin.
Entre os signatários estão ainda o ex-presidente do banco Credit Suisse no Brasil José Olympio Pereira, o economista José Roberto Mendonça de Barros, o ex-ministro da Fazenda Pedro Malan, cineasta João Moreira Salles e o ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga.
Também assinaram o documento ex-ministros do STF, como Celso de Mello, Sepúlveda Pertence, Carlos Velloso, Carlos Ayres Britto e Eros Grau.
"Exemplo no mundo"
O manifesto foi inspirado na chamada Carta aos Brasileiros de 1977, um texto de repúdio a ações da ditadura militar, redigido pelo jurista Goffredo da Silva Telles.
"Nossas eleições com o processo eletrônico de apuração têm servido de exemplo no mundo. Tivemos várias alternâncias de poder com respeito aos resultados das urnas e transição republicana de governo. As urnas eletrônicas revelaram-se seguras e confiáveis, assim como a Justiça Eleitoral", diz o documento.
"Nos próximos dias, em meio a estes desafios, teremos o início da campanha eleitoral para a renovação dos mandatos dos legislativos e executivos estaduais e federais. Neste momento, deveríamos ter o ápice da democracia com a disputa entre os vários projetos políticos visando convencer o eleitorado da melhor proposta para os rumos do país nos próximos anos", prossegue a carta.
"Ao invés de uma festa cívica, estamos passando por momento de imenso perigo para a normalidade democrática, risco às instituições da República e insinuações de desacato ao resultado das eleições", acrescenta o manifesto, numa clara referência às ameaças de Bolsonaro de não reconhecer uma derrota na sua campanha à reeleição.
No momento, Bolsonaro está em desvantagem nas pesquisas, que apontam inclusive o risco de ele perder já no primeiro turno para seu principal adversário, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que lidera por ampla margem.
O manifesto não é um endosso à candidatura de Lula. Alguns nomes que assinaram o documento, como o bilionário Roberto Setubal, chegaram a manifestar preferência nos últimos meses pela presença de um candidato de "terceira via" nas eleições deste ano.
"Desvarios autoritários nos EUA"
O texto menciona a invasão do Congresso americano em 6 de janeiro de 2021 por uma turba de extrema direita instigada pelo republicano Donald Trump e faz um paralelo com o Brasil. Tal como Trump, Bolsonaro também vem alimentando uma narrativa falsa de risco de fraude nas eleições para agitar seus apoiadores.
"Assistimos recentemente a desvarios autoritários que puseram em risco a secular democracia norte-americana. Lá as tentativas de desestabilizar a democracia e a confiança do povo na lisura das eleições não tiveram êxito, aqui também não terão", diz o manifesto.
"Independentemente da preferência eleitoral ou partidária de cada um, clamamos às brasileiras e aos brasileiros a ficarem alertas na defesa da democracia e do respeito ao resultado das eleições. No Brasil atual não há mais espaço para retrocessos autoritários. Ditadura e tortura pertencem ao passado. A solução dos imensos desafios da sociedade brasileira passa necessariamente pelo respeito ao resultado das eleições. Em vigília cívica contra as tentativas de rupturas, bradamos de forma uníssona: Estado Democrático de Direito Sempre!", finaliza o documento.
Uma leitura oficial do manifesto, pelo ex-ministro do STF Celso de Mello, está marcada para 11 de agosto, na Faculdade de Direito da USP, no centro de São Paulo.
jps/lpf (ots)