Homeopatia ameaçada
14 de julho de 2010A prática secular da homeopatia está ameaçada na Alemanha. O dr. Karl Lauterbach, representante do Partido Social Democrata (SPD) na comissão de saúde do Parlamento, instou, na segunda semana de julho, os convênios públicos de saúde a deixar de financiar esse tipo de tratamento.
Papel dos planos de saúde
A homeopatia foi desenvolvida no final do século 18 pelo médico alemão Samuel Hahnemann. Na opinião de seus seguidores, a terapia é capaz de curar tão bem quanto a medicina convencional, se não melhor.
Seus detratores – entre eles, um bom número de médicos e cientistas – tipicamente a definem como uma prática que envolve quantidades mínimas de ervas ou outros remédios, fortemente diluídas em água e em seguida agitadas para "adicionar energia" à solução. Eles não a consideram mais eficaz do que um placebo. Mesmo assim, ela é atualmente reconhecida por mais de dois terços dos planos de saúde públicos do país.
Em entrevista ao semanário Der Spiegel, Lauterbach classificou de "irresponsável" o procedimento das seguradoras: "Como muitos pacientes creem que os planos de saúde só pagam por aquilo que comprovadamente ajuda", esse reconhecimento oficial "enobrece" a homeopatia, criticou.
Seguindo esse raciocínio e classificando a homeopatia como "uma concepção especulativa, já [cientificamente] refutada", ele exige que ela seja riscada da lista de serviços dos convênios públicas. Além de diretor do Instituto de Economia de Saúde e Epidemiologia Clínica da Universidade de Colônia, Lauterbach é professor adjunto de Política de Saúde da Universidade de Harvard, Boston.
Até os nazistas
Consta que a maioria das autoridades de saúde do país está de acordo com a avaliação do político social-democrata. Embora admitindo que a homeopatia não vá deixar de existir, elas não querem que o contribuinte seja "forçado" a financiar um tratamento médico "duvidoso".
Uma dessas vozes é a do dr. Kay Brune, professor do Departamento de Farmacologia e Toxicologia Experimental e Clínica da Universidade Friedrich Alexander, em Erlangen-Nurembergue. "Se todo mundo paga pela própria cerveja, então também pode pagar pela própria homeopatia", ironiza.
Em entrevista à Deutsche Welle, ele afirmou não haver evidência científica de que a homeopatia realmente cause nos pacientes qualquer reação bioquímica e curativa. Isso, porém, não impede as pessoas de acreditar numa prática tão profundamente enraizada na psique alemã.
"Seu fundador, Hahnemann, era um médico brilhante. Mas, naquela época, não fazer nada era beneficial ao paciente. Em 200 anos, essa pseudociência não fez qualquer progresso." Brune acrescenta que, no Terceiro Reich, as autoridades médicas nazistas exploraram a técnica como "medicina não-semita", mas até eles mesmos desistiram dela.
Saúde barata
Por outro lado, Brune chama a atenção para a quantia relativamente insignificante despendida anualmente com a homeopatia. "Minha estimativa é que 100 milhões de euros sejam gastos por ano com a homeopatia, o que é uma bagatela, comparada com os custos totais da saúde pública na Alemanha." Assim, os atuais esforços dos políticos seriam de pouca relevância, argumenta.
De acordo com a Federação da Indústria Farmacêutica Alemã (BPI), os convênios públicos de saúde têm um gasto anual de apenas 8 milhões de euros com a homeopatia, irrelevante em face dos 30 bilhões de euros consumidos pela medicina convencional a cada ano.
Brune acrescenta que, apesar de tudo, o número dos alemães que se beneficiam da homeopatia é muito grande, e por isso será difícil reunir a vontade política suficiente para retirá-la dos planos de saúde públicos.
Um estudo recente do Instituto Allensbach, de pesquisa de opinião, confirma um crescimento do tratamento homeopático: em 1970, apenas 25% dos alemães ocidentais experimentara esse tipo de medicação; hoje, essa porcentagem chega a 57%.
"Acho que os políticos são incapazes de dizer à população que se trata de lixo. Eles farão concessões e sob certas circunstâncias até pagarão por ela, como pagam pela acupuntura", prevê Brune. E, aparentemente sem notar o paradoxo, ele mina a própria argumentação, ao acrescentar: "Isso satisfaz a necessidade de saúde ao custo mais baixo possível".
Autor: Cyrus Farivar / Augusto Valente
Revisão: Simone Lopes