Baixa adesão põe em dúvida real retomada dos protestos anti-Copa
16 de maio de 2014Os protestos de quinta-feira (15/05) prometiam marcar a retomada da grande mobilização anti-Copa nas ruas, a menos de um mês do pontapé inicial do Mundial. Apesar dos protestos em diversas cidades do país, a adesão ficou aquém da esperada – em comparação às grandes manifestações realizadas durante a Copa das Confederações e que levaram milhões de brasileiros às ruas.
Batizados de “Manifestação das Manifestações”, em alusão ao bordão “Copa das Copas” utilizado pela presidente Dilma Rousseff, eles haviam sido convocados pelos Comitês Populares da Copa espalhados pelo país e havia a expectativa de que tivessem a adesão em peso de dezenas de grupos, como o Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST) e movimentos estudantis.
Mas, ao fim, houve baixa adesão ao movimento “15M – Manifestação contra as injustiças da Copa”, que pretendia realizar mobilizações em mais de 50 cidades no Brasil e no exterior. Ao longo da quinta-feira, somados todos os estados onde houve protestos, apenas cerca de 20 mil pessoas foram às ruas – o que incluiu motivações diversas, como reivindicações por melhores salários por parte de professores.
Mudança do público
Em comparação ao ano passado, nos protestos de quinta-feira não houve participação em massa da classe média. Nas mobilizações do “15M”, a dianteira foi tomada pelos sindicatos e movimentos populares – que têm um grau de politização maior do que grande parte dos participantes dos protestos realizados no período da Copa das Confederações.
“A dinâmica e o público mudaram completamente. A violência no ano passado afastou a classe média e movimentos menos vinculados a grupos políticos. E, agora, está se repetindo essa dinâmica”, diz o cientista político Valeriano Costa, da Unicamp. “Geralmente a população é recrutada em ciclos bem intensos de protestos. Depois, só ficam os grupos organizados, e é o que está acontecendo.”
Costa explica, ainda, que manifestantes da população em geral têm um fôlego mais curto e não conseguem manter um pique de mobilização durante tanto tempo. E, portanto, era natural que eles saíssem mais rápido da rua porque o ciclo se esgota mais facilmente. Enquanto isso, os grupos de interesses organizados se mantêm indefinidamente.
“Esses grupos aproveitam a visibilidade nacional e internacional da Copa, o que obriga respostas mais rápidas do governo. E eles com certeza vão ter a oportunidade de fortalecer suas reivindicações que não são genéricas – como no movimento do ano passado – durante o Mundial”, diz Costa.
O sociólogo Rodrigo Augusto Prando, da Universidade Mackenzie, diz que, mesmo com a fraca mobilização registrada no protesto de quinta-feira em comparação aos do ano passado, ainda é prematuro afirmar que o movimento está enfraquecido. Segundo ele, mesmo com menos pessoas protestando, a cidade de São Paulo teve problemas com o bloqueio de ruas e avenidas.
“Foi um balão de ensaio, e a tendência é os protestos ganharem corpo e serem mais constantes até a Copa do Mundo”, afirma Prando. “Esses movimentos agora estão sendo muito mais contínuos devido a uma articulação de categorias por conta de aumento de salário e de outros direitos, como a moradia. São demandas específicas e com liderança.”
Aprendizagem da polícia
Durante a manhã, em São Paulo, houve interrupção do trânsito de importantes vias e marchas em várias partes da cidade. No final da tarde, na região central, houve depredação contra concessionárias e estabelecimentos, e a Polícia Militar usou bombas de gás lacrimogêneo para controlar o tumulto. No Rio, houve protestos de professores estaduais e rodoviários à tarde e, à noite, concentração na frente da prefeitura.
A Polícia Militar de São Paulo informou, por meio de nota, que oito adultos e um menor foram detidos no protesto por portarem gasolina, martelo, sprays, máscaras, luvas, escudos, bastão de ferro e cartazes com moldes para pichação. Para a PM, por conta do grande aparato policial empregado, os policiais tiveram êxito em evitar diversos crimes.
“De certa forma, a polícia foi menos violenta. Houve uma tentativa de convivência mínima, já que grupos radicais e anarquistas não apareceram tanto e a repressão é proporcional a este tipo de organização”, diz Costa. “A PM está aprendendo a lidar com menos violência e desorganização. É muito importante que ela não ultrapasse um certo limite, pois se houver abuso da violência, o impacto internacional será maior. Eles estão aprendendo desde o ano passado, quando iam da omissão total à violência descabida. Estão atingindo um meio termo.”
Contra a "batalha midiática"
O governo federal e especialistas consideravam os protestos como um termômetro para o que poderá acontecer até o pontapé inicial do Mundial. Para analistas, a campanha da seleção brasileira também poderá ser um fator de ignição para novos protestos: em caso de eliminação, a insatisfação poderá explodir.
Porém, a baixa adesão pode ser vista com bons olhos pelo governo federal, que se preocupa com a reedição dos grandes protestos de junho de 2013 e com o prejuízo político que novas manifestações possam causar à imagem e popularidade da presidente Dilma Rousseff, a cinco meses das eleições.
Mesmo assim, o sinal de alerta está ligado, e o governo federal pretende vencer o que, para muitos no Planalto, é uma “batalha midiática” contra a Copa. O objetivo é aumentar o diálogo com os movimentos sociais, evitar a grandes mobilizações e, assim, incidentes violentos durante o Mundial.
O próprio governo desistiu de enviar ao Congresso um projeto de lei que prevê uma punição mais rigorosa contra manifestantes que praticassem atos de vandalismo. Essa era uma das bandeiras do “15M”.
“Seria muito ruim para o discurso do PT uma lei que tenta comparar um ato de protesto a um ato terrorista. Seria uma mancha na trajetória do partido”, afirma Prando. “A desistência de aprovar uma lei deste caráter é muito mais pelo impacto negativo que isso traria para a história do partido e para a reeleição de Dilma Rousseff.”